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Wallace & Gromit: : Avengança

Seguimento qualitativo

Por Vitor Velloso

Wallace & Gromit: : Avengança

A franquia de filmes “Wallace & Gromit” é um sucesso inquestionável, sempre conseguindo angariar mais público, prêmios e reconhecimento. O novo filme, “Wallace & Gromit: Avengança”, de Nick Park e Merlin Crossingham, é mais um projeto que consegue gerar algum humor, à la comédia britânica, sem precisar forçar situações piegas e/ou apelar para o didatismo tacanho e industrial de outros longas de animação que possuem dificuldade de dialogar com diferentes públicos.

A estética da animação segue o padrão dos filmes anteriores, com o complexo trabalho envolvendo a modelagem dos personagens e a construção de um universo que é tão caricato quanto representativo de determinadas particularidades da realidade contemporânea. É certo que a trama de “Wallace & Gromit: Avengança” não é nada original, com um vilão que utiliza robôs domésticos para realizar seus planos, mudando as configurações de cada um deles para que eles façam o “mal”, trabalhando na velha chave clichê e já amplamente debatida acerca da forma como a tecnologia pode ser utilizada por qualquer um e para qualquer fim. Talvez o interessante aqui seja tentar compreender parte das discussões propostas pela obra através dos acontecimentos contemporâneos, sejam eles acerca de debates em torno da inteligência artificial ou do descaso de “criadores” e “magnatas” que possuem um poder monstruoso em suas mãos e têm uma postura cada vez mais questionável, para não dizer criminosa, com o passar dos anos.

Se aqui a lógica é oferecer uma certa perspectiva de ingenuidade para essa articulação, no mundo concreto a lógica é justamente a oposta. Aliás, toda e qualquer forma de ingenuidade deve ser suspensa para que qualquer responsabilização seja feita e aplicada com o devido rigor. De toda forma, “Wallace & Gromit: Avengança” arquiteta sua estrutura entre a possibilidade de dialogar com o público infantil e pequenos traços que permitem aos adultos compreenderem piadas e referências de forma distinta, e essa habilidade não é tão simples de se fazer quando o ponto cômico é a característica britânica, de um humor crítico e ácido, com uma fisicalidade, aqui muitas vezes compreendida como sinuosos movimentos de objetos e personagens, que, apesar de estimular algum grau lúdico em suas “performances”, fixa-se como uma representação direta da própria base narrativa. Não por acaso, o filme não perde seu ritmo em nenhum momento, seja em qual eixo “dramático” está se desenvolvendo a história, pois a diretriz é formular uma espécie de sketch que funciona dentro da trama, mas que é capaz de ser reconhecida como um momento específico e particular. Esse talvez seja o refino do humor britânico: sua capacidade de transitar com tamanha organicidade entre blocos praticamente isolados e a versatilidade para retomar a trama principal com uma fluência realmente invejável, algo que os demais projetos industriais norte-americanos encontram tanta dificuldade em fazer.

Assim, é compreensível o reconhecimento da franquia ao longo dos anos e sua indicação ao Oscar 2025, mas o filme não possui características que o distinguem tanto dos demais longas que conseguiram grande repercussão com o passar do tempo, sendo apenas mais um ponto dessa sequência que possui bons momentos, mas não consegue se distanciar dos outros títulos “Wallace & Gromit”.

Embora continue a ser uma expressão da singularidade do humor britânico, é interessante notar como a franquia mantém sua relevância ao longo do tempo, adaptando-se aos desafios contemporâneos sem perder sua essência. O filme se aproveita da nostalgia dos fãs e da sofisticação do stop-motion, uma técnica que, embora desafiadora, contribui para uma sensação de autenticidade e detalhamento visual que os métodos de animação digital não conseguem reproduzir com a mesma intensidade. A obra explicita, assim, uma espécie de resistência à “industrialização” da animação, mantendo o apelo artesanal e, por consequência, a sensação de que algo genuíno está sendo entregue ao público.

Ao mesmo tempo, no contexto atual de transformações tecnológicas e culturais, Wallace & Gromit: Avengança” também toca em questões mais amplas sobre a relação entre os humanos e suas “inovações”. O uso dos robôs no filme como ferramentas para o mal, quando re-configurados, pode ser visto como uma crítica sutil às consequências não previstas de tecnologias que são colocadas no mercado sem a devida reflexão sobre seu impacto social e ético, e por figuras questionáveis da contemporaneidade. Assim, o bom filme não é capaz de alcançar destaques maiores. 

3 Nota do Crítico 5 1

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