Balanço Geral do Festival de Cinema de Locarno 2021
Uma análise aprofundada de tudo o que aconteceu no festival ítalo-suíço
Por Vitor Velloso
A curadoria de Locarno sempre teve o cuidado de inserir uma série de obras que não seriam exibidas nas plataformas mais conservadoras da Europa. Assim, a 74ª Edição do Festival Internacional de Cinema de Locarno reforçou o apreço do Júri por uma intensa pluralidade, marcada por diversos discursos ao longo do festival, como determinados lobby estéticos e mercadológicos se concretizaram a ponto de se tornar maioria, novamente. A suspensão da realidade material e a assimilação de elementos fantásticos na estética naturalista deram o norte da produção europeia, que assume o caráter de “naturalismo-mágico” como escape.
Um dos festivais mais antigos do planeta teve uma edição híbrida, com eventos presenciais e exibições online. Para a imprensa à distância, uma lista das obras presentes na “Digital Library”, com a promessa de atualização diária, foi disponibilizada previamente. Essa atualização não ocorreu após o início do pré-festival (dia 03/08) e até o fim, a lista se manteve idêntica. Apesar da grande quantidade de filmes presentes, o desfalque foi grande. Dos dezessete longas-metragens presentes na “Concorso Internazionale” (a competição oficial ao Leopardo de Ouro), apenas dez constavam para a imprensa de maneira remota. A solução necessária foi entrar em contato com os “World Sales” (produtoras para venda internacional) de cada um dos sete filmes restantes. Após insistências, cinco responderam positivamente. “Zeros and Ones”, de Abel Ferrara, e “After Blue (Paradis sale)”, de Bertrand Mandico, ficaram de fora. Infelizmente. Nós tentamos arduamente. Alguns emails nunca foram respondidos. Mas felizmente conseguimos os links (graças à gentileza das produtoras) do vencedor do “Pardo d’Oro”, do prêmio especial do júri, de melhor direção e de melhor ator(es)
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As dificuldades técnicas foram novos desafios que marcou a edição. O site caía constantemente, ficava horas fora do ar e a tela de manutenção se tornou o cotidiano da cobertura. Alguns filmes sofriam problemas de exibição e ficavam indisponíveis por dias (“A Máquina Infernal”, de Francis Vogner dos Reis e “O Fantasma Neon”, de Leonardo Martinelli, por exemplo, foram os filmes que mais tivemos dificuldade de assistir). Porém, justiça seja feita, na reta final as reproduções funcionavam bem e a Assessoria de Imprensa, bastante solícita ajudou sempre, com suporte em tempo real.
A edição do Festival de Cinema de Locarno 2021 representou uma positiva e equilibrada representação em sua curadoria e em sua premiação entre o grande mercado e as distribuições independentes. “Seperti Dendam, Rindu Harus Dibayar Tuntas” (Vengeance Mine, All Other Pay Cash), de Edwin, foi uma divertida surpresa da competição internacional que contava com alguns títulos aguardados e com nomes consagrados. Mandico e Ferrara não foram exibidos remotamente, como já dito, mas Ulrich Seidl aparecia na produção de “Luzifer”, de Peter Brunner, e também constava com um forte lobby. Mas não teve jeito, o prêmio foi para a Indonésia e com méritos unânimes.
A Cineasti Del Presente foi na contramão da competição principal, mais sóbria e menos diletante, em sua maioria. Os latino-americanos estavam mais presentes e conseguiram exibir obras expressivas, na tradição materialista de nossa cultura.
O Júri e seu desejo de pluralidade procurou ampliar o olhar para produções com gêneros e países diversos. A diferença entre o vencedor do Pardo d’oro (Leopardo de Ouro) e “Jiao Ma Tang Hui” (A New Old Play), de QIU Jiongjiong é o abismo que separa “Mis Hermanos Sueñam Despiertos”, de Claudia Huaiquimilla e “Niemand ist bei den Kälbern” (No One’s with the Calves), de Sabrina Sarabi. Para o público, é uma dialética que funciona na própria distância entre as representações culturais e os méritos particulares de gêneros distintos.
TROFÉU VERTENTES DO CINEMA
A escolha do Troféu Vertentes do Cinema é mais difícil que parece, então uma breve trapaceada será necessária. “Mis Hermanos Sueñam Despiertos”, de Claudia Huaiquimilla e “Jiao Ma Tang Hui” (A New Old Play), de QIU Jiongjiong, dividem o pódio.
O melhor curta metragem “Somleng reatrey” (Sound of the Night), de Chanrado SOK, Kongkea VANN. Menção honrosa para “In Flow of Words”, de Eliane Esther Bots e “A Máquina Infernal”, de Francis Vogner dos Reis.