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O Exterminador do Futuro 6: Destino Sombrio

Realidade Alternativamente Alinhada

Por Jorge Cruz

O Exterminador do Futuro 6: Destino Sombrio

São tantos criadores de história e roteiristas em “O Exterminador do Futuro 6: Destino Sombrio”, que a ausência de um líder de grupo poderia tornar este o maior Frankenstein de toda a franquia. Há uma sensação de que o equilíbrio das decisões se concentra em David S. Goyer, envolvido na trilogia Batman de Christopher Nolan e Billy Ray, indicado ao Oscar por “Capitão Phillips” (2013) e responsável pelo primeiro capítulo da série “Jogos Vorazes” (2012). Isso faz do longa-metragem uma obra convincente em suas intenções, e bem construída em suas abordagens.

O filme dirigido por Tim Miller nos traz a realidade alternativa de que John Connor (Edward Furlong) foi assassinado em 1998, após algumas tentativas de envio de Exterminadores ao passado. Com isso, Sarah Connor (Linda Hamilton) se tornou uma espécie de Danielle Rousseau de “Lost”, uma andarilha que, após perder a cria, internaliza seu sofrimento e o externaliza através de tiros. Na nova ambientação, o líder da Resistência virá pelo ventre de Dani (Natalia Reyes), levando o espectador, assim como em “Rambo 5: Até o Fim”, ao México.

A escolha de Miller como diretor se revela um acerto. Mesmo sem muita experiência na função, ele já provou saber equilibrar a boa aventura com momentos que escapam do gênero em “Deadpool” (2016). Caso a Fox/Disney opte por abraçar essa linha temporal e a dinâmica de personagens estabelecida – o que dependerá muito da recepção do público a “O Exterminador do Futuro 6: Destino Sombrio” – é válida a tentativa de mantê-lo. Mesmo que no primeiro ato sua montagem nos coloque em diversas tramas paralelas, todas em cruciais momentos de estabelecimento de argumentos – o que traz uma sensação de piloto de seriado.

Os responsáveis pela saga abraçam de vez a ideia do protagonismo feminino, criando uma história que traz dignidade à Sarah Connor. Ao contrário de representações claudicantes nos longa-metragens sem Linda Hamilton, aqui suas aliadas são tão poderosas quanto ela. A primeira é Grace (Mackenzie Davis), meia-humana e meia-ciborgue enviada para proteger a futura mãe do futuro líder da Resistência contra a Legião, novo nome da Skynet. A segunda é Dani (Natalia Reyes), a própria Virgem Maria acima descrita. O que seria uma maneira de criar conectivos com Anjo Gabriel e a própria Maria, se transforma, na verdade, em uma relação de Santíssima Trindade quando Connor entra em cena. Interessante em Grace é sua estética suja, em conjunto com os cabelos curtos, que remete à protagonista de “Domino: A Caçadora de Recompensas”, interpretada por Keira Knightley no longa de 2005. Uma das personagens mais marcantes da filmografia de Tony Scott justamente pela visão crítica sobre privilégios e seu lugar no mundo enquanto mulher.  

Dessa forma, o longa-metragem se propõe a rediscutir a maternidade, algo que só aconteceu em “O Exterminador do Futuro”. A partir de uma nova protagonista que precisa ser protegida para servir de reprodutora do homem salvador, o roteiro coloca nos diálogos um questionamento acerca disso. O grande mérito de Miller e das três atrizes é trazer essa camada em uma obra que, desde “O Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas” prioriza a ação desenfreada. A nova tentativa de criação de uma heroína consegue tirar a impressão ruim do terceiro capítulo da saga, que viu em Kate Brewster uma representação incipiente. Essa proteção do útero e da visão da mulher como vítima-objeto não apenas carrega uma força narrativa adequada aos novos tempos como permite que todos os equívocos do passado na franquia sejam revisitados sem neuroses. Afinal de contas, assim como no mundo de Exterminador do Futuro, nós também estamos vivendo uma realidade alternativa, em que o trabalho de representação feminina na sociedade vem gerando resultados. Posto isso, questionamentos sobre a lógica da rapidez de aprendizado de Dani no manejo com as armas, por exemplo, incomodam menos já que servem a um propósito. 

Toda essa pertinência cria complexidades nas figuras de Sarah, Dani e Grace que nenhum outro produto desse cânone conseguiu, tangenciando questões como o desapego pelo objetivo de ser mãe já citado. Há no segundo ato a identificação de um ritmo mais claudicante, uma quebra por vezes cansativa, principalmente quando o Exterminador original, agora chamado Carl (Arnold Schwarzenegger), ganha espaço. No geral, esse resgate do personagem impõe a mesma dignidade oferecida à Sarah. Dando consciência humana a T-800, somos apresentados a um ciborgue em busca de objetivo e sentido na vida, uma autonomia que só consegue ser plena com a criação de vínculos afetivos. Há espaço para uma abordagem bem humorada, mesmo que acrítica, acerca do uso de armas e do lugar de fala do homem branco texano. Assim como John Rambo não coloca sua faixa vermelha na cabeça, o Exterminador também abre mão do óculos escuros – como se a humanidade agora embutida na mente daquele ciborgue o fizesse repensar comportamentos reiterados por entender ser o padrão. A diferença é que no filme estrelado por Sylvester Stallone, essa alegoria não existe pois a faixa é ignorada – enquanto que aqui o tema é trazido, mesmo que essa visão interpretativa se revele uma construção exageradamente metafórica para a maioria.

O trabalho de desenvolvimento dos personagens é notável e as cenas de ação de “O Exterminador do Futuro 6: Destino Sombrio” são impecáveis. Mesmo que não repita nada marcante em termos de sequência de ação, como visto nas três primeiras produções da franquia, vende a mesma indestrutibilidade em uma cena final que exagera nas referências a “O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final”. O filme de James Cameron, contudo, segue intocável no topo de uma saga que não demonstra sinais de desgaste. Pelo contrário, parece ganhar muita força com esse capítulo de entretenimento de muita qualidade.

 

3 Nota do Crítico 5 1

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