Tudo Sobre a Mostra As Mil Noites – O Cinema de Paula Gaitán no Rio de Janeiro (com entrevista exclusiva)
Entre os dias 06 e 16 de março, na Caixa Cultural, com acesso gratuito, o público pode conferir um recorte especial com nove longas-metragens, 14 curtas e médias e dois videoclipes
Por Fabricio Duque
O melhor elogio que uma cineasta pode receber é a de sempre manter sua autoralidade, haja o que houver. E isso, Paula Gaitán, a realizadora homenageada, em questão nesta matéria, consegue muito bem, talvez por mergulhar sua arte, de filmes-processo, numa etérea viagem experimental. Sim, Paula é uma observadora nata, conhece as engrenagens do olhar e prefere transgredir a própria realidade, permitindo que o tempo se transmute em uma experiência do sentir, afetada pelo fisicalismo do estar, e adentrando na epifania metafísica de um universo próprio, como se fosse um portal tridimensional em um mundo paralelo de trópicos. É, talvez não seja nada fácil traduzir suas obras, e isso talvez seja a sua mais genuína característica-maestria, porque permite a desconstrução do ser no instante real do existir. Paula é uma cineasta colombiana-brasileira, nascida em Paris, na França, agora mora no Brasil e já foi casada com Glauber Rocha. Podemos dizer então que seu cinema é sobre um mundo universal nosso de cada dia.
E assim, após ter uma primeira temporada em Fortaleza, agora, o público carioca pode conferir um recorte da carreira dessa artista multi-espectral. A Caixa Cultural Rio de Janeiro apresenta, entre os dias 6 e 16 de março de 2025, a mostra As mil noites – o cinema de Paula Gaitán. Com curadoria de Ava Rocha, sua filha, o público terá a oportunidade de conhecer as obras de Paula Gaitán, cineasta cuja carreira é marcada por uma profunda investigação das relações entre imagem e som, sendo um dos principais nomes do cinema brasileiro e latino-americano contemporâneo. Toda a mostra é gratuita e reúne nove longas-metragens, 14 curtas e médias-metragens e dois videoclipes.
“A mostra não é de toda a minha carreira, é o recorte que foi feito, porque são muitos mais filmes. Fizemos uma avaliação de tudo o que eu tinha feito, são mais ou menos uns 50 filmes, de 50 a 60 filmes, trabalhos de imagem e movimento, entre programas de TV, séries para TV, filmes de documentário, longa-metragem, curtas, videoarte, clipes, média-metragens. Acho que esta é uma bela seleção de projetos, porque quem fez a curadoria foi a Ava Rocha, minha filha, e eu estive muito perto dela pensando que filmes seriam esses que estariam dentro desse recorte”, disse Paula em conversa exclusiva ao Vertentes do Cinema.
Baixe também o catálogo da Mostra As Mil Noites – O Cinema de Paula Gaitán que aconteceu em Fortaleza
Um dos destaques daqui é o curta “História de Imagens Aleatórias” (2025), apresentado pela primeira vez na Caixa Cultural Fortaleza, e, conta também com a vídeo-instalação inédita “Duas Beiras”, exibida anteriormente apenas na Cinemateca de Bogotá. No Rio de Janeiro, terá duas projeções simultâneas com som estéreo, programadas para ocupar a sala de cinema (nos horários detalhados na programação); e mais uma segunda parte com uma TV instalada no espaço de convivência da Caixa Cultural, que ficará permanentemente disponível ao público, em looping, das 10h30 às 20h (terça a sábado) e das 11h30 às 18h (domingos e feriados). Um ciclo de dois debates acontecerá com a presença de Paula Gaitán.
Durante nossa conversa, perguntei sobre quais eram as motivações da cineasta, que respondeu: “São motivações diversas. Algumas são inspiradas, inclusive, a partir da obra de outros artistas, como no caso, por exemplo, os projetos que fiz do Arrigo Barnabé, e também o documentário que fiz com a Maria Gladys, Vida, ou então aquele que fiz a partir da obra da Eliane Radigue, que é uma compositora de música eletroacústica. São muitos, Renato Berta, documentário, por exemplo, que não está nessa mostra, sobre o diretor de fotografia dos filmes do Alain Resnais, enfim, é importantíssimo. Tenho longa que fiz com ele, mas, por exemplo, nunca exibi em nenhum lugar, porque são projetos que alguns ficam ainda mais restritos. Estou finalizando o filme com o Ken Jacobs, estou filmando há pouco, já estou há 14 anos nisso.”
