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Foram os Sussurros que Me Mataram

É mesmo um milagre?

Por Vitor Velloso

Durante a Mostra de Cinema de Tiradentes 2024

Foram os Sussurros que Me Mataram

A Mostra Olhos Livres é conhecida pela distância que algumas obras possuem entre elas, desde algumas das melhores exibições da Mostra de Cinema de Tiradentes e algumas das mais problemáticas. “Foram os Sussurros que Me Mataram”, de Arthur Tuoto, é uma obra que se enquadra no segundo tipo. Conversar com as pessoas após a exibição do longa esclareceu muito a percepção que o público presente no Cine-Tenda teve da obra. Com um estado de cerco, uma proposta estética que flerta entre o estéril e o expositivo, o novo filme do Tuoto parece procurar um espaço entre o Michael Mann e o Carpenter, mas acerta um descompasso pouco efetivo, onde os diálogos não se conectam, em uma lógica extremamente reativa, mecanicamente engessada e com uma artificialização do dispositivo que realmente compromete a experiência.  

Em algum sentido, existem elementos interessantes em “Foram os Sussurros que Me Mataram”, como essa caracterização da personagem, tão egoica quanto violenta, com algum desprezo pela vida das pessoas ao seu redor, sempre preocupada com a própria carreira. Ou mesmo a questão de uma narrativa de cerco, que vai encerrando o espaço e tensionando mais as “relações”. O problema, é que não existe exatamente uma relação dramática dos personagens, mas sim uma enorme reatividade aos acontecimentos, é como se a própria obra funcionasse em uma lógica de ser reativo e prolixo, se distanciando de qualquer apreciação do que chamamos de “diálogo ”. Cada personagem parece ter uma linha independente para si, que não precisa ter qualquer relação com a fala do outro, porém é proferida nesse tom de resposta, normalmente com a frieza de atuações engessadas. Desta forma, o longa torna-se cada vez mais presunçoso com o passar do tempo, se mantendo em uma nota de repetição constante, com os mesmos ciclos de “problemas” se repetindo, tornando a experiência insustentável. Conforme Tuoto expõe seus dispositivos para contextualizar essa narrativa como uma formalidade artificial, ele revela uma espécie de tipificação particular de um padrão do formato digital. 

Mas tudo isso está a serviço de um projeto que está mais inserido em um contexto de serviço cinefilia programática, quase que como um desvio. É realmente um filme-sintoma, onde poucas coisas são realmente relevantes para o esboço da narrativa, logo, nada é crucial para a construção desses supostos conflitos presentes na obra. Não por acaso, não existe a sensação de uma iminente catástrofe, como é anunciado com frequência ao longo da projeção, é mais um flerte com um fetiche pelo conflito, sem que o público compreenda sua finalidade. Também por essa razão, “Foram os Sussurros que Me Mataram” nunca parece ter um rumo, pois não possui um argumento sólido em torno desse universo particular, pelo contrário, está sempre procurando artifícios expositivos e argumentos genéricos para se justificar. É como se uma sequência só tivesse validade por um impacto relacional entre o fundamento e a finalidade dela, como é o caso da cena dos autógrafos no bluray e na arma. É quase que uma ironia das próprias limitações conceituais, mas que se esconde na base de referenciais. 

Sem funcionar como um dispositivo exposto e tropeçando na lógica de um filme sintomático, afetado por um caráter egocêntrico de artifícios e esquemáticas previsíveis, especialmente na montagem e na fotografia, “Foram os Sussurros que Me Mataram” torna-se um desarranjo formal, questionando tanto suas próprias convicções que perde a base de suas referências, apelando para uma estética de passos lentos e duvidosos. Essas questões comprometem fortemente qualquer tipo de análise das atuações, que se encontram limitadas por um descompasso de sentidos. 

É possível que o filme possa ter assumido algumas de suas características para expor os sintomas particulares dessa “estética de dispositivos”, mas a intencionalidade não sustenta o tom presunçoso que o longa possui e o espectador se sente desconfortável entre personagens que nunca se comunicam. Aliás, essa lógica de estruturas poderosas que circulam o universo social e nunca revela o conflito em si, já reflete muito do que se pode retirar da experiência. Não é um bom início para a Mostra Olhos Livres.

1 Nota do Crítico 5 1

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