Tudo Sobre a Mostra de Cinema de Tiradentes 2024
Abrindo o calendário audiovisual brasileiro do ano, o festival mineiro começa hoje até dia 27 de janeiro, com homenagens ao cineasta André Novais Oliveira e à atriz Bárbara Colen, ambos nascidos em Minas Gerais
Por Vitor Velloso (baseado no release oficial)
A Mostra de Tiradentes chega a sua 27a edição, com uma programação de 145 filmes, debates, homenagens e uma discussão temática que promove uma discussão acerca do cinema brasileiro contemporâneo. O festival mineiro, que abre oficialmente o calendário audiovisual brasileiro, acontece de hoje, 19, até 27 de janeiro. Mas nossa cobertura começará apenas no dia 22 de Janeiro, quando começa realmente a Mostra Aurora. Esta dinâmica já é tradicional (mas nós nunca entendemos, ainda que a ideia do festival seja fomentar a cobertura local) na Mostra de Tiradentes, visto que o convite (logística oferecida pela Universo Produção) dos jornalistas e críticos não contempla os primeiros dias, não sendo possível cobrir a cerimônia de abertura e as homenagens. Enfim! Contudo, nossa cobertura será diária (que por sinal já começou – confira as críticas de muitos filmes selecionados), com publicação das análises dos filmes da Mostra Aurora e Olhos Livres, até o final do festival. Os diretores da Universo Produção e Coordenadores da Mostra de Cinema de Tiradentes, Raquel Hallak e Quintino Vargas Neto, apresentam a edição de 2024.
“Olhando desde o início e, em 2024, comemorando 27 anos de existência, podemos afirmar que a Mostra de Cinema de Tiradentes tornou-se um espaço rico e generoso de exibição, formação, apreensão e discussão do cinema brasileiro. Um trabalho coletivo, participativo, democrático, que sempre esteve à frente de seu tempo, atento às mudanças do audiovisual, seja do ponto de vista tecnológico, seja pelo ponto de vista de quem pensa, vê e faz cinema. Um ambiente de encontros, de gestação de parcerias profissionais, de inovação e tendências, de interação crítica no cinema do país. A Mostra Tiradentes tem se caracterizado também pelo ecletismo, não apenas porque investe no cinema de maneira ampla, mas também por ser uma janela aberta, sem rótulos, sem receios de apresentar a produção brasileira como resposta ao país. Exibe filmes que rompem com as velhas e clássicas estruturas de fazer cinema, filmes que ousam em suas linguagens e estéticas, em seus processos de criação, filmes que atravessam e fazem conexões com as outras artes, filmes de realizadores inventivos que apresentam novas maneiras de lidar com suas obras. O cinema jovem e o experiente conjugam o mesmo espaço de exibição e de fala na Mostra Tiradentes, que tem como uma de suas principais características a capacidade, ano a ano, de lançar um olhar diferente sobre o cinema brasileiro e, consequentemente, sobre o Brasil. Apresenta um novo cinema, com propostas diferentes, com independência de linguagem, um desafio a ser elaborado, que expressa algo, não apenas um produto para o mercado, e ainda revela novos profissionais – à frente e atrás das câmaras – recriando e imaginando, a partir da estética cinematográfica, nosso país.”
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Como foi dito, a Mostra de Cinema de Tiradentes comemora em 2024, de forma ininterrupta, 27 anos. Um casamento cinéfilo de união entre público e audiovisual, que agora comemora Bodas de Crisoprásio, um cristal raro que estimula a criatividade, “solidificado pelas tempestades, resistente aos desertos”. Sim, não há melhor simbolismo para traduzir o que vem por aí no festival mineiro, que enfoca na temática “As Formas do Tempo”; que reafirma seu papel de ser plataforma de lançamento do cinema brasileiro contemporâneo; que apresenta ao público a diversidade da produção brasileira, com novas representatividades, com novas abordagens, personagens, estéticas, com as permanências e mudanças e com as recepções críticas desse fazer cinematográfico, além promover intensas atividades de formação, como debates, encontros e diálogos audiovisuais, rodas de conversa, oficinas, laboratórios, lançamento de livros, performances, exposições, atrações artísticas.
