Tudo o que aconteceu no Festival de Vassouras 2023
O Cinema no Vale do Café apresentou sua 2ª edição com uma programação cinematográfica intensa no interior fluminense
Por Clarissa Kuschnir
Como é bom ver novos festivais de cinema nascendo, no interior sudestino. Apesar de estarmos longe de alcançar tantas mostras e festivais como no interior nordestino, é bom poder sair dos grandes eventos do eixo Rio-São Paulo e sentir o quanto os interiores estão cada vez mais engajados em fazer cinema. Sem contar a importância desses eventos na formação de público para o cinema brasileiro, já que temos um circuito de salas tão restrito no país e mais ainda, nas pequenas cidades. E assim, o Festival de Cinema de Vassouras, que chegou em sua segunda edição, apresentou uma programação extensa de nove dias de muitas projeções, encontros, podcasts, talks shows, tapete vermelho e até mesmo uma calçada da fama, além de importantes nomes do nosso cinema, mostrando, para o público tanto de externo quanto local, o quanto é possível movimentar o mercado, fora das grandes capitais. Idealizado pelos irmãos Bruno Saglia e Jane Saglia, o Festival de Cinema de Vassouras ocorreu entre os dias 16 e 24 de junho, na cidade de Vassouras (que faz parte do circuito do café, no Estado do Rio de Janeiro) e contou com uma estrutura de grades festivais, especialmente por uma equipe muito acolhedora como, na maioria das vezes, acontecem nos festivais do interior.
E se nos últimos anos tem se falado tanto de economia criativa, o Festival de Cinema de Vassouras soube trabalhar bem essa parte nessa segunda edição, que contou com a parceria da Cidade movimentando os restaurantes, hotéis, turismo e comércio, inclusive levando para dentro do espaço do evento pequenos comerciantes locais, para que pudessem expor e comercializar seus produtos. E muitos produtos, com o selo do festival estampado. Sem contar os espaços de encontros de empresas ligadas ao mercado audiovisual com importantes trocas, entre os profissionais da área.
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E o festival abriu esse ano, homenageando Antônio Pitanga, um dos ícones da nossa cinematografia que recebeu das mãos da colega e também veterana atriz Nívea Maria, o Troféu Paulo José.
“Que alegria Nívea, receber o troféu Paulo José, meu amigo de tantos trabalhos. Eu conheci a Nívea bem menininha na TV Excelsior em 1967. Já era essa Nívea de grande talento e grande atriz. Eu só tenho que agradecer a Vassouras. Essa cidade é uma referência histórica não só do Rio de Janeiro, mas do Brasil. Eu acho que nada mais que perfeito, calçando como uma luva, acontecer o segundo festival aqui. Daqui a alguns anos essa cidade vai ficar pequena e vai ser invadida pelo Brasil, para ver o cinema brasileiro. E eu tenho a honra o prazer e a alegria de estar sendo um dos percursores e um dos primeiros a estar aqui. Eu só tenho a agradecer duplamente de receber esse troféu Paulo José e ao povo de Vassouras me recebendo e me homenageando, nesses meus quase 66 anos de profissão, com mais de 80 filmes, mais TV e teatro. E ainda vivo e de pé, fazendo trabalho e uma das coisas eu mais gosto”, explanou o ator que ainda complementou que todas as vezes que recebe uma homenagem do cinema brasileiro, ele está incorporando não só o Pitanga, mas um quilombo de ideias, de pessoas e de talentos de jovens, loucos para abraçarem o cinema.
E nada mais justo para complementar as homenagens, as primeiras sessões do festival contaram com dois filmes com Antônio Pitanga, que foram: “Pitanga“ (2016), dirigido por Beto Brant e pela filha do ator Camila Pitanga, e “Casa das Antiguidades“ (2020), de João Paulo Miranda Maria. Ambos os longas, fora das mostras competitivas.
No encerramento, mais homenagens. A primeira para Rosa Maria Murtinho, outro ícone da TV, teatro e cinema. Aos 87 anos, a atriz subiu ao palco muito emocionada, recendo seu Troféu Paulo José, das mãos de seu filho João Paulo Mendonça. “Olha a homenagem para o Paulo José. Foi meu irmão Carlos Murtinho que em Porto Alegre lançou o Paulo José, na primeira vez que ele fez Teatro. Estou muito emocionada, obrigada”, falou em poucas e rápidas palavras, sobre essa homenagem.
Outra segunda homenageada da noite de premiação foi para a falecida atriz Lílian Lemmertz. Ao subir ao palco, sua filha Júlia Lemmertz, leu um texto emocionante, de uma carta escrita por Caio Fernando de Abreu, na época da morte de sua mãe. Lílian se estivesse viva faria 85 anos. A atriz que faleceu tão precocemente há 37 anos, deixou um legado imortal, para a dramaturgia brasileira.
