Curta Paranagua 2024

Crítica: No Olho do Furacão

ePoPeIa PóS-MoDeRnA

Por Gabriel Silveira


No início havia Twister, compreensivo drama meteorológico de proporções homéricas. Dai o Dia depois amanhã. Como acabamos em Sharknado, caro leitor, realmente não sei. Geostorm então… é. Mas o que importa é que chegamos por fim aqui, no glorioso Olho do Furacão. Cujo a tradução literal do título original (Hurricane Heist/Assalto do Furacão) é de uma didática e evidência na exposição do objeto de estudo que faria Gilberto Freyre corroer de inveja por sua objetividade literária.

Desenhando um escopo superficial, compreende-se que o cinema de mercado/salas de projeção em suas últimas décadas permitiu-se, gradualmente, entrar em um frenesi desvairado de um produtor megalomaníaco que anseia pela superação de si mesmo a cada obra. E esta megalomania vêm comprovar-se como trucagem de um mercado que parece ter entrado num estado de decadência sem fim — como um vaso ruim que não quebra — pelo fim do século XX, por conta de novas tendências midiáticas e a defasagem da potência do espírito cinéfilo sessentista como commodity. A trucagem técnica como isca comercial é oriunda da íntima relação submissa que a indústria audiovisual compartilha com a cadeia de desenvolvimentos técnicos de indústrias(bélica, médica, TI) que investem e viabilizam novas tecnologias quais o mercado audiovisual apropria-se, fazendo de ferramenta de expansão do cânone técnico do medium em si.

Com o enfraquecimento da isca do formato em si(cinemascope, 3D, IMAX) é compreensível que o esfriar das fórmulas dramáticas que harmonizavam com as premissas épicas dos próprios formatos (Ben Hur) ceda lugar à sede insaciável pela maior saturação daquilo que ainda pode ser saturado. Dai o ensejo destas vulgares epopeias que soam como um grito desesperado do sistema de estúdios a procura de consumidores predispostos a matar sua curiosidade mórbida pelo objeto.

No Olho do Furacão parte da premissa de tais epopéias predisposto a saturar não somente a fórmula em si, mas todo o seu intrínseco estético. O filme abre expondo o tom de seu absurdo em seus cinco minutos iniciais. Os irmãos Will(Toby Kebbell) e Breeze(Ryan Kwanten) (interpretados porcamente, neste primeiro momento, por dois atores mirins desprovidos de qualquer química para com cena) encontram-se fugindo de um furacão que devastou sua cidade natal. Will e Breeze procuram abrigo em uma fazenda ao comando de seu pai, enquanto este procura um instrumento pela locação. O furacão acaba alcançando a família, matando o pai e destruindo o alojamento das crianças. Os dois meninos sobrevivem ao ataque natural, mas a execução da cena de tal ataque apresentou, de maneira aguda, o expositivo, desprovido de qualquer pudor, que a obra faria uso pelo resto da projeção. Na decupagem da sequência, o recorrer à utilização de um set trucado para auto-destruição trouxe a mesa uma política de aparências técnicas nostálgica que remete, justamente, a presença dos efeitos técnicos nus de obras como Twister. No entanto, essa política passa a dividir seu espaço, na mesma sequência, com o surgimento de uma grotesca caveira negra metafísica de CGI que vem de visita a Will no momento em que o teto do alojamento é arrancado pelos ventos.

E durante o resto do desenvolvimento da trama — onde Will tornou-se um meteorologista de Washington e Breeze assumiu a oficina de seu pai e os dois acabam envolvendo-se no meio do planejamento de uma equipe de assaltantes que utilizariam da vinda de um furacão ainda mais forte à mesma cidade interiorana como ensejo para o assalto a um complexo do Tesouro Nacional Americano — o projeto acaba concretizando essa mescla do grande set prático/plástico com a força digital bíblica da natureza. Acontece que, infelizmente,todo o decór digital é de uma ficção estética futurista piegas que parece desenhada por uma criança de onze anos de idade tentando sua primeira ficção científica que acaba, por fim, desguando no tom constrangedor dessa desarmonia que aparenta, simplesmente, ser resultado de um fracassado planejamento de uma produção que não foi competente o suficiente no manejamento de seu orçamento.

1 Nota do Crítico 5 1

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