A coordenação da curadoria do evento é assinada pelo crítico Francis Vogner dos Reis, que divide a seleção de longas com Juliano Gomes e Tatiana Carvalho Costa. A seleção de curtas ficou a cargo de Camila Vieira, Lorenna Rocha, Leonardo Amaral, Mariana Queen Nwabasili e Pedro Guimarães e assistência de curadoria de Rubens Anzolin. Os filmes estão distribuídos nas seguintes Mostras: Homenagem, Aurora, Olhos Livres, Autorias, Invenção, Deslumbramento, Olhares, Clássicos de Tiradentes, Foco, Panorama, Foco Minas, Praça, Formação, Jovem, Valores, Regional e Mostrinha. Para ampliar a experiência, vários dos filmes contarão com debates nos Encontros com os Filmes, tendo a presença de diretores, equipes de produção e críticos convidados.
Em 2024, o evento celebra as trajetórias do cineasta mineiro André Novais Oliveira e da atriz Bárbara Colen. Suas trajetórias se cruzam em diversos momentos e, vindos de uma mesma geração mineira, são também considerados figuras-chave do momento especial que vive a produção no estado, artistas de reconhecimento e projeção internacional. Eles recebem o Troféu Barroco da 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes, numa homenagem que é também estendida ao cinema mineiro.
Durante quatro dias presenciais, de 20 a 23 de janeiro, mais de 50 atores de diversos segmentos do audiovisual brasileiro que atuam em cinco grupos de trabalho – os GTs do Fórum de Tiradentes, coordenados por: GT Formação (Alessandra Meleiro), GT Produção (Cíntia Bittar), GT Distribuição (Lia Bahia), GT Exibição/Difusão (Pedro Butcher) e GT Preservação (José Quental) – estarão reunidos em Tiradentes para debater e apresentar um panorama atual e formar um conjunto de recomendações que possam sinalizar positivamente para as diretrizes e perspectivas do setor num entendimento sistêmico da cadeia produtiva do audiovisual para a construção de balizadores para a formulação de políticas públicas. Este será outra perda para o Vertentes do Cinema.
Extensão fundamental da programação de filmes na Mostra Tiradentes, o debate representa um dos eixos principais da programação e reúne profissionais nacionais e internacionais no centro das discussões das edições anuais do Seminário do Cinema Brasileiro, dos diálogos audiovisuais, rodas de conversa, para refletirem o momento atual do cinema e contribuírem com olhares variados à temática proposta e aos filmes apresentados a cada edição. Numa iniciativa pioneira no circuito de festivais, promove, desde a 9ª edição do evento (2006), a série de encontros com pensadores-teóricos-críticos que são convidados para, junto com o diretor, apresentarem ao público o melhor pensamento crítico da obra assistida. A 27ª edição da Mostra reúne 160 profissionais no centro de 54 debates, encontro com os filmes e rodas de conversa.
A ABERTURA (que perderemos)
A performance audiovisual que abre a Mostra, concebida por Chico de Paula e Raquel Hallak, dirigida por Chico de Paula e com a participação especial de Augusto Rennó (guitarrista), Fê Linz (DJ), João Viana (multi-instrumentista), Laís Lacôrte (atriz, cantora e compositora), Lira Ribas (atriz), Marcus Vianna (compositor e multi-instrumentista), Robert Frank (multi-artista) e VJ 1mpar (artista audiovisual). “A escolha desses artistas foi fundamental para que chegássemos a uma proposta conceitual de abordagem que se materializasse nas diversas performances e num conceito coletivo para a abertura”, conta o diretor Chico de Paula. “O que está sendo criado é lindo, único e expande o discurso da Mostra também pela estética das interpretações. Conceitualmente, criamos cenas e ações que trazem diversidade e valorizam o cotidiano”.
O efeito buscado pela performance desse ano, segundo Chico, é trazer fluidez e espiritualidade aos momentos artísticos, criando uma costura que se apoie na força do coloquial, em sintonia com o trabalho da dupla homenageada, ao mesmo tempo em que se conecta a um contexto mundial. “Assim podemos falar do momento em que vivemos, das alterações climáticas violentas, do nosso descaso com o mundo que habitamos. É um ciclo que se inicia com muita necessidade de cura para que possamos nos entender”.
