Curta Paranagua 2024

Volume Morto

"Aclamado na Europa"

Por Vitor Velloso

Festival de Brasília 2019

Volume Morto

O suspense que não assume forma, o terror que não assume rosto e o filme que não possui corpo. “Volume Morto” de Kauê Telloli é uma montanha russa monótona. Flerta com diversos gêneros, assume diversas características, não por versatilidade, mas falta de argamassa em suas propostas. Em diversos momentos o filme não se encontra, gira em torno de suas próprias ideias sem encontrar os pilares. O longa se torna um looping constante que se repete até o esgotamento, findando em perda de consciência. É uma espécie de fetiche formal que acomete a obra e acerta em cheio a trave o tempo inteiro.

As inclinações referenciais às últimas novidades do terror brasileiro até conseguem se projetar com certa proeminência, porém o longa não se encontra no próprio labirinto que constrói, acredita na tensão criada a partir de sua misancene, de nós táticos no roteiro e pontos de fuga na linguagem. Mas essa fé não é traduzida para o espectador, a suposta confusão e complexidade narrativa é fruto de vácuos construídos em torno dos arquétipos do gênero, pois ainda que não se exponha ao fantástico ou ao terror em si, está sempre flertando com o que há de mais tacanho nas fórmulas. É uma espécie de tautologia da própria estrutura, da forma e de um conteúdo que tenta se esconder de possíveis arestas.

Esse sufocamento dos padrões de exposição escondem a apatia com que a narrativa se desenrola encontra seus platôs, fugindo de temas espinhosos e sempre relacionando sua objetividade com as privacidades de seus personagens. “Volume Morto” crê fielmente em sua complexidade como fruto de uma representação do cinema de gênero e das relações interpessoais, mas apenas deposita a opacidade estéril do cinema que tenta encontrar nas correlações burguesas da cinematografia contemporânea. Transviada, formalista, que reproduz uma transa entre as “novidades” que se formulam no mercado, encontrando os escapismo em resoluções não pragmáticas diante de sua própria estrutura.

Agora, se tudo parece estar funcionando de forma tacanha, essa consciência da linguagem é o que faz o espectador permanecer até o fim da projeção, porque ao menos a atenção o longa consegue concentrar, não necessariamente alcança. A narrativa construída pela linguagem se torna uma inconstância, a verdadeira montanha-russa perseguida pela multiplicidade que a obra busca em suas referências e gêneros, mas a colcha de retalhos apenas retira as expressões da proposta. Se um dia interessou apenas “o que não é meu”, aqui é o imbróglio do que sobra depois da soma. Face axiomática do cinema brasileiro contemporâneo fazendo as andanças com o fantástico é não compreender a fonte da mitologia. A articulação é uma resposta direta de como nossa cultura passa a assimilar o materialismo e a fé como força uníssona de enfretamento da realidade, subdesenvolvimento e dependência. “Volume Morto” apropria o conceito para os universos das particularidades em uma relação de poder, classe, que é atravessada para que possamos vislumbrar as “leituras” de sua narrativa e personagens.

Algumas evidências surgem nos diálogos expositivos que são amparados, dramaticamente e pela montagem, pelos recortes da tela do celular no grupo das mães no Whatsapp. A lógica não é nova e a claustrofobia que o longa tenta gerar, evidencia o raquitismo de sua estrutura e de uma linguagem que possui consciência de seus movimentos, mas não reconhece a matéria que forma o que tem nas mãos. Existe uma deturpação na idealização desse fantástico como frente de uma estrutura para as privacidades de uma filmografia que se curva diretamente aos interesses dos grilhões, em especial na forma.

Não estamos tão conscientes do pé que nos encontramos. Síntese tropykal. Mas os olhos vêm cansando da esterilidade que parte do cinema vêm se portando, é um formalismo tacanho que entra na roda para a retroalimentação do público e da produção. A panela é boa para quem tá nela. É o barato do ego.

Para cada espinho que o filme desvia, uma porrada acaba surgindo. E a informalidade aqui existe estritamente para lembrar que o diretor deve assumir as responsabilidades das polêmicas que enfrenta, não fugir das mesmas.

“Volume Morto” não é o maior representante da falibilidade do brio burguês, mas é sem dúvida um dos encerramentos mais cansativos para o cinema brasileiro em 2020, em Brasília.

1 Nota do Crítico 5 1

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