Paula Gaitán também ministrará um workshop gratuito, composto por quatro masterclass, dia 06 de março (aula 1) às 14h, dias 07 e 08 (aulas 2 e 3) às 10h30 e dia 9 (aula 4) a partir das 11h30. A diretora abordará sua trajetória, os desafios da escrita cinematográfica, as possibilidades da linguagem, a construção de narrativas audiovisuais e as diferentes etapas do processo de criação de um filme, desde a concepção da ideia até sua finalização. Para participar, os interessados devem preencher o formulário disponível no link do evento site da Caixa Cultural RJ. Serão disponibilizadas 50 vagas, preenchidas por ordem de inscrição. A produção dará certificados de participação para quem participar das 4 aulas.
Nossa conversa, que durou um pouco mais de doze minutos, também ajudou a “destrinchar” a forma como Paula Gaitán pensa e constrói suas obras. ”Então, projetos, às vezes com personagens ou com outros artistas, são mais lentos, os processos são mais lentos, mas, em geral, eu trabalho em vários projetos simultaneamente. Então, sempre estou editando, sempre estou pensando, sempre tem algum em produção, em pré-produção, outro está em fase de montagem. E isso é uma das características do meu trabalho, que são processos bastante artesanais. Alguns desses filmes eu mesma fotografei, outros que são filmes maiores, como Luz nos Trópicos e Exilados do Vulcão, são projetos mais ambiciosos, com produções maiores”, disse a cineasta homenageada.
Entre os destaques (e todos com críticas no Vertentes do Cinema), da mostra As Mil Noites – O Cinema de Paula Gaitán está a projeção em película 16mm do filme “Uaka” (1988), primeiro longa-metragem de Gaitán, filmado na aldeia Kamayurá, no Alto Xingu; “Exilados do Vulcão” (2013), vencedor do Festival de Brasília; o épico “Luz nos Trópicos” (2020), exibido no Festival de Berlim e premiado no Olhar de Cinema; “O Canto das Amapolas” (2023), que ganhou o prêmio Carlos Reichenbach de melhor filme na mostra Olhos Livres no Festival de Tiradentes; e seu mais recente trabalho, “História de Imagens Aleatórias” (2025).
“Todos esses projetos se manifestam com certa imprevisibilidade. Quando eu inicio o projeto, nunca sei quanto tempo vou demorar em captar, se é que tem captação de dinheiro, tem alguns filmes que eu fiz sem dinheiro algum, tem outros que têm valores maiores de produção, equipes grandes. Então, no fundo, o processo meu como artista sempre se dá do mesmo jeito. É um privilégio você poder se dedicar ao cinema com essa intensidade hoje em dia. E eu acho que o Brasil está em uma fase extraordinária, com muita gente trabalhando, muitos diretores indígenas, muitos diretores pretos também, poderia ser ainda mais, muita gente que está não necessariamente nas grandes capitais, os grandes centros, e uma produção grande, tanto que tem muitos festivais, os filmes circulam, é difícil de você decidir qual é melhor, porque tem muito filme bom. Acho que a gente está num momento excepcionalmente bom”, conclui Paula Gaitán ao nosso site.
E para finalizar, antes de listarmos a seguir a programação completa, sua própria mostra também buscou definições sobre suas obras. “Sua obra reflete sua atuação como poeta, fotógrafa e artista visual, transitando entre linguagens e explorando as possibilidades do cinema como espaço de experimentação. Repletos de fragmentos literários, imagens de arquivo e performances marcantes, seus filmes reafirmam o cinema como um território de fronteiras fluidas, onde imagem, som e narrativa se encontram em composições únicas e instigantes.”