Em seguida à performance audiovisual, serão exibidos dois filmes de abertura, com primeira exibição mundial na Mostra: o média “Quando Aqui”, de André Novais Oliveira, feito especialmente para a abertura da Mostra, e “Roubar um Plano”, também de André, em parceria com o cineasta paulista Lincoln Péricles, finalizado a tempo para esta estreia.
FÓRUM DE TIRADENTES (que também perderemos)
No sábado, dia 20, o Fórum de Tiradentes – Encontros pelo Audiovisual Brasileiro abre sua segunda edição consolidando-se como um espaço de discussão para reflexão, cooperação e apoio na reconstrução das políticas culturais. Margareth Menezes, ministra da Cultura, confirmou presença na abertura do Fórum para um balanço do último ano e falar sobre os planos de 2024 sob o viés do governo federal. A mesa inaugural, às 12h, no Cine-Teatro, tem a participação da ministra, do Procurador Geral do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior junto a outras autoridades da área cultural confirmadas: Fabrício Noronha, secretário de Estado de Cultura do Espírito Santo e presidente do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura; Eliane Parreiras, secretária municipal de Cultura de Belo Horizonte e presidente do Fórum Nacional de Secretários e Gestores de Cultura das Capitais e Municípios Associados; Joelma Gonzaga, secretária Nacional do Audiovisual | Ministério da Cultura; e Pablo Soares Pires, assessor do Audiovisual da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais.
MOSTRA AURORA
É a 27ª edição da Mostra de Tiradentes e a 17ª edição com a mostra Aurora, que começou na 10ª edição de Tiradentes, em 2008. Muita coisa aconteceu daquele momento para cá. Novos diretores e novas diretoras surgiram, vimos um aumento do número de mulheres na direção; realizadores negros, negras, indígenas e LGBTQIAPN+ emergiram com força; cineastas vindos das periferias e territórios distantes das capitais sudestinas também ajudaram a compor um novo mapa do cinema brasileiro; no campo das ideias, as novas epistemologias não brancas e não ocidentais realizaram intervenções que geraram mudanças substanciais nas ideias e nos agentes do campo audiovisual, novas universidades e cursos audiovisuais se consolidaram, a política de cotas nas universidades e a reserva de vagas nas políticas públicas de cultura (em especial no audiovisual) também deram, às grandes maiorias minorizadas, acesso ao processo social, à universidade e às ferramentas de produção cultural, ainda que os enfrentamentos econômico-políticos necessários contra os oligopólios de mídia e a hegemonia do mercado estrangeiro não tenham sido efetivados. A curadoria nas artes e no cinema também ascendeu como uma plataforma política de intervenção no circuito da circulação de ideias, filmes e pessoas. Tudo isso reconfigurou profundamente o campo audiovisual. Passamos por um golpe, por tentativas de demolições institucionais, por destruição de políticas públicas, por genocídios, pela vulgarização absoluta do debate político, pelo negacionismo científico. Um aceleracionismo do “fim do mundo” que queria fazer terra arrasada para começar do zero.
Os filmes deste ano da Mostra Aurora trazem consigo as marcas desse mundo fraturado. Como nas edições anteriores, não há homogeneidade nas formas dos filmes, nos seus assuntos e nos seus estilos. Cada um propõe gestos distintos, herda e retrabalha ao seu modo traços de diferentes tradições do cinema, sedimenta a influência de outras artes, metaboliza no seu corpo estético elementos da vida e do mundo. Ou seja: a busca poética de cada um diz respeito ao seu tempo histórico, seu lugar, seu elã experimental que transfigura um sentimento de mundo.
OS FILMES
EROS. Direção de Rachel Daisy Ellis. PE, 108 min.
Sinopse: O filme EROS acessa a intimidade vivenciada na maior instituição de sexo do Brasil: o motel. Pessoas frequentadoras foram convidadas a se filmar durante uma noite e compartilhar os seus vídeos para fazer parte de um filme..
Eu também não gozei. Direção de Ana Carolina Marinho. SP, 93 min.
Sinopse: Letícia descobre que está grávida, mas não sabe quem é o pai. São quatro possibilidades. Apesar de insegura e com medo, ela entra em contato com todos os possíveis pais. Cada um reage à sua maneira, mas todos alegam que o filho não pode ser deles porque eles não gozaram. Mas ela também não. A gravidez solitária provoca uma reviravolta. Quando a criança nasce, sua inquietação ganha forma: ela vai em busca de descobrir quem é o pai de seu filho.
