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Clube Zero

Comer ou não comer, eis a questão!

Por Fabricio Duque

Durante o Festival de Cannes 2023

Clube Zero

Sempre há algum filme que causa um burburinho a mais quando é apresentado. Pois é, o longa-metragem da vez é “Clube Zero”, exibido aqui na mostra competitiva do Festival de Cannes 2023, dividiu opiniões extremas, ainda mais com o aviso prévio, nos créditos iniciais, de “cenas fortes”. A polêmica está na própria história dirigida pela austríaca Jessica Hausner (de “Little Joe”), que dividiu a escrita do roteiro com Géraldine Bajard, por trazer sua predileção pela estranheza da metafísica. Em “Clube Zero”, especialmente, o foco está no nascimento de uma seita, conduzida por uma líder de comportamento idiossincrático e neurótico, numa narrativa  de ambiência artificial. Sim, toda essa superfície vazia, que distancia os espectadores pelo tom surrealista, quase ridículo das ações, é sua maestria, porque imprime uma crítica à sociedade que destrói as defesas dos indivíduos participantes para seguir padrões inalcançáveis, não enxergando possíveis começos das vulnerabilidades alimentadas, que geram por sua vez reações extremistas. 

Com um que estético da estrutura fotográfica de Wes Anderson em cores super expostas, “Clube Zero” é um filme que “vai colocando as asinhas de fora”, por também ser uma obra de situações, ora permissivas, ora limitadoras. Outra referência foi o nome do diretor austríaco Ulrich Seidl como produtor nos créditos de abertura, mas que depois seu nome foi cortado inclusive do IMDB. Será talvez porque colocá-lo seria muito óbvio? Vamos entender! Tudo aqui é um exercício de argumento, em que é preciso que haja o confronto de opiniões. Essa crítica aos seres humanos, tão embevecidos na própria loucura de seus desejos e missões, acontece em uma escola, num grupo de ajuda com propósitos sociais, destinado aos desencaixados. É um curso que permite que expressem plenamente suas verdades, entre chocolates, chá, yoga, câmera que pausa, que acelera e que interfere no tempo real do momento. À princípio, a protagonista é apenas inofensiva. E é aí ao se desenvolver a “cegueira” dos outros que o filme se mostra. 

“Clube Zero” é uma uniforme crônica fabular de viés realista sobre o comportamento de nosso contemporâneo. É “vendido” a “nova moda” à nova geração, que tem fogo ideológico nos olhos e quer consertar o mundo. Ser vegano, não usar nada que maltrate os animais. Mas também são tipicamente contraditórios com a imagem que querem passar aos outros, como a bulimia, por exemplo. A “nova moda” precisa “salvar o meio ambiente” e “comer pela consciência”, a “autofagia”. Cada etapa, um alvo é encontrado. O presunto, outro exemplo. “Comer menos, resta mais dinheiro”, “ensina” com capitalismo à favor. Sim, quanto mais o filme avança, mais somos imersos nessa loucura coletiva, talvez o som intermitente de uma batida de um tambor nos obrigue a experienciar o transe, a revolta e a entender toda essa ideologia radical. 

Tudo aqui é um jogo. Uma negociação. Uma retórica intimidadora e disciplinadora de uma nutricionista lunática que manipula a psicologia para não “perder o futuro”. Pois é, é aí que a polêmica começa. Esse “Clube Zero” dá certo. Seus seguidores melhoram o foco e aumentam seus desempenhos. Apenas optando por não comer, mesmo que tenha um ou outro aluno “rebelde”. Mas depois consequências são desencadeadas: desmaios, falta de vitaminas. Confesso que não entendi mesmo o burburinho dessa polêmica toda. Talvez por causa da crítica à diretora por conveniência e/ou por causa dos pais ausentes. E/ou por causa do argumento da bulimia (que se expressa válido e faz pensar). 

“Clube Zero” fez com que eu referenciasse o seriado “South Park” pelo nível de argumentos ridículos que são tão bem embasados que se tornam críveis. E por também nivelar pais e crianças com as mesmas ideias. Sim, é inerente ao ser humano a imaginação fértil. A querer impulsionar os próprios projetos pensados. Uma pessoa tendo essas ideias, é no mínimo curioso, mas quando um grupo “compra” a oferta, então é preocupante. Esse surto coletivo pode conseguir realizar tudo o que foi arquitetado, como o final de “Clube Zero”, sem spoiler, lógico, que quer nos dizer que uma simples quimera, um simples aceite de convicção pode ir longe demais. Estou no grupo dos que “engoliram” o filme. “Clube Zero” pode soar como um filme bobo, superficial, de humor equivocado e de vontade única em querer chocar, mas não é. Há muito mais camadas e ingredientes nesse chá. 

4 Nota do Crítico 5 1

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