Da seleção de filmes que fizeram parte das mostras competitivas 36 foram de curtas-metragens e 15 longas. Com uma programação de filmes que começavam logo às 9 da manhã na matinê (com sessões lotadas de crianças de diversas escolas públicas da região) e seguiam o dia inteiro. O local onde ocorreu o evento (no centro de convenções de Vassouras, que inclusive faz parte da Universidade local de mesmo nome) respirava cinema, já que entre os intervalos de filmes haviam diversos podcasts, talks shows, rodas de conversa e coletivas de imprensa com realizadores de filmes e demais profissionais da área, do mercado audiovisual.
E entre os destaques desses talks shows foi o da presença do diretor Wagner de Assis que participou da conversa ao lado do ator Renato Prieto, intérprete de André Luiz, no longa-metragem “Nosso Lar“. Assis, que alguns anos soma sucessos nos cinemas, com seus filmes de temática espírita, entre outros, “A Menina Índigo” e o mais recente “Kardec: a História Por trás do Nome“, e, que está prestes a lançar “Nosso Lar 2: Os Mensageiros”, deixou claro que não faz filmes apenas para o público espírita, mas para aqueles que se interessam por boas histórias, muitas vezes adaptadas desses livros espiritas, transformando as em uma ficção bem contada.
Sobre os Vencedores da segunda edição do Festival de Cinema de Vassouras, o longa-metragem de ficção “Horizonte”, primeiro trabalho do ator e diretor Rafael Calomeni, foi um dos destaques e unânime em agradar tanto o público, quanto a crítica e júri, levando quatro Troféus Grão de Ouro (Melhor filme, Melhor diretor, Melhor atriz e Melhor atriz coadjuvante). Filmado em Aparecida de Goiânia, no Estado de Goiás, o filme fala sobre o personagem Rui (Raymundo de Souza) que, ao longo dos seus 72 anos sente um peso existencial, porque vive com sua família que o despreza. Um dia, Rui decide partir e viver sozinho, em um condomínio recém-construído, para idosos de baixa renda. É aí que sua vida recomeça e, sem imaginar, acaba inclusive, se apaixonando pela vizinha da frente, a mal-humorada e misteriosa Jandira (interpretada por Ana Rosa). Ou seja, o recado que o diretor deixa é que nunca é tarde para recomeçar e se apaixonar, independente da idade. “Horizonte” é um filme universal, que fala com todos os públicos.
“Juntamos um elenco muito poderoso e que se dedicou e o melhor é que que fizemos questão que esse grande elenco chegasse tranquilo no set, para que pudessem trabalhar da melhor maneira possível. Então paramos as filmagens pouquíssimas vezes, por causas dos atores. A maioria das vezes era por causa de problemas técnicos no set. Os atores estavam entregues. Então a minha concepção para Horizonte é que tínhamos um elenco poderoso, um roteiro forte e um grupo disposto a trabalhar”, enfatizou o diretor em entrevista após a premiação, sobre o elenco composto por Raymundo Souza, Suely Franco, Ana Rosa, Alexandra Richter, Pérola Faria, Ronan Horta, Arthur de Farah e Paulo Vespúcio.
Outro longa de ficção que também saiu com quatro troféus, mais nas categorias técnicas (Melhor som, Melhor fotografia, Melhor direção de arte e Melhor figurino), foi “Vermelho Monet”, do diretor cearense Halder Gomes. Conhecido por dirigir comédias populares regionais como “Cine Holliúdy” e “Shaolin do Sertão”, o diretor resolveu se aventurar a dirigir um drama, que gira em torno do universo das artes. O filme além da produção do Brasil conta com coprodução portuguesa e francesa e tem no elenco Chico Diaz, Maria Fernanda Cândido e Samanta Muller.
Já o divertido “Capitão Astúcia“, de Filipe Gontijo foi o vencedor nas categorias de Melhor ator para o veterano ator paraibano Fernando Teixeira, além de edição e roteiro, para Gontijo.
Na categoria de Melhor ator coadjuvante o prêmio foi para o ator mirim Rafael Pereira de “O Armário Mágico”. O longa, dirigido por Eliton Oliveira e, rodado inteiramente em Maringá, é uma fábula da época da Segunda Guerra, em que uma família judia é obrigada a fugir e esconder seu filho de um grupo de soldados nazistas no Brasil. Já “Chefe Jack – o Cozinheiro Aventureiro” (que já foi lançado nos cinemas) de Guilherme Fiuza Zenha, foi escolhido como o Melhor longa de animação.
O prêmio de Melhor Documentário foi para “Rosa – A Narradora de outros Brasis”. Dirigido pelo jornalista Valmir Moratelli em parceria com Libário Nogueira, o longa é uma homenagem a uma das maiores carnavalescas do Carnaval do Rio de Janeiro, Rosa Magalhães.
