Revolução Lavanderia
O significante vazio
Por Vitor Velloso
Durante o Festival Ecrã 2020
Onde se encontra no beco sem saída da falta de perspectiva estética? Que se faça a luz. Esquema pronto de filme ensaio que não faz ideia por onde caminha, mas sonha em atingir um processo (aqui utilizo o mesmo conceito de antes, na crítica de “A Verdade Interior”) durante o período de produção. Ou seja… lá vamos nós para mais uma experiência de “perdidos no cinema experimental”.
A direção assinada por Mark Chua e Lam Li Shuen traz em “Revolução Lavanderia” tudo aquilo que a insegurança transpassa para um projeto, uma perda de sentido e “valor” (sem a demagogia de sentido) da própria produção. É algo que se nota durante todo o período de exibição, uma perda constante de um pseudo rumo que teoricamente a “narrativa” possui. As coisas vão circulando em “memórias”, debates filosóficos que surgem em meio ao nada e frases de efeito que tentam captar a essência dessa pequeno-burguesia produtiva. As correntes filosóficas assumidas aqui vão surgindo conforme determinadas falas de personagens e morrem nas mesmas, não saem de meras citações pretensiosas que tentam captar o espectador através dessa influência excessiva.
Soa como um processo de expôr as últimas tendências das leituras de ambos diretores, não propriamente um discurso que aborda uma unidade a partir da estética e da montagem. Tudo é solto e parece querer convencer que essa “despretensão” da história está diretamente ligada à uma caminhada espiritual dos protagonistas pela “herança”, o pequeno furto e o encantamento por aquilo que não se compreende. E essa tônica da incompreensão, rende momentos verdadeiramente embaraçosos para o longa. A cena do garoto perguntando ao diretor de cinema, é particularmente triste para o encaminhamento do pretensiosismo classista.
E a última afirmação traz diretamente consigo algumas articulações meramente ilustrativas que são propostas aqui. A câmera que passeia pela cidade, mostra sua poluição visual, seu excesso, sua sujeira, a velocidade de uma megalópole. Mas até nessas circunstâncias tudo soa artificial e exageradamente reverencial ao cinema experimental canhestro, que tenta achar espaço em meio à tentativa fálica de horizontalizar um meio vertical. Nada próprio surge na tela e as coisas vão se desenrolando com arquétipos pragmáticos de uma “poesia” de quinta, onde acredita encontrar os prazeres mundanos na pequenas coisas. Novamente, podemos recorrer à pensamentos de outrora, como Pasolini discorrendo sobre uma espécie de “homogeneização psicológica de anseios entre as classes”.
“Revolução Lavanderia” tenta chegar em Bong e alcança Benning, mira o frágil e acerta o intempestivo defensor do “nada”.
Onde tudo parece se encontrar no ponto de partida, uma inocuidade tão densa de vácuos reverenciais, podemos discutir o mínimo, por onde caminha esse tipo de cinema experimental. É claro que as palavras utilizadas podem trazer variações diversas para a temática e o debate, já que múltiplas vertentes podem ser evocadas através de “tipos” (e não tenho o menor interesse em relativizar qualquer sub categoria totalizante ou excludente do que seria “cinema experimental”), mas se pensarmos através de um cinema que tenta se colocar em um objeto estranho, aqui, a cidade, muitos projetos tentam alcançar essa particularidade de cada local. Poucos conseguem, pois para que se consiga realizar um olhar particular para aquilo que lhe é “estranho”, seja a cidade ou mesmo aquilo que a compõem, é necessário despir-se do pensamento pequeno-burguês, ou se quisermos ir além, permitir que uma antropologia da imagem se faça enquanto projeto.
Está claro que “Revolução Lavanderia” é absolutamente desprovido de seguranças quanto ao seu encaminhamento, mas possui tais fragilidades em todos os campos possíveis. Ao falar de Heidegger, Barthes e qualquer universo totalizante da razão, parece querer se aproximar de um ensaio, porém apenas consegue afastar-se da forma do mesmo, enquanto tenta a auto-masturbação burguesa de aplaudir os incrédulos.
Nem uma perseguição fictícia é concebível no filme, tudo soa barato, culturalmente turvo e inglês demais. A torre de babel instaurada aqui, ainda é incapaz de se compreender enquanto elemento estranho nesta cidade conturbada, apenas busca um passeio pretensioso de forma e discurso, mas prosaico em suas andanças. Alienador, redundante, inócuo e sentimentalista, no pior sentido da palavra, “Revolução Lavanderia” pode até lavar roupa suja, mas faz isso com farda de estrangeiro, sem a primeira palavra, perdida na imaginação dos outros.