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Beckett

Trapalhadas de um charminho confuso

Por Vitor Velloso

Netflix

Beckett

“Beckett”, de Ferdinando Cito Filomarino, que abriu o Festival de Cinema de Locarno 2021 e estreou recentemente na Netflix, é um típico caso de um filme que investe em um mistério que acaba se tornando sua própria decadência. A trama procura um interesse constante pelas resoluções de uma narrativa que nunca é tão interessante a ponto de sustentar suas investidas entre o blockbuster e uma arthouse meio mambembe.

April (Alicia Vikander) e Beckett (John David Washington) estão aproveitando as férias nas ruínas gregas, mas as coisas tomam um outro rumo quando eles sofrem um acidente de carro e April vai a óbito. Beckett passa a ser perseguido constantemente por policiais e milícias locais que querem matá-lo. Bom, com a exposição, fica claro que o grande barato aqui é descobrir a razão de estarem indo atrás do turista norte-americano, mas esse mistério nunca é interessante o suficiente para empolgar o espectador nessa transa entre a indústria e a pompa meio A24. Durante os quarenta minutos iniciais, até é possível sentir como a dinâmica dos espaços com a textura do 35mm se torna esse referencial do deslocamento de uma paisagem que vai engolindo o protagonista. Aliás, a fotografia é assinada por Sayombhu Mukdeeprom (“Síndromes e um Século”, “Me Chame Pelo Seu Nome”, “Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas“, “Suspiria” (2018), “As Mil e Uma Noites”, de Miguel Gomes, para citar alguns de seus trabalhos), que rouba a cena aqui, conseguindo uma certa dicotomia da tensão com alguns contrastes na aproximação dramática. Mas está longe de ser um dos seus melhores projetos.

Isso porque “Beckett” está sempre fora de ritmo e as coisas depois dessa introdução nunca se encaixam muito bem. A montagem se atrapalha quando procura acelerar as imagens, o que fica claro na sequência que o protagonista se taca de um penhasco, e parece sempre caminhar na contramão do rigor desses espaços e da trajetória que termina em um caos urbano e uma ação que dá a sensação precoce a cada novo corte. É claro que o roteiro confuso e pouco original em suas investidas conservadoras acaba pesando no fim, mas o todo não funciona. O responsável pela montagem, Walter Fasano (colaborador frequentemente de Luca Guadagnino) se arrisca no gênero e não vai tão bem quanto a exploração dos tempos da arthouse de Guadagnino, que assina a produção e levou toda a panela para o projeto de Filomarino, incluindo Rodrigo Teixeira.

O filme aposta em um certo “charme” da fotografia e das paisagens para criar essa ação de tempos mortos. Por mais que tenha alguns méritos nesse processo, incluindo a perspectiva das distâncias entre os lugares, constantemente perde a mão e cai em alguns vales tediosos durante a projeção. Não há como negar que a produção conseguiu atrair uma atenção vigorosa para “Beckett”, todos os nomes envolvidos criam algum chamariz que coloca o projeto no radar dos algoritmos, ainda que existam muitos nomes subaproveitados aqui, Vicky Krieps e Alicia Vikander cumprem um papel quase burocrático nessa narrativa, com pouquíssimo tempo de tela. E Boyd Holbrook, que até tem um tempo brevemente maior, mas também não mostra muito serviço, cumprindo uma função de mediação de certos clichês e dúvidas em torno das razões do “grande” mistério. Que no fim, é frustrante.

Tão perdido quanto o próprio protagonista, o filme tenta encontrar algum motivo que o fortaleça como ação, ou como drama, entre o comercial Netflix e a firula da A24. Acaba se atrapalhando e não consegue grandes coisas em nenhum dos dois lados, ainda que se diferencie das demais películas no catálogo da plataforma de streaming. Deve conseguir alguns números relevantes, mas não empolga e vai cair no esquecimento logo mais. Os grandes nomes envolvidos, midiaticamente, não conseguem salvar a salada mal temperada, e olha que Mukdeeprom até tenta.

2 Nota do Crítico 5 1

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