CONFIRA A SEGUIR A PROGRAMAÇÃO COMPLETA DA MOSTRA AS MIL NOITES – O CINEMA DE PAULA GAITÁN NO RIO DE JANEIRO
QUINTA-FEIRA, 06/03
10h30 – “Duas beiras” – video-instalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
14h00 – Workshop com Paula Gaitán (aula 1) – 180 min
17h30 – Sessão de abertura
– Mulher do fim do mundo – DCP – 5 min – Classificação Livre
– Noite – DCP – 83 min – Classificação 14 anos
19h00 – Bate-papo / fala de abertura e apresentação da mostra, com a cineasta Paula Gaitán, e o diretor convidado internacional Jerónimo Atehortúa Arteaga
19h30 – Coquetel de abertura
SEXTA-FEIRA, 07/03
10h30 – Workshop com Paula Gaitán (aula 2) – 150 min
14h00 – Promessas e previsões – DCP – 4 min – Classificação Livre
– Ostinato – DCP – 56 min – Classificação Livre
15h20 – Agreste – DCP – 77 min – Classificação Livre
17h00 – É rocha e rio, Negro Leo – DCP – 157 min – Classificação 12 anos
SÁBADO, 08/03
10h30 – Workshop com Paula Gaitán (aula 3) – 150 min
15h00 – Luz nos Trópicos – DCP – 255 min – Classificação 16 anos
SÁBADO, 09/03
11h30 – Workshop com Paula Gaitán (aula 4, final) – 120 min
14h30 – O canto das Amapolas – DCP – 104 min – Classificação Livre
16h20 – Debate 1 (junto à sessão anterior, logo após a projeção do filme)
– Conversa com Paula Gaitán, Juan Posada (filósofo), e Jerónimo Atehortúa Arteaga (cineasta colombiano)
TERÇA-FEIRA, 11/03
10h30 – “Duas beiras” – videoinstalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
14h – A chuva no meu jardim – DCP – 30 min – Classificação Livre
– História de imagens aleatórias – DCP – 21 min – Classificação Livre
– Se hace camino al andar – DCP – 35 min – Classificação Livre
16h – Diário de Sintra – DCP – 90 min – Classificação Livre
17h30 – Debate 2 (junto à sessão anterior, logo após a projeção do filme)
– Conversa com Paula Gaitán, Bernardo Oliveira (crítico e curador) e Jerónimo Atehortúa Arteaga (cineasta colombiano) – 19h30
QUARTA-FEIRA, 12/03
10h30 – “Duas beiras” – videoinstalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
14h – Ópera dos cachorros – DCP – 16 min – Classificação Livre
– Memória da memória – DCP 26 min – Classificação 14 anos
– Vida – DCP – 66 min – Classificação 10 anos
16h10 – Azul – DCP – 16 min – Classificação Livre
– Agreste – DCP – 77 min – Classificação Livre
18h20 – Uaka – 16mm – 77 min – Classificação Livre
QUINTA-FEIRA, 13/03
10h30 – “Duas beiras” – videoinstalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
15h00 – Luz nos Trópicos / Sessão Especial com Acessibilidades (audiodescrição e legendagem descritiva) – DCP – 255 min – Classificação 16 anos
QUINTA-FEIRA, 14/03
10h30 – “Duas beiras” – videoinstalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
15h00 – Diário de Sintra – DCP – 90 min – Classificação Livre
17h50 – Kogi – DCP – 13 min – Classificação Livre
– Memória da memória – DCP – 26 min – Classificação 14 anos
– Lygia Pape – DCP – 42 min – Classificação Livre
– Eliane Radigue – DCP – 25 min – Classificação Livre
SÁBADO, 15/03
10h30 – “Duas beiras” – videoinstalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
15h00 – Steps – DCP – 17 min – Classificação Livre
– Espaços invisíveis – DCP – 36 min – Classificação Livre
– Let’s dance – DCP – 27 min – Classificação Livre
– Monsanto – DCP – 21 min – Classificação Livre
17h20 – Exilados do Vulcão – DCP – 130 min – Classificação 14 anos
DOMINGO, 16/03
11h30 – “Duas Beiras” – videoinstalação, digital HD, 2 projeções + monitor de TV – 35 min em looping – Classificação Livre
14h30 – Noite – DCP – 83 min – Classificação 14 anos
16h30 – Ostinato – DCP – 56 min – Classificação Livre
SERVIÇO
Mostra “As mil noites – o cinema de Paula Gaitán”
Data: 6 a 16 de março
Local: CAIXA Cultural Rio de Janeiro – Unidade Passeio – Rua do Passeio, 38 – Centro, Rio de Janeiro/RJ
Classificação etária: consulte a programação
Entrada Gratuita
Retirada de ingressos para os filmes: 30 minutos antes de cada sessão ou atividade programada
Horários da bilheteria: Terça a sábado, 13h às 19h, e domingos e feriados, 13h às 18h
Acesso para pessoas com deficiência
Para mais informações sobre a programação:
Para inscrições workshops, por favor, preencha o formulário no link