Aumenta Que é Rock’n’Roll
Limites da programação
Por Vitor Velloso
Procurando emular um espírito disruptivo, contra-sistema e juvenil, “Aumenta Que é Rock’n’Roll”, dirigido por Tomás Portella (“Operações Especiais”, 2015, “Isolados“, 2014), é um filme que está mais direcionado à trabalhar as sensações de um contexto e de uma certa nostalgia oitentista que contar a história da rádio “Maldita”. De alguma forma, os primeiros minutos do longa criam um contraponto para as emoções projetadas, com uma fotografia cinzenta, uma estrutura genérica de apresentação e os dispositivos de interrupção de euforia jovem por um sistema burocrático escolar.
Essa construção existe para expor uma outra face possível para o desenvolvimento do filme, a rádio em si, mas não como oposição na forma, e sim como funcionamento, interação e dinâmica de espaço. A razão disso é particularmente clara, a direção compreende uma série de fórmulas e propostas programáticas para estruturar sua narrativa, com agentes facilitadores que são inseridos a cada cena. De alguma forma, isso cria um dinamismo no projeto, que não precisa criar longos preâmbulos de explicação histórica para chegar a algum acontecimento particular da “maldita”, por outro lado, demonstra uma lógica engessada de avanço dramático. Se essa sensação de acaso, coincidências e tempos perfeitos que acontecem o tempo inteiro em “Aumenta Que é Rock’n Roll” permite ao espectador ignorar os verdadeiros processos que ali estão ocorrendo, também imprime um sentimento de desarticulação da narrativa. Isso porque esse espírito quase desleixado e despojado que a obra assume, possui um limite quando a progressão dos acontecimentos passa por três eixos recorrentes: o absurdo das resoluções, o romance artificial e a necessidade de seguir um programa.
Nesse primeiro tópico, a nostalgia oitentista consegue dar conta do amargor provocado pelos dispositivos facilitadores, criando um certo enfrentamento com a lógica dos acontecimentos. No segundo, reside alguns dos maiores problemas do filme, o romance entre Luiz (Johnny Massaro) e Alice (Marina Provenzzano) que desde os primeiros minutos é forçado ao espectador em situações descontextualizadas, sendo constantemente artificial e funcionando como uma questão quase paralela à narrativa, ou como viradas para o desenvolvimento do personagem Luiz. O terceiro tópico, é uma exposição sintomática de um produto que se entende na necessidade de tornar-se acessível pelos caminhos do reconhecimento fácil, isto é, ser o mais instantâneo possível, quase que seguindo o protocolo do que um filme “legal” e popular deve ser. Nesse mesmo caminho, as referências procuram dimensionar para o público o que estava acontecendo na rádio “Maldita” e qual sua verdadeira importância para o contexto histórico, especialmente entre os jovens, mas “Aumenta Que é Rock’n Roll” não consegue fugir de uma estrutura à la “CBGB” (2013) e funciona como uma grande exposição contextual, sem desenvolvimento histórico, nem mesmo no objeto que se refere, a cultura e seus impactos em uma determinada faixa etária da sociedade.
Assim, o roteiro entende que para tentar alocar o espectador em algum tipo de situação real, para além do aporte referencial e nostálgico, precisa inserir um elemento dramático de peso e um elemento histórico que atravessa os acontecimentos. Evitando contar o que acontece no filme (ainda que tenha acontecido de fato), há um personagem que morre durante o desenvolvimento da narrativa, mas sem o menor impacto para o espectador, pois o personagem era de uma unidimensionalidade extraordinária, utilizado frequentemente como trampolim para complexificar escolhas e atitudes de Luiz. E no atravessamento histórico, que é a censura, o debate é apresentado de forma tão superficial e breve que funciona como um pequeno obstáculo a ser superado, sem nenhuma sensação de gravidade, pois não há construção narrativa e histórica para tal.
Por fim, “Aumenta Que é Rock’n Roll” pode ser divertido em determinadas cenas e conta com uma performance esforçada de Massaro e Provenzzano, mas parece forçar um deslocamento social e político de um contexto histórico/cultural que era fruto dessa tensão. Por essa razão, o filme é uma homenagem sem rosto, pois sabe qual seu objeto, procura expor o mesmo, ainda que não saiba de onde ele saiu e quais as circunstâncias que nos levaram a ele. Sem dúvida é uma obra carismática, porém funciona mais pelos elementos que louva que por suas próprias pernas.