Ponyo [Uma amizade que veio do mar]

Ficha Técnica

Direção: Hayao Miyazaki
Roteiro:Hayao Miyazaki
Elenco: Yuria Nara, Noah Lindsey Cyrus, Hiroki Doi, Frankie Jonas, Jôji Tokoro
Fotografia: Atsushi Okui
Música: Joe Hisaishi
Direção de arte: Noboru Yoshida
Edição: Takeshi Seyama e Hayao Miyazaki
Produção:Toshio Suzuki (versão original), Steve Alpert e Kathleen Kennedy (versão em inglês)
Estúdio:Studio Ghibli / Nippon Television Network Corporation / DENTSU Music and Entertainment / Hakuhodo DY Mdia Partners / The Walt Disney Company / Mitsubishi / Toho Company / Asahi Soft Drinks Company / Lawson / The Yomiuri Shimbun
Distribuidora:Walt Disney Studios Motion Pictures
Duração: 101 minutos
País: Japão
Ano: 2008
COTAÇÃO: ENTRE O BOM E O MUITO BOM

A opinião

A animação do diretor Hayao Miyazaki, o mesmo de “A Viagem de Chihiro”, aclamado pelos lugares que passou, busca a fantasia surreal. Diferencia-se de um desenho tradicional por escolher a estrutura de Anime, técnica japonesa de desenhos animados.Ponyo é uma peixinha dourada que conhece o garoto Sosuke. Ele a leva para sua casa e decide cuidar dela. O amor, e a amizade também, entre os dois, é tão grande, que Ponyo resolve se tornar humana só para ficar mais tempo ao lado de seu amigo.

A Viagem de Ponyo expressa a metáfora da vida moderna. É um road movie existencial na descoberta de ser o que é ou como mudar para que possa ser aceita normalmente. As características natas, inerentes na personalidade de um indivíduo, são questionadas pelo próprio ser, que confuso com a vida, deseja atenção egocêntrica dos demais. A infância é humanizada, não omitindo a sua crueldade de um amadurecimento com a rapidez, para que a trama individual caiba na duração deste filme.

As expressões facias da peixinha, quando emerge, protegida em águas vivas, retratadas como amigas e cúmplices, denotam quereres aventureiros. Buscar-se o novo, galgar novos caminhos do conhecimento. Logo no início, percebemos um ser adicionando pingos mágicos no oceano, para que com isso possa limpá-lo e salvá-lo das impurezas da superfície. “Que sujeira! Intolerável”, diz-se sobre a poluição marinha. É uma crítica ao lixo despejado por humanos ao mar. A não preocupação com o ambiente. A metáfora da proteção. A forma que o “pai” encontra de proteger os seus “filhos”, os colocando em uma bolha livre de sujeiras, e com cuidados radicais e extremados.

Uma ópera conduz a abertura, como quadros japoneses pintados em movimentos. O objetivo é transpassar uma ficção realista em forma de desenho, porque se substituirmos os personagens animados por atores, o resultado seria quase o mesmo, em relação aos diálogos e ações apresentadas. O aprofundamento dos que participam da história segue a pureza da transformação infantil em visionar a fase adulta. O que acontece não parece encenação. Elementos cotidianos são os responsáveis pela conservação da realidade.

Esse “pai”, o dono do fundo do mar, perde uma de suas “crias”, e vê na amizade de Ponyo e um humano como uma captura. O roteiro mostra a história e aos poucos age humanizando o que cada um é. “Quero um presunto!”, diz-se sobre o querer do novo experimentado. Há a facilidade de se acostumar. Altamente adaptável.E principalmente, defendendo e explicando o porquê de cada um agir assim. Não há julgamentos. “Ela é especial, é mágica.”, diz-se. “Ponyo quer ser humana”, complementa-se.

O peixe no balde. O cuidado. O carinho diferenciado cria sentimentos humanos em um ser marinho. A imaginação não cria limites, dependendo da quantidade de “ser criança” há em cada um. Aqui, peixes podem falar, são mágicos, podem curar feridas. É um filme sobre passageiros, viajantes, solitários, velhos e aqueles com carência exacerbada. Há conversas distantes pelos sinais de luz de uma casa farol, que fornece direção aos perdidos.

A explicação respalda-se na ciência. O sangue humano altera o DNA, fazendo que os seres marinhos possam metamorfosear entre o real e o imaginário. “Deveria ser pura e inocente para sempre”, o suposto “bruxo”, o “pai” do oceano diz. Mas Ponyo precisa viver
sozinha, aventurar-se, enfrentar os perigos por si só. Ela precisa sentir o mundo. Os elementos “cênicos” são exagerados. O vento excessivo, as ondas do mar tão exacerbadas que fazem da própria crença não serem aceitas. Isso demonstra a intensidade da mudança. A transformação em turbilhão, quase um maremoto.

Os personagens são apresentados como tipos. Há idosas de diferentes tipos. Amorosas, razinzas, desconfiadas, ingênuas, carentes, defensivas. O menino, objeto de querer da peixinha, tem a mãe trabalhando em um asilo. Ele vive entre a iminência da perda e da solidão. Os “velhos” esperam. A mãe, nova, é apressada, principalmente em dirigir, não se dando conta do perigo de seus atos. Há também o estado passional. O gostar verdadeiro sem imposições de cortes sociais. Sem mascarar algo por medo de se machucar.

