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Última Cidade

A regionalização e o arcaico

Por Vitor Velloso

Durante o Cine Ceará 2020

Última Cidade

“Última Cidade” de Victor Furtado é uma demonstração dos encaminhamentos do mercado nacional nos últimos anos. Uma desarticulação da narrativa e a montagem que rompe os fluxos imagéticos são pontapés iniciais para as formulações da obra. Mas sua estrutura busca uma aproximação direta com a política brasileira como um grau de exposição da realidade, ou seja, a discussão em si, se torna uma questão secundária para os formalismos aqui presentes. Em verdade, o longa acaba se destacando por conseguir uma forma cinematográfica que abarca uma série de questões internas da própria narrativa, sem ceder à grandes parábolas dramáticas em suas proposições políticas.

O projeto opta por determinados vácuos na própria estrutura, afim de sintetizar um deslocamento temporal, mas fortalecer um questionamento de sua geograficidade. A estratégia funciona parcialmente, pois nos primeiros minutos, o espectador se vê interessado em decifrar parte das conjunturas que vão se somando, tal como as referências. De Glauber à Jodorowski, Júlio Adrião vai tentando dominar o ecrã como quem delira à desidratação espiritual. Porém, parte do posicionamento da obra a partir de suas chaves formais, soam mais uma tentativa de conciliação direta com um projeto cinematográfico pré-estabelecido, que necessariamente uma proposição que argumenta em torno dessa “brasilidade” que não sai de um pano de fundo. Neste ponto, o argumento se aproxima da peça “A descoberta das Américas”, do próprio Adrião, que parece ter esquecido grandes verve do Brasil contemporâneo para se curvar ao modelo “necessário” do Brasil. Aqui, a modernidade soa uma “redescoberta da linguagem” quando sua articulação cria um revisionismo perante essa alma brasileira.

Em seus piores momentos e movimentos, o modernismo primário brasileiro parece encontrar em “Última Cidade” uma resposta que sintoniza tal estética à vulgaridade desse contemporâneo. O adjetivo aqui só pode ser compreendido como a exposição que se concretiza a partir de uma materialização desse brio em sobrepor referenciais e convergências de ideias a partir da própria linguagem. E tal escolha gera uma cansaço contundente para o espectador, pois a repetição constante dessas intencionalidades acaba saturando a forma, alcançando um platô de novas propostas. Não à toa, o filme atinge momentos absolutamente tediosos em sua construção, o que quebra não apenas o ritmo da exibição, como o próprio interesse do público em manter-se diretamente conectado com a trajetória de seu protagonista. Com isso, os setenta minutos de projeção, passam a sensação de pelo menos, o dobro.

Essa estagnação do cinema brasileiro contemporâneo em exposições políticas torna todo o processo histórico totalizante uma mera projeção da realidade nacional, logo, “Última Cidade” não consegue se distanciar do abismo da mesmice da apresentação problemática sem debate ou resolução. Por fim, o longa não consegue criar uma característica formal que o destaque dos demais, como a pretensão inicial, talvez por estar preso demais às amarras desse primitivismo modernista, como Zé de Alencar e trabalhar as representações como objetos para sua forma cinematográfica. E essa é a tônica que permeia a obra, uma “descoberta” desse formalismo modernista transportado para uma consciência contemporânea de representação e reverências.

Não necessariamente essas bases formalistas para uma concepção de “representação” consolida um movimento reacionário propriamente dito, isso está ligado diretamente à abordagem dessa forma-conteúdo como monumento uníssono de concepção única e materialista, do contrário estaremos perpetuando uma consciência revisionista e não crítica de uma historicidade do cinema brasileiro, que como tautologia é a representação de uma das frentes possíveis para a cultura como uma análise econômica, política e social.

A crise na Academia é a tentativa de assimilar o discurso, que é a forma de uma dialética em torno do axioma e das antinomias produzidas através de uma estética de violência, sons, imagens e a transa audiovisual que dá a consumação do casamento de crises entre a burguesia e Academia, que são por síntese, a mesma classe. Sendo a burguesia acadêmica, a detentora da publicação científica, da forma, da passagem de conhecimento.

Glauber assassinou Sebastião em traição consciente às portas do Maracanã, deturpou o mito como sacristia da que nos pariu, profetizou o novo milênio, ainda assim parte do cinema brasileiro segue mandamentos arcaicos para uma brasilidade, mas ainda reforça a regionalidade da cultura nacional.

2 Nota do Crítico 5 1

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