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Crítica: Vidas Ao Vento
A Realidade dos Sonhos Possíveis

Por Fabricio Duque
Já está se tornando lenda as declarações de aposentadoria do diretor japonês Hayao Miyazaki, visto que sempre retorna para dirigir mais filmes. Em sua mais recente animação, “Vidas ao Vento” (“The Wind Rises” na tradução ao inglês), indicado ao Oscar 2014, não poderia ser diferente. O cineasta (de “A Viagem de Chihiro”, ”Ponyo”), talvez, não consiga abandonar seu ofício, porque é um nato contador de histórias, mesclando memórias afetivas, sentimentalismo poético, narrativa realista, sem a utilização de gatilhos comuns “dramáticos” e ou manipulações clichês. Hayao tem nas mãos uma maestria surpreendente: é sensível sem ser caricato. Seus personagens têm alma humana. Sofrem, fumam, desejam experiências cotidianas, vivenciam acasos e a maturidade precoce, buscam quereres, investem em sonhos quase impossíveis, e tudo com a mitigação da fantasia animada. A narrativa apresenta-se naturalista, silenciosa, observadora e sinestésica, projetando nos sonhos o querer intrínseco do subconsciente ao ser confrontado com o universo acordado. A trilha sonora complementa a imersão do espectador no ambiente nostálgico vivenciado na infância, época de pureza verdadeira, sem suavizar dramas e ou tragédias (uma “Tóquio restaurada”, ”Terremoto”). As “epifanias” mostram a física personificada da busca de cada um. De enfrentar o mundo para que o próprio dom prevalece e a sociedade repleta de massificadas e repetidas limitações pré-conceituosas. “Esse sonho é meu”, diz-se. “Estranho esse mundo dos sonhos”, rebate-se o diálogo que um outro “ser” “participa” de um mesmo sonho. A metáfora (alguns pensaram em “A Origem”, de Christopher Nolan – muito sutilmente) representa a odisseia existencialista do caminho percorrido por um “aspirante” à profissão de design de aviões (instrumento que possibilita o ser humano possui de voar). A fotografia clássica (também sutilmente lembra “O Menino e o Vento”, talvez pela temática semelhante), como um mangá japonês acrescenta o efeito da profundidade da terceira dimensão, sem a utilização dos óculos. Por elipses temporais, conta-se a história de vidas entrelaçadas, de pequenas solidariedades, de amor verdadeiro e não piegas. Enquanto uns sonham “grandes sonhos”, com a picardia crítica aos “japoneses copiando os alemães”, outros, como nosso protagonista, buscam pequenos estilos. O bom senso ajuda a não inflacionar o ego, sentimento comum no meio da aviação. “Vidas ao Vento” fornece dicas a “suposta” lenda do início deste texto. “Depois desse sonho, vou me aposentar. Dez anos de artista”, diz-se. O “vento forte simétrico”, com formas que se completam (como a tigela na boca), comporta-se como o “sherlock holmes” do acaso. Mesmo indicado aos Oscar 2014 e tendo a Disney por trás do processo, a animação não perde a veia independente, traduzindo de forma literal características da filmografia do diretor japonês. O filme faz com que o espectador questione a própria vida ao ser introduzido a Jiro Horikoshi, que vive em uma cidade do interior do Japão. Um dia, ele tem o sonho de estar voando em um avião com formato de pássaro. A partir desse sonho, ele decide que construir um avião e colocá-lo no ar é a meta da sua vida. Até que ponto, nós seguimos nossos “verdadeiros” sonhos? “Vidas ao Vento” é adaptado da biografia do designer de avião de caça Mitsubishi A6M Zero, Jiro Horikoshi, usado durante a Segunda Guerra Mundial pelo Japão. Além disso, o filme contém elementos de uma história trágica de Tatsuo Hori, poeta, tradutor e escritor do Período Shõwa, em que uma jovem é mandada para um sanatório após contrair tuberculose. Concluindo, um filme sensível, simples, puro, verdadeiro, despretensioso e que acima de tudo respeita a inteligência do espectador. Quem disse que toda animação é para o publico infantil? Recomendo. 

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