Festival de Brasília 2017: Os Premiados Vertentes do Cinema


Os Vencedores do Prêmio Vertentes do Cinema

Por Fabricio Duque


A edição do quinquagésimo (sim! quase todos tiveram problemas com essa palavra quebra língua) Festival de Brasília do Cinema Brasileiro reiterou sua fama de ter seus debates pós-filmes acalorados e altamente politizados. Digamos até agressivos verbalmente. Este ano de 2017, não sei se por objetivação, mas questões sócio-política-comportamental foram estimuladas e potencializas.

Tudo começou com a exibição do filme “Vazante”, de Daniela Thomas, exibido inicialmente no Festival de Berlim. Aqui, após, no debate, a questão principal foi a racial, quando a diretora “coloca o dedo na ferida” e decide contar uma história de escravos. Daniela foi acuada e mantendo uma calma, “monge” de ser, argumentou que mesmo sendo pelo viés de uma branca, não é um filme racista. E que não tinha pretensão, tampouco competência, de construir uma redenção da problemática de anos e anos dos negros escravizados, mesmo tendo estudado História. “Eu não fiz este filme que vocês estão querendo e precisando. Tudo que fiz é este filme”. Sim, não há como sair imune. Ninguém. Até porque nós estamos em Brasília, capital do Brasil, cenário político importante que define o futuro de nós brasileiros.

Outro debate marcante foi a de “Construindo Pontes”, de Heloísa Passos, que traz um documentário em que com potência, e “força de uma loba”, confronta o pai politicamente, quando se diz que no período dos militares o Brasil cresceu muito mais que agora.

Porém, o debate que mais incomodou, inclusive seu diretor Marcelo Pedroso, que também manteve uma calma quase psicopata (talvez por fazer Ioga já tantos anos) ao ser acuado e bombardeado por todos, foi “Por Trás da Linha dos Escudos”, que fornece uma voz à polícia. O filme, extremamente perturbador, gerou medidas extremas, de que Marcelo deveria ter questionado mais, ter se imposto mais, ter brigado mais e sair da zona de apatia. O diretor foi chamado de “passivo” e “fofo”. Acho que o público realmente não entendeu o filme. É explicitamente irônico. Marcelo é um “lobo em pele de cordeiro” entrando no “covil do inimigo”, por já ter estado no outro lado da militância. É um esquerdista que lutou contra a opressão policial, com sua “arma câmera” no Estelita.

Confesso que o Festival de Brasília desnorteou em muito a minha cabeça. Entrei em conflito politicamente.


Prêmio Vertentes do Cinema

Melhor Longa-Metragem: “POR TRÁS DA LINHA DOS ESCUDOS”, de Marcelo Pedroso.

Pela liberdade política, pela estética polêmica e corajosa, pela implementação de inovar o discurso, pela sinestesia paralelo ocasionada, pela elucubração humanitária em ouvir o outro lado, pela tolerância das ideias contrárias, pela majestosa e definitiva maestria em desconstruir a pretensão do pensar, pela concretude da realização de um estudo antropológico social, pela decisão de sair do senso comum e da zona de conforto, pela loucura de se tornar parte do inimigo para assim entender a própria ideologia.

Melhor Curta-Metragem: “TENTEI”, de Laís Melo.

Pela potência dura, seca, silenciosa e direta do discurso, pela narrativa silenciosa em traduzir a problemática social, pela sinestesia em fazer com que o espectador, de forma cúmplice, experimente na própria pele as dificuldades do agir, pela burocracia comportamental que critica a nós mesmos, pela interpretação irretocável da atriz Patricia Saravy, pelo controle absoluto da direção, pela decisão corajosa de exemplificar com imagens o procedimento policial, pela urgência cadenciada em uma narrativa de equilíbrio sóbrio, pungente e decisivo, pelo discurso de denúncia, pela legitimidade do conceito cinematográfico.


Mostra Brasília

A Mostra Brasília surgiu da necessidade de reconhecer e incentivar as produções do Distrito Federal. Os vencedores do júri popular e oficial recebem o Troféu Câmara Legislativa do Distrito Federal e R$ 240 mil distribuídos em prêmios. O melhor longa-metragem selecionado pelo júri popular vai receber, também, o Prêmio Petrobras de Cinema no valor de R$ 100 mil. O Juri Oficial da Edição 2017 é composto por Amir Labaki, diretor, roteirista e apresentador do programa É Tudo Verdade, no Canal Brasil; Betse de Paula, diretora e roteirista dos longas-metragens (de “Celeste, A Estrela”); e o documentarista Wladimir Carvalho (de “O Engenho de Zé Lins”, “Barra 68”).

Melhor Longa-Metragem: “O FANTÁSTICO PATINHO FEIO”, de Denilson Félix

Pela curiosidade do elemento histórico, pela emoção cadenciada não clichê, pela naturalidade da narrativa, pela liberdade da edição, pelo retrato de comuns que se tornaram lendas, pela descrição detalhista, pela estética intimista, pessoal e única, pelo enobrecimento dos grandes feitos, pela homenagem às grandes ideias, pelo argumento que já nasce com força, pelo amadorismo construtivista, pelo humor respeitoso e espontâneo.

Melhor Curta-Metragem: “TEKOHA – SOM DA TERRA”, de Rodrigo Arajeju e Valdelice Veron

Pela estética diferenciada, pela transcendência do elemento etnográfico, pelo desenvolvimento narrativo de conjugar possibilidades visuais, pelo empoderamento da essência de um povo, pela fábula de estreitar realidade e ficção.


Sobre o Troféu Vertentes do Cinema

O Troféu Vertentes do Cinema escolhe dois prêmios oficiais, possibilitando ainda vertenteiras Menções Honrosas. O artista plástico carioca Raphael Cavalcanti, que só trabalha com material reciclado de todos os tipos (cabos de telefone, tampa do chocolate alpino, carretel de fios de cobre), e sempre diz que “nenhuma obra dele é igual, porque é arte, e arte não é igual, se for vira industrial”, criou o modelo único do nosso Troféu simbólico (ainda não oneroso).

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