Lista de desejos para Superagüi. Direção de Pedro Giongo. PR, 72 min.
Sinopse: Em uma mítica ilha no litoral Sul do Brasil, um pescador de 70 anos que ainda não conseguiu se aposentar. Martelo é um homem farol, aponta sua luz para Superagüi e ilumina os desejos terrenos de seus moradores que dizem muito sobre o momento atual: melhorar as condições de trabalho, conseguir aposentar com dignidade, retornar a vida da ilha como era antigamente. Não sabemos o que está por trás da ordem que opera o movimento do mar, mas sabemos que ali vive uma alma que deve ser respeitada.
Maçãs no Escuro. Direção de Tiago A. Neves. SP, 108 min.
Sinopse: Um mergulho na vida do dramaturgo Edson Aquino, cuja trajetória é registrada por uma equipe de documentaristas estrangeiros. Enquanto comemora seus 35 anos de carreira perante as câmeras, sua aparente fachada de sucesso é abalada, fazendo-o questionar sobre a ilusão da fama e colocando em xeque sua busca pela autenticidade.
Not Dead. Direção de Isaac Donato. BA, 71 min.
Sinopse: Na terra da axé music, punks velhos resistem e vivem com autonomia. Acessibilidade em Libras, AD e LSE disponíveis na área da Mostra Tiradentes no APP Mobi LOAD. Para mais informações, consulte o item Acessibilidade nesse site.
O Tubérculo. Direção de Lucas Camargo de Barros e Nicolas Thomé Zetune. SP, 70 min.
Sinopse: G. é um ator de 38 anos e sua avó morreu com sintomas que a impediam de dormir. Ele deixa Lisboa e retorna à sua pequena cidade natal no Brasil onde é assombrado por uma herança maldita e seu primeiro amor proibido, W.
Sofia Foi. Direção de Pedro Geraldo. SP, 67 min.
Sinopse: Sofia se encontra em um momento de vulnerabilidade após ter que deixar o apartamento onde estava hospedada. Entre a vida acadêmica e a necessidade de apoio, a jovem decide se esquivar das obrigações universitárias para trabalhar como tatuadora no campus. A noite cai e ela permanece à deriva, sozinha, entre os espaços da Universidade de São Paulo.
MOSTRA OLHOS LIVRES
Nenhuma fórmula para a visão contemporânea de mundo: ver com olhos livres
A núcleo da Mostra Olhos Livres, através dos anos, emana de um modo de amor ao cinema que se expressa por uma mistura de amplitude e imprevisibilidade. Um cinema vasto em formas de ser e ao mesmo tempo sempre diferente do que se espera dele. Quando escolhemos o nome do mítico blog do grande cineasta, crítico e programador Carlos Reichenbach, optamos por uma forma ética mais do que uma linhagem específica do cinema brasileiro? E que forma seria essa? A forma, seguindo a linha de Reichenbach, brota da frase de Oswald de Andrade: “Nenhuma fórmula para a contemporânea expressão do mundo. Ver com olhos livres”. O que podemos entender dessa formulação como bússola ética, portanto: os padrões que se impõem em cada época, as modas, os tiques, tudo o que se solidifica ou estabiliza como modo precisa estar em contato com forças de contraponto. Quando se percebe uma suspeita de dogmatismo, de uma sensação de nitidez da “forma certa a fazer”, é preciso pular para outras embarcações.
OS FILMES
A Câmara. Direção de Cristiane Bernardes e Tiago de Aragão. DF, 89 min.
Sinopse: Das entranhas do parlamento brasileiro, acompanhamos deputadas fazendo política. Temas como direitos reprodutivos, educação, estado laico, racismo e polarização política vem à tona, enquanto acompanhamos essas mulheres de perto em seus embates e performances políticas.
Aquele que Viu o Abismo. Direção de Gregorio Gananian e Negro Leo. SP, 70 min.
Sinopse: Do outro lado do enorme pavilhão, que serve de abrigo temporário à pantagruélica massa de recém chegados de toda escassez da civilização ingênua, X observa o recrutamento da Prolife.
