O Décimo Homem
Por Fabricio Duque

 

“O Décimo Homem” é o retorno do diretor Daniel Burman a suas raízes de “O Abraço Partido”, utilizando-se da intrínseca tipicidade-essência comportamental-social dos judeus argentinos, cuja residência em Buenos Aires é majoritariamente no bairro Once (explicitado no título original “El Rey Del Once”), “o melhor bairro para criar filhos”). A narrativa, dividida por dias da semana até o dia póstumo do Sabat (ritual judeu), intercala presente com memórias-imagens “super 8” familiares caseiras (ficcionais) da infância do protagonista, que passa doce de leite em duas bolachas (biscoito), cola e abre para saber qual ficou com mais recheio. O longa-metragem também faz “turismo” com o espectador pelo bairro, por mostrar em flash rápido, como se fosse um ônibus City tour de agências de viagens. Há uma máxima popular de que manter a qualidade narrativa cinematográfica é para poucos. Precisa-se ser um Quentin Tarantino, um Woody Allen, um Lars von Trier, como exemplos. Outros vivenciam, inicialmente, uma explosão do sucesso arrebatador de uma maestria “infinita” para “cair” na mesmice de repetir estéticas, conservando uma “pseudo” crença de uma fórmula à moda dos Irmãos Coen (que sempre dá certo). “O Décimo Homem” representa, infelizmente, a segunda adjetivação-frasal porque, ingenuamente, mantém o elemento comum como uma possível satisfação nivelada por baixo. Mesmo com a presença irretocável, de nuances precisas e de sutileza-espontânea interpretativa de seu ator principal Alan Sabbagh (de “Roteiro de Casamento” – ainda inédito); mesmo com a verborragia-agitação-acelerada visual de sentir o típico ambiente abordado; mesmo com a característica zoação de auto-picardia dos integrantes da própria comunidade; mesmo com a coloquialidade naturalista; “O Décimo Homem” reverbera uma aura solta, de elipse de micro-ações continuadas quebra-cabeças, desencadeando no espectador uma sensação de que o roteiro todo o tempo “enche linguiça” e deixa “barrigas”. Há uma falta de ritmo em concatenar na trama detalhes, subterfúgios, reviravoltas, idiossincrasias, manias, estilos diversificados de vida, redenção, particularidades que interferem nos outros, e as surpresas com as diferenças da nova vida-lar “escolhida” de seu personagem principal, Ariel (um economista em Nova York que veste a camisa “Israel is real”), e as antigas tradições dos seus parentes na Argentina (sua terra natal), lugar que vive seu pai, famoso (o “rei”) em seu antigo bairro por gerenciar uma organização de caridade. É inevitável não referenciarmos a “Brooklyn” pela premissa de lugar escolhido para viver e não continuar vivendo na resignação. Quando sua família o convida para retornar para uma festividade, ele questiona e confronta necessidades e quereres, e o “barulho eletrizante” de seus parentes e amigos. E se vê pressionado a “herdar” o trono do pai. “O Décimo Homem” é a metáfora da comunidade pela história-fábula de que para se enterrar alguém é necessário dez homens. Sim, o filme deve ser picotado em momentos que vencem no saldo positivo, como a crítica à situação política da Argentina atual pela falta de carne. Já no inverso, ingenuidades clichês incomodam pelos gatilhos “preguiçosos”: uma judia ortodoxa muda; a mãe que foi embora por “não acreditar mais em tudo isso”; o pai que nunca aparece; o celular roubado; as regras “comerciais” dos negócios; o “anzol com a Estrela de Davi”; a figura de Eva, a primeira mulher (implícito). E eis que um novo caminho acontece. A humanização. Um retrato documental com moradores locais não atores. “O Décimo Homem” é basicamente sobre família e sobre a volta do filho ao universo da criação, porém se perde na própria confusão do protagonista, talvez objetivamente proposital, e é embrenhado em voltas e voltas sufocantes. O Sabat é a tradição de sete dias, a semana do ciclo lunar, e se acredita que é falta de sorte fazer qualquer coisa no dia de mudança da lua. O sábado é um dia de festa dedicado à evocação da criação divina. O dia posterior, no domingo, é a celebração do Purim, a libertação de seu povo, outra metáfora em torno de Ariel.
2 Nota do Crítico 5 1

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