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O Mistério do Gato Chinês

KukaiO Mistério do Gato Chinês

Um desenformado ensinamento tantra

Por Fabricio Duque

Festival de Cinema de Toronto 2018

 

O Mistério do Gato Chinês”, que no título original é Kukai (o nome do monge investigador) e na americana é “A lenda do gato demônio”, traz ao público contos interligados da Dinastia da China antiga, modernizados pelos movimentos da câmera e pela poesia visual, na maioria complementada por efeitos especiais do artifício CGI.

Aqui, o tempo narrativo é desenvolvido pela simplicidade da história propriamente dita (que invoca o conceito universal de William Shakespeare) e pelo ambiente de drones-travellings computadorizados que viajam entre tempo, espaço e digressões que explicam os mistérios da trama.

Esta que importa elementos similares do filme “O Tigre e o Dragão” mais sensorial, mais lúdico e mais teatralmente mágico, com “Lanternas Vermelhas”, bem menos sutil, encontrando “Sherlock Homes” bem mais oriental nas descobertas ingênuas e inocentemente tradicionais de lidar com “a verdade que existe na ilusão”.

“O Mistério do Gato Chinês”, de Chen Kaige (de “Adeus, Minha Concubina”), é uma experiência visual para ser assistida no cinema, com suas danças-voos e suas cenas que lembram um espetáculo do Cirque du Soleil. Suas personagens vivenciam uma existência de dogmas, rituais e de preservação da honra. São facilmente manipulados pela incondicionalidade de suas crenças e de suas melancolias resilientes. É a “canção da tristeza eterna”.

“Não é ilusão, é o estado da mente que é verdade e depois não é”, explica a transposição da lógica e do possível, que aqui ganha contornos de liberdade poética-conceitual. Se tentarmos entender com nossa necessidade de definição absoluta, então seremos excluídos do jogo cinematográfico, este muito parecido com as reviravoltas narrativas de “Homem-Aranha: Longe de Casa”. Sim, a premissa é exatamente a mesma.

“O Mistério do Gato Chinês”, baseado no romance Śramaṇa Kūkai, escrito pelo escritor japonês Yoneyama Mineo, conhecido sob o pseudônimo de Baku Yumemakura, é teatro mágico com suas “pétalas rodopiantes”. E durante a Dinastia Tang (fundada pelo oficial Li Yuan, pertencente à dinastia que havia reunificado a China entre 581 e 618, após três séculos de fragmentação), um conto-lenda de amor-abandono-vingança descortina-se em thriller, suspense, possessões de corpos e “visões criadas”, quando “o reavivamento do cadáver só faz os mortos parecerem vivos”.

É também um “ensinamento tantra” de adeptos do misticismo, do esoterismo e da magia ritual da antiga sociedade chinesa. No site redemetamorfose.org, o “O Tantra Original proporciona a “Visão Sistêmica”, que oferece aos praticantes um modelo que permite a interação com outros organismos biológicos e outros sistemas de vida multi-dimensionais. A chave para penetrar na relação com outras formas de vida, biológicas ou não, resume-se a uma descarga neuro-muscular, liberadora de grandes proporções de energia, com a consequente distensão da mente, permitindo a sua expansão. Essa mesma experiência é proporcionada pelo orgasmo convencional, em menores proporções”.

“O Mistério do Gato Chinês” é uma obra híbrida que quer agradar gregos, troianos, cults do cinema de arte e pops do comercial hollywoodiano (como os artifícios da digressão temporal; flashbacks próximos para que o espectador não perca qualquer e mínimo detalhe). É melodrama com tempo oriental;  e é aventura com tempo ocidental, inferindo muito ao longe a animação “Kubo e as Cordas Mágicas” (2016), de Travis Knight. Tudo para buscar a tradução das emoções humanas mais essenciais: a solidão e a devoção do amor platônico e eterno, que cria a ilusão da “suprema felicidade”.

Sim, a “emoção é verdadeira”, mas é técnica demais. É um filme de metáforas personificadas quando a imaginação assalta a realidade. E também palatável, de gosto padronizado, com sorrisos dúbios (apenas insinuados), olhares hesitados entre o ir e o querer, o interpretar e ou seguir o protocolo da ação rápida e imediata da direção.

“O Mistério do Gato Chinês”, que teve uma versão em 1994 na direção de Jun’ya Satô, nos coloca em dois mundos que desejam transpassar a barreira do ser, só que continuam em cima do muro da dúvida. Uma das primeiras perguntas de todo e qualquer filme é se perguntar: qual o propósito?

Qual caminho deve seguir? Não se diz aqui que uma obra precisa ser uma coisa ou outra, pelo contrário. Misturar estilos e gêneros é uma arte para poucos. Neste, o caminho escolhido é o tortuoso, com fragilidades de perceber que não se deve esquecer do fornecimento da liberdade plena do ser o que a própria essência indica ser. Exibido no Festival Internacional de Cinema de Toronto 2018, uma versão com nove minutos a menos.

3 Nota do Crítico 5 1

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