Foram os Sussurros que Me Mataram. Direção de Arthur Tuoto. PR, 75 min.
Sinopse: Ingrid Savoy, uma celebridade prestes a entrar em um reality show, passa seus dias confinada em um quarto de hotel. Entre visões premonitórias, um ataque de paparazzi e atentados anarquistas que rebentam pela cidade, a artista vive a constante iminência de um escândalo.Através de um fluxo de pensamentos em que os personagens misturam reflexões próprias com citações aleatórias, o filme explora um estado de alienação e loucura que é alimentado por uma máquina midiática.
Seu Cavalcanti. Direção de Leonardo Lacca. PE, 78 min.
Sinopse: Seu Cavalcanti tem 90 e tantos anos e uma saúde de ferro. Depois de sofrer uma grande contrariedade, acompanhamos suas aventuras em busca de reconquistar sua independência e seu prestígio.
SOAP. Direção de Tamar Guimarães. SP, 110 min.
Sinopse: SOAP é um filme em episódios que apresenta um grupo de esquerdistas fictícios e idealistas que querem unir forças para enfrentar um sistema populista em seu próprio jogo, e gira em torno da criação de uma telenovela que pudesse se infiltrar e influenciar a extrema direita no Brasil.
Terror Mandelão. Direção de Felipe Larozza e GG Albuquerque. SP, 75 min.
Sinopse: Terror Mandelão aborda o som, a tecnologia e o mercado de trabalho dos bailes funk das quebradas de São Paulo. O filme acompanha a caminhada do DJ K, um dos principais DJs do Baile do Helipa, a maior favela da cidade, e seu amigo MC Zero K, que emplacou o seu primeiro hit da vida após dez anos insistindo na carreira. Combinando narrativas de documentário, elementos ficcionais e experimentação visual, o longa mostra os altos e baixos enfrentados pelos jovens na luta para viver da sua música.
MOSTRA AUTORIAS
UM CAMINHO DO MEIO
Idealizada na última década do evento, a Mostra Autorias dedicou-se a emprestar o olhar a filmes cujo traço estético e poético dos diretores e diretoras era demasiadamente marcado. De modo geral, o conjunto de obras selecionadas nesse certame valorizava as operações mecânicas que circunscreviam assinaturas singulares no campo do cinema brasileiro. Não se tratava de uma lógica necessariamente qualitativa – ser melhor ou pior – mas sobretudo de valorizar longas e médias-metragens cujo corpo era, por essência, distinto da grande maioria. Esse guarda-chuva ia desde a presença de veteranos da produção brasileira, como Julio Bressane, Walter Lima Jr. e Ruy Guerra, até nomes recentes que despontaram no cenário na última década, como Clarissa Campolina.
Agora, em 2024, a Mostra Autorias continua perseguindo assinaturas estéticas ímpares, mas em novo desenho e configuração. Aquilo que antes era uma manifestação de expressões “fora de competição” se tornará uma competição especial, a ser exibida no primeiro final de semana da Mostra de Tiradentes. Por sua vez, seu recorte aposta em realizadores com trajetórias marcantes na última década, cujos primeiros trabalhos, em alguns casos, tiveram força e expressão em edições anteriores de Tiradentes. É um gesto de olhar para filmes e assinaturas que são ainda frescas e arejadas, que necessitam ser vistas e reconhecidas, mas que também já encontraram caminhos e possibilidades de exibição diante de suas (nem tão) breves trajetórias. É menos uma espécie de “meio do caminho” desses cineastas e muito mais um “caminho do meio” para filmografias vivas e pulsantes, em plena transformação.
OS FILMES
Estranho Caminho. Direção de Guto Parente. CE, 83 min.
Sinopse: Um jovem cineasta que visita sua cidade natal é surpreendido pelo rápido avanço da pandemia e precisa encontrar seu pai, com quem não fala há mais de dez anos. Depois do primeiro encontro, coisas estranhas começam a acontecer.
O Diabo na Rua no Meio do Redemoinho. RJ, 130 min.
Sinopse: Riobaldo, faz um relato de fatos diversos e aparentemente desconexos entre si, que versam sobre suas inquietações sobre a vida: as questões éticas, o bem e o mal, deus e o diabo e etc. Baseado na obra Grande Sertao:Veredas
Tudo que Você Podia Ser. Direção de Ricardo Alves Jr. MG, 83 min.
