Vermelho Monet
Protótipo, sem título
Por Vitor Velloso
Festival Cine PE 2022
Dirigido por Halder Gomes, que possui trabalhos como “Cine Holliúdy” (2013), “O Shaolin do Sertão” (2016) e “Os Parças” (2017), “Vermelho Monet” é uma investida distinta do padrão conhecido do diretor, que procura traçar um drama de caráter artístico sobre “paixão, tesão, desejo, obsessão e arte”. Ao menos é como o filme procura se apresentar ao espectador, como um emaranhado de palavras-chave do que seria uma discussão pretensiosamente artística de alto padrão intelectual, debatida no cenário europeu, transitando entre tantas línguas que a torre de babel de vinhos e discussões intelectuais se multiplica no seu caráter internacionalizante.
Sem dúvida é um filme de distribuição limitada, que visa um público bastante particular, que abrange tantas pseudo-ideias, que sua faceta poliglota deixa de traduzir qual sua verdadeira intenção. Já em seus primeiros minutos, “Vermelho Monet” esclarece o tom da obra, com música clássica, entre o corpo de uma modelo nu e a raiva do artista Johannes, interpretado por Chico Diaz, com o resultado de seu esforço artístico. Essa primeira cena, construída em planos detalhes e uma montagem que parece fazer esforço para não permitir que o espectador contemple o cenário caricatural do pintor, não poderia deixar passar uma alusão cinematográfica, onde a sombra do personagem é projetada na tela, enquanto sua obra é exposta ao público, e destruída. Não obstante, o filme parece dialogar com todo tipo de estereótipo que a grande mídia construiu de um artista plástico, que como um reflexo da própria limitação, encontra um desenvolvimento dramático conturbado que está mais interessado em ser sedutor em seus diálogos proto-intelectuais e na irascível reação do artista com sua crescente acromatopsia. Em alguma medida, o esforço em demonstrar ao público como funciona a visão de Johannes, no sentido literal, apenas reforça um caráter da obra de procurar uma formulação estética que possa criar contraste em si, isto é, diferenciação na representação e possibilidades imagéticas. No fundo, é de profundo desagrado que haja a intenção de atrair o espectador para um universo onde nada possui uma verdadeira relevância dramática, com exceção da superficialidade exposta nos diálogos mal resolvidos, que expõem mais o filme que os personagens em si.
Não por acaso, a constante necessidade de utilização de efeitos que emulam o traço de um pincel na tela e toda uma mínima exposição de como funciona o mercado artístico, o padrão de gostos, a “alta cultura e sociedade”, a falsificação, desejos reprimidos, memórias, sexo, tesão, paixão e cor. Porém, nenhum desses tópicos é minimamente levado adiante, funcionando apenas como gatilhos para desenvolver cenas isoladas, em uma narrativa que de tão pretensiosamente óbvia, possui ares de sátira. Talvez o momento mais explícito dessa verve de “Vermelho Monet” seja o diálogo entre Florence, interpretada por Samantha Heck Müller, e Antoinette, interpretada por Maria Fernanda Cândido, que apesar das trocas de olhares com nítido desejo, parecem abraçar o caráter mais intelectual de varanda possível, com Antoinette falando de grandes pintores, da necessidade do desejo e paixão na arte, e a outra, em tom jocoso, proferindo frases como “Portanto, é alquimista! Capaz de transformar merda em arte”, segundos depois Antoinette declara que “Coubert era mais Xvideos” e Florence quase cospe seu vinho, aparentemente impressionada com a franqueza do comentário de Antoinette. Vale mencionar que não conheço o trabalho de Samantha, mas seus gestos de espontaneidade não conseguem convencer o espectador.
Se toda essa suposição e pretensão de um mundo artístico altamente intelectualizado e irascível fragiliza “Vermelho Monet”, pode-se dar crédito à direção, e direção de fotografia, por oferecer o disparo fatal. Justamente por se agarrar ao tipo mais clichê e burocrático, com seus diálogos embaralhados de maneira pretensiosamente fragmentados, por insistir em uma estética que procura sedução nos cenários que apresenta, sem conseguir criar nenhum tipo de dramaticidade para seus personagens e fazer com que o tesão e a paixão, tão citadas ao longo da projeção, sejam tão assépticos que o espectador saia da sessão esgotado, como se saísse de um ritual de alta sociedade que cita que “a arte existe porque a vida não basta” para tentar justificar aquilo que o espectador acabou de presenciar por duas horas e vinte.