Ritas
A bela, a fera e a eterna rainha do Rock
Por Clarissa Kuschnir
Assistido durante o Festival É Tudo Verdade 2025
Algumas vezes eu preciso de um tempo para formular um filme em minha cabeça. Talvez por eu gostar demais do assunto que está sendo falado, eu preciso parar, refletir e saber exatamente expressar em palavras, o que me foi passado nas telas. E foi assim com o documentário “Ritas”, primeiro trabalho como cineasta e roteirista, do montador Oswaldo Santana, que editou trabalhos como: a ficção “Bruna Surfistinha” e os documentários “Tropicalia“, “A Ponte de Bambu“, entre outros. Aqui, o longa-metragem “Ritas”, que abriu como filme convidado a 30ª edição do É Tudo Verdade, em São Paulo, é todo direcionado através das palavras da própria Rita Lee. Inclusive, com filmagens feitas por ela, em sua casa, isolada no interior, como ela decidiu viver seus últimos anos, ao lado do marido e também musicista e compositor, Roberto de Carvalho. Além de suas flores e bichos, por quem sempre teve muita paixão.
E não há em “Ritas” como de alguma maneira não se empolgar sobre as histórias, e alguns dos inúmeros números musicais resgatados, da diva e ícone da nossa música, que nos deixou no dia 08 de maio de 2023, ou seja, uma data triste para nós que crescemos justamente nos anos 80, prestes a completar dois anos de sua partida. E quem diria que aquela pequena, doce e meiga loirinha (que anos mais tarde adotou os cabelos vermelhos). nascida e criada no bairro de classe média da Vila Mariana (um dos mais tradicionais de São Paulo), sendo educada também em colégio tradicional, viria a construir umas das carreiras mais sólidas e bem sucedidas da música, passando pelo conhecido grupo Mutantes (ao lado de Arnaldo Batista e Sérgio Dias), seguindo a carreira solo, emplacando vários sucessos e ganhando o título de a “Rainha do Rock brasileiro”?
Rita, para mim, e principalmente para “as mulheres”, tornou-se a voz feminina, muito à frente de seu tempo. E essa voz ecoa até hoje nas mais novas gerações. Neste “Ritas”, Oswaldo Santana tentou encontrar as diversas Ritas que existem na Rita dentro de um documentário bem montado, mas sem ousar muito, ficando inclusive um pouco aquém do que foi a artista. Talvez por eu estava esperando assistir a uma Rita mais atrevida e mais intrépida. Também senti falta de mais material e até de mais músicas, apesar de que algumas passagens apresentem essa Rita mais “porra louca”, mais “despirocada”, como se diz por aí. Por exemplo, uma dessas Ritas fala que quando o Corinthians era campeão, seu pai liberava lança perfume para todos em sua casa. Por isso, muitos gostavam de frequentar a casa de Rita, justamente por seus pais serem muito liberais, em uma época mais conservadora.
Analisando melhor “Ritas”, talvez o recorte do filme seja mesmo apresentar uma Rita mais sossegada, totalmente caseira e, apesar do título de rainha, mais gente como a gente, vivendo afastada, ao lado do seu marido com quem foi seu grande amor e parceiro dos palcos e da vida. Mas mesmo em seu isolamento, sempre manteve existir mais natural e verdadeira o tempo inteiro, como sempre fez questão de ser. Uma das passagens que mais gostei foi a das filmagens em que Rita e uma de suas netas adolescente conversam entre elas. E para quem foi da era dos discos e cassetes, ouvir a neta falando sobre os vídeos dos tiktokers é altamente divertido. Na parte musical, este documentário apresenta algumas de suas músicas conhecidas, compostas ao lado de seu marido como: “Mania de Você” (tema inclusive da novela homônimo da Rede Globo), “Doce Vampiro”, “Ovelha Negra”, “Lança Perfume”. Sim, é também um filme musical. Para relembrar e cantar junto (logicamente apenas na cabeça para não atrapalhar os outros espectadores). E isso para o público fã de Rita é o que importa.
Mesmo que falte material em “Ritas” para aprofundar mais a carreira de Rita, sem tantas interferências e entrevistas com amigos, produtores, musicistas, críticos de música. Assim, ao abrir a porta de sua casa, Rita aproxima-se mais do público, que se debruça em seu cotidiano, curtindo momentos raros de seu dia a dia. É, eu realmente acho que esse é o mérito do filme. E não precisar falar da morte da cantora, tampouco de como sua perda repercutiu pelo Brasil e principalmente na cidade de São Paulo, já que Rita amava a “Terra da Garoa”. Em “Ritas”, neste recorte de tempo e espaço, é como se ela estivesse viva, presente e eternizada na vida de seus fãs.