Curta Paranagua 2024

Maligno

O mestre dos dólares

Por Vitor Velloso

Maligno

Apesar de James Wan ter transado com alguns arrasa quarteirões do alto escalão de Hollywood, em “Velozes e Furiosos 7” e “Aquaman”, sua influência no terror é absoluta e quase hegemônica. Como produtor, esteve envolvido na grande maioria das franquias de sucesso dos últimos anos: “Jogos Mortais”, “Sobrenatural”, “Quando as Luzes Se Apagam”, “A Freira”, “Invocação do Mal” e “Annabelle”, por exemplo. O curioso é que boa parte dessas franquias surgiram de sua direção e depois passaram por sua produção, ou seja, o homem é um grande “marqueteiro” de sua geração. E por mais que sua verve publicitária seja evidente, é impossível não ressaltar que normalmente que enquanto diretor, fez os melhores filmes das respectivas franquias que segue produzindo. Porém, “Maligno”, seu novo projeto, é um retorno direto às paixões mais primárias do cineasta.

Poucas coisas devem excitar mais James Wan que mortes brutais, universos coincidindo, realidades atravessadas e demônios pirotécnicos. Aliás, suas construções são parte dessa ideologia do entretenimento direto, com a assimilação imediata na imagem, sem nenhum tipo de particularidade, apenas a exposição em si. O curioso é perceber que dois diretores contemporâneos trabalham em direções distintas da indústria, Mike Flanagan e Wan parecem dividir os raios de alcance entre a televisão e o cinema, respectivamente. O primeiro trabalhando os traumas a partir de um ponto psicológico e material de maneira dialética, o segundo abrindo à dólares as tendências do terror contemporâneo para onde as cifras falam mais alto. É claro que a segunda categorização surge com uma certa ironia, pois Wan possui um método particular de trabalhar o sobrenatural e a violência também de maneira dialética, porém, em uma dinâmica completamente distinta. Se Flanagan utiliza o rigor de seus enquadramentos para dar vida aos fantasmas de cada espaço, James Wan joga com a liberdade da objetiva a fim de passear pelos medos dos personagens.

Fazer uma certa analogia aqui, ainda que de maneira sucinta, não é um absurdo, afinal o roteiro de “Maligno” poderia facilmente cair na mão de Flanagan, sem grandes complicações. Porém, a assinatura aqui é muito clara.

James Wan vai do céu ao inferno em poucos segundos, é realmente impressionante. A padronização criada por ele para dinamizar diálogos expositivos que explicam detalhadamente cada pormenor da história, é absolutamente tediosa. Minutos depois estamos assistindo à protagonista correr pela casa em uma azimutal que segue a “planta” da casa, ou seja, não há interferência direta do telhado e tudo se assemelha a um jogo de videogame. Em momentos posteriores, uma anamórfica há muito saturada pelo diretor explora um carro que chega em casa, ou mesmo um “ângulo holândes” pouco criativo. Esses contrastes absurdos criados pelo cineasta, faz com que o filme funcione em um imenso pêndulo, às vezes divertido, outros simplesmente mais do mesmo, quase amador. Para os estruturalistas e pós (inserir aqui qualquer “ismo”), será um dos maiores projetos do ano, está claro, é tudo que parte do mercado estava aguardando, para outros, será um dos piores filmes da cinematografia de Wan. Independente dos extremos, “Maligno” funciona em momentos específicos como uma experiência tão oscilante, que é difícil se manter indiferente à ele durante a projeção.

As pataquadas da narrativa sempre encontram uma saída mirabolante. São resoluções tão grandiloquentes com furos de roteiro tão assombrosos, que a única saída é a abstração, seguida da imersão total no fluxo de dualidades duvidosas, onde o diretor sempre chama atenção de seus dispositivos.

Porém, não se pode ignorar a expertise de James Wan diante de um mercado tão programático, pois o cineasta reforça a porta giratória do mercado, criando a demanda com seus próprios clichês e fórmulas, reproduzindo conscientemente um padrão absoluto, para em seguida, atuar como produtor lucrando em torno de enlatados que vão estampar seu nome para figurar em todas as mídias. Sua sagacidade é tanta, que a ideologia que se cristalizou diante de um setor da crítica é que seu brilhantismo surge de uma exposição direta do horror, quando na verdade, é a reprodução de sua forma que foi sendo disseminada pelas demais produções e retroalimenta uma tendência que ele criou, ele lucra e ele formaliza o consenso dos bocós. Ele fez o menos terrível dos “Velozes e Furiosos”, sustentou a DC com “Aquaman”, encabeça uma quantidade deselegante de franquias e ainda será ovacionado com “Maligno”. O cara é fora de série.

2 Nota do Crítico 5 1

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