Prédio Vazio
Fantasma
Por Vitor Velloso
Assistido presencialmente na Mostra de Tiradentes 2025
A qualidade cinema de horror brasileiro não é uma novidade para o cinéfilo, Jean Garrett e José Mojica, para citar apenas dois exemplos, já entregaram algumas das obras de terror mais interessantes da cinematografia nacional. Contudo, o discípulo de Mojica, Rodrigo Aragão, caminha em uma direção diferente, com investidas mais comerciais e uma estética que compreende mais o universo contemporâneo do terror, incluindo suas características regionais. “Prédio Vazio”, integrante da Olhos Livres na Mostra de Tiradentes, é um belo exemplo de como o cinema de horror pode abordar uma série de temáticas sociais e econômicas, utilizando Guarapari como cenário principal, sem perder o foco das imagens e criaturas que geram choque imediato.
Aqui, a ideia é menos gerar medo e sim trabalhar com as pequenas tensões das sequências, seja com a bela sacada do roteiro de usar o óculos como recurso ou mesmo a cena do “Filhos da Esperança” macabro. São cenas marcantes para quem assistiu e não é nosso dever estragar a experiência de quem irá assistir posteriormente. Portanto, alguns elementos de humor podem ser encontrados em “Prédio Vazio”, pro bem e pro mal, dependendo de como o espectador vai encarar os elementos mais absurdos da trama e das cenas. Porém, sem dúvida, os grandes destaques do filme são os efeitos e maquiagens, especialidade de Rodrigo, e a atriz Gilda Nomacce, que encarna uma personagem dúbia, com motivações questionáveis e atitudes que deixam o espectador em dúvida sobre suas intenções.
Está claro que é um tipo de cinema muito fácil de ser atacado por um grupo de espectadores, seja pelo tempo das imagens, estrutura do projeto ou mesmo a articulação do terror em si. Provavelmente, a maior parte das alegações irão se debruçar sobre a possibilidade de uma estética importada ou argumentos similares. Em verdade, a análise sobre “Prédio Vazio” deve superar comparações com Mojica ou qualquer elucubração acerca de como as imagens debatem temáticas e pautas sociais para além da exposição, mesmo que superficial, pois o mérito do cinema de Rodrigo aqui é conseguir trazer para o grande público um gênero que é tão banalizado, quando não ridicularizado, especialmente quando o assunto é cinema nacional. Por essa razão, antes de procurarmos discussões e aprofundamentos temáticos, devemos nos concentrar na intenção da democratização do acesso ao cinema de horror brasileiro. Qualquer tentativa de expansão nesse sentido, terminará em frustração ou revolta.
Neste sentido, o foco aqui é o entretenimento, a diversão de ver Gilda Nomacce em um papel que permite a atriz entregar o que ela tem de melhor, os efeitos práticos que já distanciam a produção de parte do cinema praticado no Norte e a recusa pelos sustos fáceis e constantes, por mais que eles existam em alguns momentos. A partir destes recursos, comuns ao horror, o longa até perde força em alguns momentos, especialmente por algumas interpretações e situações um tanto desajustadas, mas o público que abraçar “Prédio Vazio” sem nenhum tipo de julgamento e/ou preconceito, irá se divertir até nessas possibilidades de constrangimento. Aliás, durante a sessão no Cine-Tenda, as risadas eram constantes e o divertimento era nítido.
Esse tipo de projeto deve ser compreendido dentro de seu contexto, sem que haja uma imposição discursiva exterior, normalmente elitizada e procurando um tipo de cinema que nunca foi proposto por Rodrigo. Vale mencionar também, que há uma leitura exacerbada sobre determinados cineastas e filmografias, que além de anacrônicas, recusam os depoimentos dos envolvidos acerca do contexto da produção dos filmes, como no caso de Mojica.
Por fim, “Prédio Vazio” flerta com Dario Argento em determinados momentos, mas se encerra como um projeto brasileiro, aliás um projeto de Guarapari, expondo uma realidade particular vivida por cidades que vivem de temporadas e tornam-se parcialmente fantasmas ao fim desse fluxo. Pode não debater com a profundidade pretendida por determinados espectadores, mas a proposta é o entretenimento, o horror, a situação absurda e a contextualização fantasmagórica de um prédio/região que recebe tantos visitantes como moradores atormentados pela sazonalidade parasita de dramas que dialogam mais com o mal do que podemos perceber. Afinal, qual a diferença entre as relações pessoais entre parte das personagens? A moralidade com que cada uma enfrenta seus fantasmas, medos, erros e dramas. O resto é fantasma e sangue.