Sinopse: É o último dia de Aisha em Belo Horizonte. Acompanhamos a despedida na companhia de suas melhores amigas: Bramma, Igui e Will. Por meio do cotidiano e dos encontros entre as personagens, o filme tece um retrato afetuoso sobre a família que se escolhe constituir através do valor da amizade.
YVY PYTE – Coração da Terra. Direção de Alberto Alvares e José Cury. MG, 110 min.
Sinopse: Em “Yvy Pyte”, Alberto Alvares e José Cury traçam um percurso cinematográfico entre terras Guarani, desfazendo fronteiras físicas e simbólicas. O filme, entrelaçando sonhos, cantos e caminhos, revela a busca coletiva pelo tekoha, desafiando as imposições coloniais e revelando a ligação profunda entre espiritualidade, terra e liberdade. Palavras, cânticos e imagens aéreas costuram uma narrativa poética que desdobra a resistência Guarani e recria um mapa contracolonial.
MOSTRA PRAÇA
Nos últimos anos, online em tempos pandêmicos ou presencialmente, quando nos foi possível, a Praça se firmou como lugar de resistência e cumplicidade para quem seguia acreditando na vida e nos encontros possíveis do(s) cinema(s) com seu público. Sem se afastar da possibilidade de comunhão popular que sempre marcou esse espaço em Tiradentes, a seleção desta 27ª Mostra aponta caminhos condizentes com os novos ares da cultura brasileira que, tanto nas políticas públicas quanto nas discussões dentro e fora das redes, tenta acolher as múltiplas modulações de um país plural. A energia desses encontros segue alimentada pelas exibições ao ar livre, acompanhadas das sempre estimulantes conversas sobre os filmes.
OS FILMES
A Festa de Léo. Direção de Luciana Bezerra e Gustavo Melo. RJ, 85 min.
Sinopse: Na Favela do Vidigal, Rita prepara uma festa para Léo, seu filho, que fará doze anos. No dia da comemoração, descobre que Dudu, pai do menino, roubou o dinheiro da festa e tem dívidas na comunidade que podem lhe custar a vida. Rita precisa arrumar o dinheiro para salvar Dudu e realizar o sonho de comemorar o aniversário do filho.
As Primeiras. Direção de Adriana Yañez. SP, 78 min.
Sinopse: O documentário retrata a vida de um grupo de mulheres que vivem nos subúrbios do Rio de Janeiro, estão perto dos 60 anos e guardam um passado comum: são a base da primeira seleção feminina de futebol do Brasil. Quando elas começaram a jogar, o esporte era proibido para mulheres.
Mais um dia, Zona Norte. Direção de Allan Ribeiro. RJ.
Sinopse: Em suas rotinas, trabalhadores da periferia do Rio de Janeiro tem momentos de transformação. Um instante de sonho, fantasia e fuga da realidade em contraponto a mesmice do dia-a-dia.
Mussum, o filmis. Direção de Sílvio Guindane. RJ, 123 min.
Sinopse: MUSSUM, O FILMIS narra a trajetória de vida de Antônio Carlos Bernardes Gomes, indo muito além do Mussum que o grande público conhece: a infância pobre, a carreira militar, a relação com a Mangueira, o sucesso com os Originais do Samba, além de bastidores d’Os Trapalhões.
Saideira. Direção de júlio Taubkin e Pedro Arantes. SP, 112 min.
Sinopse: As irmãs Penélope e Jô se reencontram depois de 10 anos e partem em uma jornada pelo interior de Minas em busca da herança de seu avô: a mítica cachaça Saideira.
LIVRO DA ABRACCINE “CINEMA FANTÁSTICO BRASILEIRO: 100 FILMES ESSENCIAIS” SERÁ LANÇADO NA MOSTRA DE CINEMA DE TIRADENTES 2024
o livro “Cinema fantástico brasileiro: 100 filmes essenciais” será lançado pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) em parceria com o Grupo Editorial Letramento no dia 21 de janeiro, a partir das 11h30, no Centro Cultural Yves Alves, na 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes, na cidade histórica mineira. “Cinema fantástico brasileiro: 100 filmes essenciais” nasce de um desejo de ampliar os estudos acerca desse gênero narrativo, com um recorte abrangente e introdutório, artigos de cunho histórico e abordagens críticas sobre esse universo. No livro, são apresentados cem filmes que questionam e expandem o limite do que se entende por realidade.
