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O Braço Direito

Um dia de cão

Por Laisa Lima

O Braço Direito

Quando jovens resolvem fazer cinema, geralmente originam-se obras de categoria peculiar. Tendo o movimento da Nouvelle Vague como modelo, o olhar juvenil de Truffaut (Os Incompreendidos, 1959) e Godard (Acossado, 1960), por exemplo, encaminharam às telas filmes reflexivos e socialmente relevantes, considerando o ímpeto característico de uma fase da vida na qual o intuito é transformar tudo e todos. No brasileiro “O Braço Direito” (2020) dirigido por Rodrigo Reinhardt e feito em sua maioria por jovens recém graduados ou ainda graduandos, esse traço da juventude é concebido na forma em que um assunto pouco discutido, se converte em obra cinematográfica.

Em “O Braço Direto”, não houve qualquer apoio de produtora ou investimento externo, e a quantia aplicada no filme foi de 250 mil reais. Levando isso em conta, a história de Anselmo (Denis Derkian) foi contada com uma feitura consideravelmente bem trabalhada em relação à estética para uma obra de tão baixo orçamento, o que é notável a partir da evolução dos acontecimentos na trama, que possui uma proposta ousada por si só. Anselmo trabalha para Laerte, um rico investidor da Bovespa, e juntamente com seus subordinados, desempenha a função clandestina de mandante no grupo de extermínio ligado ao tráfico de informações. Então, apesar de instalada a trama desde o instante em que começa uma contagem na tela, nem tudo é claro para ser encaixado nela de primeira.

Com o uso da falta de linearidade, o longa-metragem se divide – pelo menos em boa parte – entre os ocorridos no presente, no qual há uma exposição na tela de datas e horas sem aparente explicação, e entre a alternância com as lembranças de Anselmo, por vezes observadas em preto e branco, dando clareza ao propósito de tais quadros. Nos momentos iniciais do filme, é dado mais atenção às reações do personagem perante as recordações que aparentam portar uma carga de amargura incutida no homem. Os planos desconexos ligam-se por uma montagem pouco regular que transita entre o real e o figurado, como no aparecimento de pilares construídos para uma ponte (já destruída) que inicialmente parecem apenas mais uma imagem. A imagem, aliás, preza pelos primeiríssimos planos nos atores – utilizados durante toda a obra –, pelo desfoque em situações que necessitam da sensação de não compreensão e pelo desbravamento de São Paulo, com os ambientes locais sendo os artifícios mais trabalhados por meio do plano aberto.

Em razão destes elementos, a obra que estreia Reinhardt no cinema possui uma aparência estilizada e até original, não caindo no habitual e investindo em distintas maneiras de se utilizar a edição como detentor do ritmo cronológico de seu filme, apostando no cultivo da necessidade de formular no espectador um sentimento de incógnita. Entretanto, ao transpor o limite de execução do suspense no público por conta da excessiva lentidão na lacuna entre o esperado e a finalização dos eventos, o recurso pode ser tido como um exagero graças a aplicação de questionamentos que permanecem sem resposta durante um longo tempo, e alguns até o término de “O Braço Direito”. Essa mesma vagarosidade traz às perguntas impostas pela trama, uma possível reação de impaciência no espectador pela demora em suas resoluções e no fechamento das brechas deixadas pelas poucas satisfações a respeito das esferas surgidas no decorrer da película, que não fornece esclarecimento nem sobre fatos essenciais, como o estado físico de Anselmo e seu verdadeiro ofício.

Outro espaço causado por “O Braço Direito” se dá por conta da personalidade dos personagens, em especial o interpretado por Derkian. À primeira vista, Anselmo é visto como um indivíduo em busca de sua redenção, mas após o espectador ter um conhecimento mais a fundo de quem o homem é e o que ele pratica, a comoção atingida por seu falso arrependimento se esvai. Contudo, a pouca eloquência de Derkian ressaltada pelo texto engessado, é notória na medida em que uma única camada é manifestada com mais evidência, deixando a ambiguidade em seu caráter, um pouco de lado. Como Anselmo, os outros componentes do filme, tal quais Charles Paraventi e Genézio de Barros, capangas do protagonista, não demonstram um arco complexo, já que suas inserções na obra não precisavam conter grandes variedades de pontos de vista, os tornando apenas funcionais. O objeto do desejo de reparação do protagonista, a jovem Luara, também não é aproveitada de forma a dar uma identidade à responsável por tal feito.

O Braço Direito” possui um traço inovador se for focada a sua ideia central, corajosa o suficiente para desviar um pouco a atenção do restante do filme. Apesar de um visual tão elaborado quanto uma obra confeccionada por uma produtora, salientar a pretensão de se organizar um argumento contra algo imponente no Brasil, a cruel máfia por trás de um poderoso (podendo fazer referência a qualquer tipo de poder), é uma audácia que precisa de um empreendimento não financeiro, mas de uma extrema preocupação com todos os mecanismos manuseados para a não contestação dos fatos. Aqui, a confusão de conceitos juntamente com a dificuldade de os emitir, mantendo o tom de indagações contínuas e exposições vagas, faz com que a mensagem do longa-metragem seja transmitida pela metade. Por isso, tudo leva a crer que o submundo dos corrompidos esteja tão batido, que não há nada novo a se passar.

3 Nota do Crítico 5 1

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