A música acompanha a sutileza apresentada do dia-a-dia. “Nós nascemos da espuma”, diz-se. Há solidariedade em dividir o último elemento. A troca sem interesse. O filme resgata valores perdidos no agora. A simplicidade do agir, se, esperar nada, apenas por que é. “Seu olho está todo molhado”, ela diz sobre não entender o ato de chorar. Infere-se a “Cocoon”, filme sobre idosos que ganham vida, porém em versão japonesa. A força e vitalidade renovam-se quando puro acomete a alma. Há túneis, cavernas e deusas do mar. Há opções, ajudas e percalços no caminho.

O ser não pode deixar de ser quem é para vivenciar uma nova experiência. Essa é a mensagem. “Pode aceitá-la como ela é?”, pergunta-se a principal questão do longa. Mas a animação peca por correr com os elementos. Há falta de concatenação das idéias. Tudo é muito solto. E atrapalha o sentimento do espectador em absorver a fantasia apresentada. Infere-se a “Pequena sereia”, em versão seca, corrida. Atinge-se o que quer, mas há sub-tramas demais. Vale muito a pena ser visto, mesmo com esse deslize. Recomendo.

O Diretor

Hayao Miyazaki, Tóquio, 5 de Janeiro de 1941, é um dos mais famosos e respeitados criadores do cinema da animação japonesa, o anime. Em 1963, depois de três meses de treinamento, Hayao começa a trabalhar na Toei como intervalador, cuja função é animar com as guias enviadas pelos animadores-chefes, ou key animators. Seu primeiro trabalho é no longa-metragem Watchdog Bow Wow. Ao terminar o trabalho no filme, foi animador a participar da série de TV Wolf Boy Ken. Com um salário de 19.500 yen na época (só o aluguel de seu pequeno apartamento no bairro Nerima, em Tóquio, era de 6.000 yen), o artista ainda ajudou a liderar os animadores do estúdio que estavam tendo problemas com o sindicato local.

1964 foi um ano determinante na vida de Miyazaki: além de ter se tornado Secretário-Chefe do sindicato trabalhista da Toei (além de continuar com seu trabalho de animador), ele começou a namorar com a colega de trabalho Akemi Ota, além de sua relação com Isao Takahata, outro colega de trabalho e vice-presidente do sindicato trabalhista, se solidificar ainda mais. Quando a produção do longa animado Prince of the Sun começou, em 1965, Hayao ofereceu voluntariamente seus trabalhos ao diretor, Takahata. Já prevendo que a televisão tomaria conta dos trabalhos da empresa a partir de agora, Miyazaki fez um pacto com Isao e com Yasuo Otsuka (diretor de animação do longa) para terminar a produção do filme juntos, não importando o tempo que levasse. 1965 também marcou o casamento de Hayao com Akemi, que mudaram para Higashi-Murama, em Tóquio.

O primeiro filho do casal nasceu em 1967. Prince of the Sun foi finalmente lançado em 1968. Logo após, Miyazaki e Ota já estavam trabalhando em outra produção, Puss in Boots, onde Hayao já ocupava o cargo de key animator. O ano de 1969 contou com o nascimento do segundo e último filho do casal, além do início dos trabalhos no longa The Flying Ghost Ship, que contou novamente com Miyazaki como key animator.

Em 1996, com o aumento dos investimentos norte-americanos nessa nova onda conhecida como “anime” e “mangá”, a Disney viu como o momento perfeito para aproveitar a qualidade e o sucesso que os filmes de Hayao Miyazaki faziam no oriente para garantir os direitos de distribuição dos filmes do diretor. Com isso, foi fechado entre a Disney e o Estúdio Ghibli o acordo conhecido como Disney-Tokuma que, em resumo, consiste na distribuição mundial (incluindo Japão, mas excluindo a Ásia) em vídeo (DVDs não estão incluídos) de todos os longas animados do Estúdio Ghibli, sem falar na distribuição mundial nos cinemas daquele que lançaria o nome de Hayao Miyazaki ao mundo: Princesa Mononoke (Mononoke-hime, 1997).

A história de Princesa Mononoke mais uma vez mostra a ecologia como plano de fundo para a busca do Príncipe Ashitaka para curar uma maldição que o consome. O filme se tornou a maior bilheteria da história do Japão (faturando o equivalente a US$ 150 milhões), batendo E.T. – O Extraterrestre (e ficou na primeira posição até Titanic estrear em terras nipônicas). O filme levou diversos prêmios no Japão e em outros festivais internacionais. E foi após Mononoke que Hayao Miyazaki anunciou, pela primeira vez, sua aposentadoria. Mas o sucesso o chamou de volta para dirigir A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no kamikakushi, 2001). Agora com um certo nome internacional e com a força da distribuição mundial nas mãos da Disney, o filme faturou mais prêmios internacionais (incluindo o Oscar de melhor longa-metragem animado em 2003) e foi sucesso por onde passou.
Em 2005, chegou aos cinemas O Castelo Animado (Hauru no ugoku shiro, 2004), com mais prêmios (como a indicação ao Oscar de melhor animação) e uma bilheteria de arrasar ao redor do mundo. Mesmo assim, Hayao Miyazaki ainda está longe de ser reconhecido, principalmente no ocidente, como seu colega de profissão Walt Disney. Com diferentes posições ideológicas quanto a seus filmes, o amor incontestável pela arte da animação está claro em seus filmes, e é apenas questão de tempo para que Miyazaki consiga alcançar a popularidade da qual já desfruta em seu país natal.

Filmografia

1984 – Nausicaä of the Valley of Wind
1986 – The Castle in the Sky
1988 – Meu Vizinho Totoro ou Meu amigo Totoro
1989 – Serviço de entregas da Kiki
1992 – Porco Rosso
1997 – Princesa Mononoke
2001 – A Viagem de Chihiro
2004 – O Castelo animado ou O Castelo Andante
2009 – Ponyo – Uma amizade que veio do mar

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