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Zumbilândia 2: Atire Duas Vezes

Atirando a Esmo

Por Jorge Cruz

Zumbilândia 2: Atire Duas Vezes

Quem está em evidência em Hollywood tem a prerrogativa de decidir os futuros passos de sua carreira a partir da escolha dos filmes que realizará. Há casos de grandes astros que cobram fortunas apenas para dar uma lida no seu roteiro. Por isso, ao analisar uma obra puramente comercial dos Estados Unidos, é um bom exercício olhar quem está na linha de frente. No caso de “Zumbilândia 2: Atire Duas Vezes”, temos uma Emma Stone milhões de vezes mais famosa que aquela que interpretou Wichita em “Zumbilândia”, lançado em 2009. Quase duas dezenas de filmes, geralmente na posição de protagonista, trabalhos com Woody Allen e Alejandro González Iñarritu, um Oscar na prateleira e outras duas indicações além de cachês milionários. Por isso é com surpresa que ela, na condição de viabilizadora deste projeto, não tenha atentado para a representação deplorável de outra personagem feminina, a estereotipada Madison (Zoey Dutch).

Parece que a construção razoável de sua personagem fosse suficiente, ignorando que cinema é coletividade. A equivocada inclusão de um quinto membro do grupo original é um dos pontos que denotam a falta de rumo de um roteiro feito a seis mãos. Utilizando o mesmo deboche do longa-metragem de 2009 e uma coerência estética, o jogo de Zumbilândia parecia difícil de ser perdido. Sem exagerar no realismo ultraviolento e colocando a comédia como norteadora da trama, o público que se divertiu com “Deadpool” (2016) brincando com o excesso de filmes de super heróis verá com bons olhos a mesma lógica aplicada às produções de zumbis. As infinitas regras criadas por Columbus (Jesse Eisenberg) e toda a rudeza de Tallahassee (Woody Harrelson), típico cidadão norte americano, são alguns dos elementos que servem de base para boa parte da ação.

Parece que “Zumbilândia 2: Atire Duas Vezes” tenta se aproximar da sátira política, ao ambientar seu primeiro ato na Casa Branca, jogando shade para o Presidente Donald Trump e seus eleitores. Todavia, se no primeiro filme a criação de um ambiente familiar incomum, em meio a um apocalipse zumbi, se revelou bastante eficiente, aqui as motivações penam para se revelarem razoáveis. O conflito homem x mulher a partir da dicotomia comodidade x inquietude se apresenta duplamente. Wichita questiona a prisão à rotina sentida a partir de seu relacionamento com Columbus – que lhe pede em casamento. O estopim para sair da zona de conforto se dá no desejo de sua irmão, Little Rock (Abigail Breslin) de vagar pelas estradas, se afastando do conforto da residência presidencial. 

Para chegarmos a aceitar essa guinada comportamental, o roteiro exige que nos adaptemos a uma realidade onde se naturalizou o risco de cruzarmos com zumbis assassinos em bandos a qualquer momento. Ao mesmo tempo há uma solução aplicada pelos humanos bastante crível: a de forjar instituições mesmo quando se vive em anarquia total. O fato de um pseudo matrimônio gerar uma discussão de relacionamento é um ótimo exemplo. Essa forma de pensar a sociedade casa muito bem com o argumento ao qual se baseia o texto do longa-metragem. Porém, há um fator que torna insustentável a manutenção dessa trajetória tão promissora: a necessidade da ação em conjunto. Como o filme foi visto em uma das salas do Espaço Itaú de Cinema, muito bem equipadas com o melhor áudio e imagem possíveis, a experiência de ver boas cenas de aventura – mesmo que injustificadas – foi prazerosa.

Lamentável ver que as maneiras como o roteiro desenvolverá a ação são totalmente forçadas. Começando pela já citada Madison, uma personagem que traz alívio cômico a partir do desagradável estereótipo de “loura burra”, creditando à vida no frigorífico de um shopping sua sobrevivência por uma década. Impressiona como, quase vinte anos depois de lançamento de obras como “Legalmente Loira” e “O Amor é Cego” (ambos de 2001) Hollywood ainda rasteje seus textos em piadas fáceis como essa. Há momentos constrangedoramente incômodos de interação entre Wichita e Madison, de humilhação e desvalorização enquanto os homens se divertem dando tiros a esmo. Por isso a surpresa por Emma Stone fincar o pé em uma obra assim. Sua personagem até se revela um bom contraponto, há força em seu discurso – à exceção dos diálogos com a “inimiga” que dormiu com o ex-namorado um mês depois do término do relacionamento. Só que as camadas do texto não podem ser boas apenas para o seu personagem ou corre-se o risco de estrelar um longa-metragem que já nasce anacrônico.

O roteiro vai além na forçação de situações. A primeira grande cena de ação, por exemplo, é forjada em uma tentativa de capturar um veículo maior apenas porque Tallahassee se incomodou com o outro. Não há verossimilhança na criação de situação de tão alto risco por um grupo de pessoas que há tantos anos passa por aquilo. Mais adiante, quando no segundo ato Luke Wilson cumprirá a cota de sua família de participações descartáveis em filmes de comédia, uma nova gênese artificial de aventura acontecerá.

Se não fosse essa ambientação falha, “Zumbilândia 2: Atire Duas Vezes” seria mais um road movie. Só que não sabemos até que ponto isso soaria negativo. Uma franquia, ainda mais em seu início, não deverá se pautar por gêneros – ainda mais uma obra que insere elementos de vários. O espectador mais desapegado à lógica e que procura apenas um combo de tiros e explosões com alguma coisa de zoeira pop deverá sair satisfeito, mas o fato é que dez anos na gaveta foram muito pouco para um projeto tão equivocado quanto esse.

 

2 Nota do Crítico 5 1

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