Festival Curta Campos do Jordao

Cosmópolis

O Método Perigoso de Cronenberg

Por Fabricio Duque

Festival de Cannes 2012

Cosmópolis

Quando a exibição, em cabine de imprensa, do novo filme de David Cronenberg, “Cosmopolis” terminou, confesso que não sabia o que tinha assistido, tamanha a complexidade, mas a sensação transmitido na tela era de genialidade cinematográfica. Perguntaram-me se havia gostado do filme, disse que sim, e então se rebateu um “Típico de você”, comentário que entrou por um ouvido e saiu pelo outro, porque sei que não é uma experiência para qualquer um, se analisarmos a filmografia de Cronenberg. Estava ansioso para fazer, a mesma coisa que o cineasta realiza em suas obras: a verborragia “vomitada” de ideias, percepções, observações sobre o comportamental humano e ou das coisas, como o dinheiro, capitalismo, religião, liberação sexual. Neste ponto, é muito parecido com o seu filme anterior “Um Método Perigoso”, que abordava a psicanálise. Já comentei aqui que possuo medo da mente fértil e sádica do cineasta em questão aqui, talvez porque consiga personificar, às vezes, humanizando, quase todas as perversões possíveis. Como exemplo, podemos citar uma cena de “Cosmopolis”, que o protagonista Robert Pattinson (o vampiro Edward de “Crepúsculo”), ainda novo, consulta um médico diariamente, fazendo exames, incluindo o do toque, ouvindo “Sua próstata é assimétrica”. Leia-se, o queridinho dos americanos sendo “dedado” e comportando-se de forma confortável. Isto é Cronenberg, quebrando tabus sociais. O diretor é um visionário, que se utiliza do cinema a fim de expor uma terapia cognitiva. E acima de tudo, ousado, pois se reinventa em cada trabalho, inserindo o novo, construindo um paralelo com a própria trama. A ousadia vem por inúmeros caminhos.

Um deles é acreditar ao escalar um ator Blockbuster como Pattinson, repleto de caras e bocas óbvias e clichês. E consegue, o ator é outro “ator”, contido, entregue, apesar de achar um pouco “Matrix” demais. Outro caminho é a simplificação dos elementos técnicos. Camera estática, poucos cortes, sem complemento musical a maior parte do tempo, tudo com o intuito de indicar que o contexto – o que se diz de maneira extremamente verborrágica – é o que importa, misturando filosofia, sacadas “pop”, política, economia, transversas em uma atmosfera de estranheza e surrealismo, propositalmente perdida. Assim, mostrar um possível presente, encaminhando-se ao futuro, fútil, alienado, o qual não se sabe o que consumir, apenas que se deve consumir. É uma aula sobre o estado financeiro atual. A trama não apresenta explicações, apenas diálogos analíticos sobre os mais diversos assuntos. O protagonista “recebe” uma revelação ao desejo próprio de cortar cabelo. Esta única informação, “que traz doçura à luz”, comporta-se como o fio condutor a toda metáfora que Cronenberg usa quase como uma necropsia, baseando-se no livro homônimo de Don DeLillo.

As críticas atingem “o conhecimento geográfico pelos motoristas de taxis”, o idêntico, a paranoia atual sobre o medo de tudo, “especulações no vácuo”, a limosine por Nova Iorque, “o rato como uma unidade monetária”, enfim são infinitas referencias ao universo social. E há os coadjuvantes. Juliette Binoche é uma delas, e vivencia seu papel de forma espetacular. “A vida é contemporânea demais”, ela diz sobre a idade. “Tempo é mais erótico quando desperdiçado”, complementam-se frases de efeito, que funcionam muito bem na estrutura de “Cosmopolis”. A teoria versa sobre a “destruição forçada”, destruindo o passado e renovando o futuro. “A nova droga é o novo. Faz a dor sumir. São crianças”, diz-se. Há o rapper, entendido pela história do elevador; o confeiteiro, que usa do próprio material de trabalho para se vingar; e tantos outros. Usa-se a transgressão da igualdade. Modificar simetrias. Busca-se a salvação, completar o vazio, dentro de submundos mentais deturpados e confusos. “Estou tendo um ataque de pânico coreano”, diz-se sobre reprimir a si mesmo. E como não poderia deixar, até o cineasta coloca no roteiro a brincadeira com a realidade do ator. “Você está morto há cem anos”, finaliza-se. Concluindo, um filme denso, tenso, informativo demais, que percorre por um caminho, em que o que mais importa é o que se diz e não a explicação simétrica de nada a coisa nenhuma. Fantástico por ser difícil. Incrível por não ser palatável. Imperdível por respeitar a inteligência do espectador. Vale à pena assistir!

4 Nota do Crítico 5 1

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