Passagem Secreta
Coisas Estranhas
Por Vitor Velloso
Durante a Mostra de Tiradentes 2021
Único filme presente na Mostrinha de Tiradentes, “Passagem Secreta” de Rodrigo Grota é um longa que vai ao encontro do universo de fantasia das crianças para criar um entretenimento massivo que é capaz de unir a família em frente a telona. Neste campo, o projeto funciona bem em criar uma atmosfera que detém a atenção do jovem público e formaliza um universo que funciona em torno dos mistérios e de conclusões dramáticas que estão sempre emaranhadas de suspenses e intrigas.
A narrativa é conduzida com lentidão para que o barato comece a acontecer, mas sempre com algumas pinceladas que podem manter o espectador mirim mais atento ao desenrolar da história. Os diálogos expositivos reforçam o tom didático para cada nova aba que é aberta na trama, porém as duas histórias que o filme parte, inicialmente paralelas e depois convergindo, são de tons tão distintos que existe um platô de ritmo e interesse aqui. Esse desnível custa caro. A produção se torna pouco atrativa e passa a jogar com clichês dramática muito batidos para conseguir formular suas questões familiares. Os momentos no colégio são de desanimar o mais fiel escudeiro, os diálogos e as interpretações comprometem o funcionamento de tudo, as coisas passam a degringolar e a narrativa se torna cansativa, desinteressante e o proposto mistério se torna uma muleta para um clímax que não empolga.
Arrigo Barnabé faz um personagem estereotipado, mas com esquisitices particulares. Dentro de todo o espectro industrial que está inserido em “Passagem Secreta” as reverências ao universo norte-americano das ficções científicas acaba fragilizando o caráter da obra, que passa a transar com toda e qualquer frente de representação da ficção como essa proposta formulaica, dos parque de diversão aos “populares da escola”. Cinema de gênero não precisa entrar em comunhão com os idealismos da terra do capital, não há necessidade para tal. Porém, grande parte das obras brasileiras não conseguem desvencilhar a imagem dessas propostas do que o imperialismo já implementou. Quando não sugam da estética, o fazem na narrativa, seja copiando ou trabalhando a moral norte-americana na cinematografia nacional.
O perigo dessa relação, está justamente nessa manutenção promovida pela burguesia nacional em seus modos de produção, é uma espécie de serviço terceirizado que se presta à burguesia internacional. Ajudando na manutenção dessa fórmula, lucrando em território nacional e gerando mais fomento para as representações futuras dos países capitalistas desenvolvidos. Nosso capitalismo não é apenas dependente, é subserviente. E isso deve ser trabalho em meio à crítica nacional, pois uma grande quantidade de filmes quando decidem debruçar-se no gênero cinematográfico, reconhece apenas os padrões industriais, que nada nos representam. Se ao menos a assimilação fosse uma verve mais recorrente, o barato seria outro.
Mas “Passagem Secreta” quer apenas o entretenimento e as cifras de quebra. Não se projeta para um pensamento da toxicidade de determinadas posturas, caminha em linha reta ao abraço do capital. O negócio é tão disfuncional, que até a fotografia do Carlos Ebert fica no automático. A montagem tenta achar o próprio foco da narrativa. A direção tenta estetizar tudo que pode, enquadrar como dizem os mandamentos. É um projeto dogmático que segue à risca uma receita de bolo que entrou em decadência há mais de 10 anos. “Turma da Mônica: Laços” buscou uma base que se distanciava mais do projeto industrial. Está longe de ser uma obra que se opõe ao mesmo, mas creditou a si a reconstrução de um universo que buscasse, ao menos, ter personalidade.
O filme presente na Mostrinha não consegue entreter, segurar a atenção do espectador, projetar uma personalidade que o distingue da maioria dos caça-níqueis corriqueiros. Até dialoga com isso em seus minutos finais, onde abre o quadro para um cenário mais televisivo, colorido, uma espécie de limbo do espaço-tempo com intrigas familiares, mas até chegar ali, o espectador já desistiu de acompanhar as trapalhadas de uma produção que causa mais bocejos que risadas. Cada metro cúbico de “Passagem Secreta” parece respirar suas referências de Hollywood.