Dos longas para os curtas-metragens, os destaques e vencedores foram: “Teatro de Máscaras”, de Eduardo Ades, com Vera Holtz. O curta, que levou o prêmio de Melhor ficção nacional, retrata uma mulher com uma doença incurável à beira da morte. O Melhor roteiro foi para “O Último Domingo”, de Renan Brandão. Com uma belíssima fotografia, o curta é baseado, na passagem do “Evangelho Segundo Jesus Cristo”, de José Saramago. Já na categoria de Melhor Direção, o ator Sérgio Malheiros foi o escolhido pelo júri pelo filme “Única Saída”. Na categoria Mostra Rio, o vencedor do Troféu Grão de Ouro foi para o lindo e sensível “A Menina e o Mar”, de Gabriel Mellim. E o Nordeste foi premiado com dois curtas. O pernambucano “Cabocolino”, de João Marcelo escolhido como o Melhor Documentário e o paraibano “Era Uma Noite de São João” de Bruna Velden, como Melhor Animação.
E como em todos os festivais do interior, uma das categorias mais assistidas é a Regional. O curta vencedor dessa segunda edição, que teve 6 filmes concorrentes foi “Os Esquecidos”, do cineasta Rodrigo de Souza e do historiador Antônio Carlos Silva. O curta fala sobre os escravizados, que trabalharam na região do café.
E ainda na noite de premiação, os idealizadores do festival Bruno e Jane Saglia agradeceram a todos os presentes e aos parceiros, e, compartilharam, uma outra novidade. Além do Festival de Vassouras, a dupla anunciou a realização do Festival Internacional de Cinema em Paraty, litoral do Rio de Janeiro, que acontecerá de 12 a 20 de abril, de 2024. E isso sim é uma ótima notícia, para os festivais fora dos grandes centros!
CONFIRA A LISTA COMPLETA DOS VENCEDORES DO FESTIVAL DE CINEMA DE VASSOURAS 2023
TROFÉU GRÃO DE OURO
Melhor longa-metragem: “Horizonte”
Melhor direção em longa-metragem: Rafael Calomeni, por “Horizonte”
Melhor atriz em longa-metragem: Ana Rosa, por “Horizonte”
Melhor ator em longa-metragem: Fernando Teixeira, por “Capitão Astúcia”
Melhor atriz coadjuvante em longa-metragem brasileiro: Alexandra Richter, por “Horizonte”
Melhor ator coadjuvante em longa-metragem brasileiro: Rafael Pereira, por “O Armário Mágico”
Melhor filme longa-metragem (Documentário): “Rosa – A Narradora de Outros Brasis”
Melhor filme longa-metragem (Animação): “Chef Jack – O Cozinheiro Aventureiro”, de Guilherme Fiúza Zenha
Melhor roteiro em longa-metragem brasileiro: Filipe Gontijo, por “Capitão Astúcia”
Melhor som em longa-metragem de ficção: “Vermelho Monet”, de Halder Gomes
Melhor fotografia em longa-metragem: “Vermelho Monet”
Melhor direção de arte em longa-metragem de ficção: “Vermelho Monet”
Melhor figurino em longa-metragem de ficção: “Vermelho Monet”
Melhor direção em longa-metragem de ficção: “Capitão Astúcia”
Melhor curta-metragem brasileiro (Ficção): “Teatro de Máscaras”, Eduardo Ades
Melhor curta-metragem brasileiro (Documentário): “Cabocolino”, de João Marcelo
Melhor curta-metragem de ficção (Mostra Rio): “A Menina e o Mar”, Gabriel Mellin
Melhor curta-metragem Regional: “Os Esquecidos”, de Rodrigo de Souza e Antônio Carlos Silva
Melhor curta-metragem de Animação: “Era Uma Noite de São João”, de Bruna Velden
Troféu Acessibilidade (curtas inclusivos): “Kikazaru”, de Matheus Cabral
Melhor roteiro em curta-metragem brasileiro: Renan Brandão, por “O Último Domingo”
Melhor direção em curta-metragem brasileiro: Sérgio Malheiros, por “Única Saída”
Menção honrosa dada pelo júri: “O Quarto de André”, de Tiago Barba
Prêmios Especiais
Troféu Paulo José: Rosamaria Murtinho e Antônio Pitanga (entregue na Noite de Abertura e encerramento)
Homemangem – Grão de Ouro: Mariá Velesquez, Gerente de Filmes da Paramount Pictures Brasil e Consultora do Selo Elas.
Melhor Vitrine Temática: 1°) Baronesa, 2°) Estação Presente e 3°) Botões da Vovô
Troféu Severino Sombra: Gustavo Tutuca, Secretário Estadual de Turismo do Rio de Janeiro
Troféu Marco Capute: Projeto PESER (Prefeitura de Vassouras)