Piada para gringo ver
Por Gabriel Silveira
“Gringo: Vivo ou Morto” (de Nash Edgerton) é um leve filme de comédia/aventura que parece acreditar em sua capacidade de ser uma ousada dark comedy latina, quando na verdade, mais soa como um tiozão norte-americano que se acredita super descolado contando a seus amigos, numa mesa de jantar regada de Budwisers, todas as “loucuras” inacreditáveis, genéricas e entupidas de estereótipos latinos levemente xenófobos que vivenciou naquela noite no México onde tomou uma, duas ou três tequilas além de seu limite e quase acabou sequestrado por uma dupla de capangas do cartel que desistiu da abdução depois de entrarem em contato com o “espírito guerrilheiro” dos devotos do American Dream.
A trama conta a jornada de Harold (David Oyelowo) pelo caos latino. Harold é um imigrante africano que se estabeleceu nos EUA a procura da imensa conquista do American Dream, tomando o senso de ética e moral protestante para si como uma verdadeira bíblia. Harold conquista um cargo de certo prestígio sobre a tutela de Richard (Joel Edgerton), CEO de uma companhia farmacêutica que ansiava pela conquista do posto de primeiro gigante da distribuição em massa de um anestésico a base de cannabis nos EUA. No entanto, perdendo-se no meio das burocracias do Orgão de regulamentação farmacêutico norte-americano, Richard juntou forças com Elaine (Charlize Theron) e deu início a uma rede de tráfico de cannabis ao lado de um cartel mexicano, porque… porque: Hollywood.
Harold que, como o mesmo proclama, sempre se ferra por fazer seu trabalho, passa a ser usado por Richard e Elaine como bode expiatório ao tornar-se encarregado da gerência das relações México-EUA da empresa, e é quando Harold descobre toda esta trama que este entra em um frenesi de revolta e decide que dará a volta por cima simulando um falso sequestro (de si mesmo) no México exigindo cinco milhões de dólares como recompensa. Não sinto que a partir deste ponto seja válido apresentar qualquer outro alicerce estrutural do enredo, porque, o conteúdo seguinte afirma-se como uma bagunça ainda maior que a dos parágrafos acima.
O enredo segue entrelaçando na trama os interesses de um líder de um cartel obcecado por Beatles que executa aqueles que caem em suas mãos a partir da pergunta “Sgt Peppers é o melhor albúm?”, o irmão mercenário de Richard contratado para resgatar Harold, um pequeno contrabandista freelancer e toda a Drug Enforcement Administration (DEA). Se o leitor acabou se perdendo no meio destes poucos pontos de enredo, imagine o espectador que se depara com todos os demais buracos disfarçados de pontos de virada.
No entanto, apesar de todo o desconcerto estrutural, Gringo tem êxito na conquista de um dinamismo cômico que permanece quase que integralmente em voga durante a projeção com o auxílio de um apreço enorme por um formalismo circular eximiamente executado. E é por conta deste dinamismo que o filme nos torna cúmplices ao gozarmos não somente das piadas xenofóbicas oriundas da canastrice esplendorosa da personagem de Theron, mas também, de toda a representação de estereótipos culturais absurdos que parecem servir como embasamento do estabelecimento de um parque de diversões audiovisual para um diretor sair dançando o tango mais barato na cara de uma nação sem qualquer tipo de propósito que não seja o gozo de um gancho cômico. E o pior é que tal gancho é divertidíssimo.
Em Gringo, todo mexicano representado é um oportunista que sucumbe às vontades do cartel, ou, um membro do cartel, ou, um agente duplo do cartel que revela-se herói, já que na verdade era um norte-americano que se passava por mexicano. E, ah! Também há os figurantes mexicanos que dançam e embebedam-se pelas ruas e a fetichização de toda a mitologia criminal mexicana contemporânea iluminada como num Set de um vilão de James Bond que dança ao som de um genérico swing latino, tudo em nome do estabelecimento de um corporativismo que o próprio filme acredita criticar num diálogo onde exalta-se “This is an american product being made in an american company in Mexico, therefore, this is american soil” . O que acho mais curioso nessa história toda é o todo investimento por parte de Theron e Oyelowo, a sul-africana não somente estrelou ao lado do príncipe nigeriano mas como, também, foi uma das principais produtoras do filme. Curioso este desejo de se juntar à mesa de gargalhadas da turma colonizadora.