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E Então Nós Dançamos

Cisnes gregorianos em tentativas de amor

Por Fabricio Duque

Festival do Rio 2019

E Então Nós Dançamos

A essência da arte do cinema é contar uma história, que quase majoritariamente se desenvolve narrativas pela subjetividade das escolhas e de visão de mundo de seus realizadores, construindo assim uma condução participar ao público, ainda que pautada em uma estrutura mais padronizada das características comuns já condicionadas e palatáveis.

Este preâmbulo pode nortear o espectador quando assistir “E Então Nós Dançamos”, que nos mostra uma jornada existencial de transcender a própria orientação sexual, despertada como gatilho em uma Georgia ainda preconceituosa com a homossexualidade, gerando assim  o imaginário popular de que todo e qualquer homem após fazer sexo com outro homem adentra no submundo abandonado e depreciativo da prostituição.

Sim, a atmosfera do filme é exatamente essa. “E Então Nós Dançamos” tentar fugir da estrutura de ser apenas mais uma obra gay, com suas questões universais reverberadas pela unicidade do pessoal que precisa lidar com as convenções sociais, e, principalmente, em foco aqui, com a tradição do Balé Nacional da Georgia, baseado na masculinidade. “É mais que tradição, é o espírito da Nação, não só perfeição”, diz-se sobre a importância da arte de representar a dança. O que a obra aqui também faz é semear a contradição pela ideia de que bailarinos mais sensíveis são a “cara” de um povo “machista”.

Nosso protagonista, Merab, “dança” conforme a música, seguindo passo-a-passo todas as regras impostas de conduta (“começou a dançar quando começou a andar”). Mas é “suave e alegre demais”. Ele precisa ser um “prego” para traduzir e transmitir “pureza virginal sem sexo”. “Não é lambada”, exaspera o professor rude e perfeccionista à moda de “Anna”, de Heitor Dhalia; “Cisne Negro”, de Darren Aronofsky; e “Whiplash: Em Busca da Perfeição”, de Damien Chazelle. Com câmera próxima e em close que quer revelar a verdade por trás dos olhos e das expressões.

O longa-metragem simboliza uma jornada existencial. De crescimento de fracos em corajosos. Que nos apresenta um elemento nacionalista histórico do balé gregoriano clássico (com suas antigas imagens de arquivo) como base indicativa a fim de nos imergir em um comportamental crônica intimista sobre o quão é difícil sobreviver com a realidade do sonho projetado.

“E Então Nós Dançamos” é ingênuo em sua construção, porque abordar a descoberta sexual também soa inocente, por transpassar exatamente as mesmas provas, dúvidas, culpas, medos e desejos sexuais. Incluindo ser garçom para pagar as contas. Merab conhece Irakli, primeiro fica ameaçado, depois entra em competição defensiva na dança (adequação e exibição), sente-se vulnerável e adentra nas turbulências do amor (quando a conquista os une) ainda imaturo. E assim, “sofre de globalização”.

Sim, é a mesma história escrita em outra geografia. Há muito de “Me Chame Pelo Seu Nome”, de Luca Guadagnino, e “O Segredo de Brokeback Mountain”, de Ang Lee. Mas também há um pouco de todas as características utilizadas em todo e qualquer filme LGBTQIA+. Merab, pragmático, cuida de toda família, incluindo de seu irmão “ovelha negra rebelde”. Só que aqui, o ator Levan Gelbakhiani imprime em seu Merab um olhar de desejo contido e desconfiado. E é nessas sutilezas (como a primeira parte o cigarro compartilhado e na próxima cada um com um cigarro) que “E Então Nós Dançamos” ganha ritmo e novidade, apesar de comprovar o mais do mesmo.

Entre técnica, superação, empenho, cemitério armênio, a família que passa necessidades básicas, a fofoca dos vizinhos intolerantes após cenas constrangedoras da mãe na rua, o sentimento passional de abandono, o pai “desistente”, Merab aceita tudo, até mesmo entender em seu futuro a percepção de que ser “bailarino é ter uma vida de cão” e “praticar o tempo todo”.

“E Então Nós Dançamos” busca simplificar sua narrativa com a estrutura de uma novela, com o intuito de ficar mais palatável ao grande público. É um filme “algo do gênero” de arte adaptado à massa. É a odisseia de uma vida do “suave ao pesado” em uma Georgia ultraconservadora que pune os homossexuais, fazendo com que seja necessário um esforço máxima para não parecer gay, tampouco apaixonado. E “louco”. E com hesitações por falta de vivência da própria vida.

Só há liberdade entre amigos, com Abba e tudo. Merab embrenha-se no desconhecido. Sua vida vira de cabeça para baixo. E a mensagem fabular é a de que o Universo ajuda com o que “tem na mão”. Assim, ele foi precisou cortar zonas de conforto e ser obrigado a embarcar na aventura de sua própria existência, entre altos e baixos emocionais e a falta de visão das expectativas já definidas e definitivas. Sim, é diferente, contudo é exatamente igual a qualquer filme que trata os primeiros impulsos orientados sexualmente.

 

3 Nota do Crítico 5 1

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