A Menina Que Matou os Pais – A Confissão
“Eu que sou a filha”
Por Vitor Velloso
Amazon Prime Video
Se antes a investida em um projeto televisivo que dividia as perspectivas em dois filmes distintos parecia cafona, agora a coisa perde ainda mais o sentido. Em “A Menina Que Matou os Pais – A Confissão”, de Maurício Eça, o espectador é convidado a assistir a investigação que conclui os culpados do emblemático caso Suzane von Richthofen, Cristian e Daniel Cravinhos. Aqui, o projeto vai ganhando desdobramentos que não acrescentam nada a história que já era mal desenvolvida nos longas anteriores, força uma exposição do amadorismo dos assassinos e, por falta de sentido em si, vai revirando a frieza de Suzane em festas à beira da piscina, em sua vontade de transar após o crime etc. Se a intenção do cineasta era demonstrar a “banalidade do mal”, falhou rotundamente e só reforçou todos os problemas que estavam nos outros dois filmes: “A Menina que Matou os Pais” e “O Menino que Matou Meus Pais”.
Com atuações que comprometem gravemente qualquer imersão do espectador, a película volta a possuir uma fotografia de contornos novelesca, diálogos expositivos, dramas artificiais e uma trilha sonora que tenta criar algum tipo de tensão em uma história que todos estão saturados. E é inusitado como o roteiro impõe o diálogo dos policiais para as obviedades do crime como se fosse necessário explicar o tempo inteiro ao espectador como o amadorismo deles é impressionante. Esse excesso de didatismo é um desrespeito com quem se compromete minimamente com a obra, pois ele se repete a cada nova cena de “investigação”, reiterando as fragilidades dessa “minissérie”.
Os cortes rápidos, as falas completadas e as conclusões dos investigadores, fazem de “A Menina que Matou os Pais – A Confissão” uma situação quase paródia de si mesma. Não por acaso, para cada elemento novo apresentado, os pequenos zooms puderam provocar alguma risada durante a reprodução do filme, deixando tudo mais desconfortável. Mesmo quando Bárbara Colen procura dar alguma dimensão mais centrada, o longa carece de um mínimo de propósito. Provavelmente esse era o maior desafio aqui, conseguir dar sentido a mais um investimento em uma epopéia que chega agora a praticamente quatro horas e meia de duração. Por outro lado, é necessário afirmar que este é o que tem a estrutura menos caótica da trilogia, conseguindo ter uma linha minimamente lógica de construção narrativa, ainda que precária. Assim, era esperado que houvesse um trabalho mais sério em torno da repercussão midiática do processo de investigação ou mesmo de um desenvolvimento honesto ao personagem do Andreas Albert von Richthofen, interpretado por Kauan Ceglio, mas ele seguiu sendo um coadjuvante que soma no máximo dez minutos de projeção. Não é impossível que lancem mais um projeto envolvendo algumas dessas questões, pois aparentemente a quantidade de reproduções na Amazon Prime Video ainda permanece alta.
É uma pena notar que as produções para os serviços de streaming e televisão têm se voltado cada vez mais para essas reproduções de crimes, seguindo o padrão que vem dos EUA. Mesmo sendo repetitivo retornar a esse ponto, é importante para que possamos refletir mais por onde caminha o audiovisual brasileiro. Está claro que existem uma série de obras que se distanciam dessa fórmula crescente, mas é preocupante que podcasts, filmes e séries estejam reproduzindo o modelo que o brasileiro tanto criticou ao longo de décadas.
“A Menina que Matou os Pais – A Confissão” pode ser o mais redondo da trilogia, porém segue um conteúdo formulaico, que se esvazia de sentido na intenção de ganhar cliques ao remoer uma história macabra, levantada pela mídia justamente pelo motivo que a personagem de Bárbara Colen diz no filme: “Assassinato em Campo Belo”. Ou seja, mais um caso onde a mídia mira no true crime apelando para um crime bárbaro da classe mais abastada do país, aliás é onde as câmeras estão dispostas a ir. E o público sabe quem está mais interessado com o lucro disso.