Por muito tempo se questionou se haveria um cinema fantástico no Brasil para além do mítico personagem Zé do Caixão, criação de José Mojica Marins. Um olhar atento, no entanto, revela uma filmografia extensa – e cada vez mais numerosa – e de qualidade que brinca com as possibilidades do estranho e do maravilhoso. Filmes de horror, fantasia ou ficção científica foram realizados na Vera Cruz, no Cinema Marginal, na Boca do Lixo e na Retomada; balizaram chanchadas, obras experimentais, infanto-juvenis e animações.
Para Gabriel Carneiro, que organizou o livro ao lado de Paulo Henrique Silva, “Cinema fantástico brasileiro: 100 filmes essenciais é um marco na relação da crítica de cinema, especialmente a brasileira, com o cinema fantástico. O livro estabelece um diálogo com esse gênero tão popular, mas que historicamente foi – e ainda é – tão menosprezado e diminuído frente a outras formas de representação. Injustamente, vale dizer. Hoje já se vê, com menos preconceitos, o valor e a grandeza de muitas obras filiadas ao horror, à fantasia e à ficção científica. O que é um ganho substancial”.
“O livro nos permite acessar, de forma mais nítida e coesa, a construção de uma linguagem própria dentro de um gênero até então muito atrelado ao cinema norte-americano, além de lançar luz sobre obras subestimadas como as produções eróticas e dos Trapalhões, que não só marcaram uma época como também dizem muito sobre a maneira de ver um país. A fantasia, a ficção científica e o horror tornam possível tratar de questões urgentes e delicadas com uma abordagem criativa, que pode ser divertida ou amedrontadora e, ao mesmo tempo, bastante crítica e reflexiva”, observa Paulo Henrique Silva.
Produção que inaugurou o gênero de horror no Brasil e trouxe ao mundo o personagem Zé do Caixão, À Meia Noite Levarei sua Alma (1964) foi escolhido como o melhor filme do cinema fantástico brasileiro, de acordo com levantamento inédito feito pela Abraccine e que serviu de baliza para o livro em questão.
SERVIÇO
27a MOSTRA DE CINEMA DE TIRADENTES | 19 a 27 de janeiro de 2024 | PROGRAMAÇÃO GRATUITA
LEI FEDERAL DE INCENTIVO À CULTURA
LEI ESTADUAL DE INCENTIVO À CULTURA
Patrocínio: CBMM, AYMORÉ, ITAÚ, CIMENTO NACIONAL, CSN, ANCINE, CEMIG, COPASA/GOVERNO DE MINAS GERAIS
Parceria Cultural e Educacional: SP CINE, SENAC E SESC EM MINAS, INSTITUTO UNIVERSO CULTURAL, CASA DA MOSTRA
Apoio: PREFEITURA DE TIRADENTES, TECNOGERA, CONECTA, CAFÉ 3 CORAÇÕES, EMBAIXADA DA FRANÇA NO BRASIL, INSTITUTO GOETHE, CTAV, CANAL BRASIL, CANAL LIKE, MISTIKA, FESTIVAL DE MÁLAGA, O2 PLAY, NAYMOVIE, DOT, THE END.
Idealização e realização: UNIVERSO PRODUÇÃO
SECRETARIA DE ESTADO DE CULTURA E TURISMO | GOVERNO DE MINAS GERAIS
MINISTÉRIO DA CULTURA – GOVERNO FEDERAL| UNIÃO E RECONSTRUÇÃO
Lançamento e sessão de autógrafos de Cinema fantástico brasileiro: 100 filmes essenciais
21 de janeiro, domingo, às 11h30
Centro Cultural Yves Alves (Rua Direita, 68, Tiradentes/MG)
27ª Mostra de Cinema Tiradentes
O livro também pode ser adquirido no site da editora (www.editoraletramento.com.br).
Organização: Gabriel Carneiro e Paulo Henrique Silva
Grupo Editorial Letramento
Coleção Lumiére
376 páginas, 14×21
Preço de capa: R$ 90,00