Fala Comigo
As confissões de um adolescente que não quer mais voltar sozinho
Por Fabricio Duque
Durante o Festival do Rio 2016
Há quem veja semelhança com “Fale com Ela”, de Pedro Almodóvar no filme de estreia “Fala Comigo”, do diretor Felipe Sholl (roteirista de “Além da Estrada” e “Histórias que só existem quando lembradas”). Já nosso site referencia ao universo de Todd Solondz (de “Bem-vindo à casa de bonecas”, “Felicidade”, “Wiener-Dog”), esta por conduzir sua narrativa a existências tímidas de hipocrisias constrangedoras. Com pitadas mais suavizadas e romanceadas (inevitável o espectador não referenciar o filme “Homens, Mulheres e Filhos”, de Jason Reitman, a “Confissões de Adolescente”, de Maria Mariana, e a “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, de Daniel Ribeiro), o roteiro percorre, no limite tênue da espontaneidade e do anti-naturalismo teatralizado (de efeito, mais forçado em suas interpretações) para construir a jornada de amadurecimento e auto-descobrimento do adolescente Diogo (o ator Tom Karabachian, de “Confissões de Adolescente”), normal (como qualquer outro), de dezessete anos, que possui seus fetiches sexuais (“diário de gozadas” e gosta de ligar para as pacientes de sua mãe e se masturbar enquanto as ouve), silêncios, predileções, desejos, sua inocência-pureza (sem “nenhuma experiência de vida”), a primeira vez no sexo (aprende a ter “calma” e a perspicácia defensiva em rebater) e testosterona à flor da pele (fornecendo “homenagens”).
“Fala Comigo” é quase um exercício de núcleos monólogos-instantes intimistas em um divã terapêutico, referência esta devido à profissão de sua mãe (a atriz Denise Fraga, precisa na interpretação, que corrobora a máxima popular “Casa de ferreiro, espeto de pau”, pois dicotomicamente não aplica tais competências psicanalíticas no âmbito pessoal – desencadeando assim uma atmosfera “louca” disfuncional – de indiferença individual – que atinge toda a família – que inclui o marido – o ator Emílio de Melo – que não “aguenta mais silêncio” – e que tenta entender os filhos; a filha hipocondríaca – carente de atenção; o filho que “come no escuro” – buscando a invisibilidade naquele local; e a postura formalmente social-trabalhista com a paciente Ângela – que esconde acontecimentos traumáticos). Tudo se desenvolve por este cenário limitado e “aprisionado” de poderio sem o devido livre-arbítrio (com cartazes na parede dos filmes “Quase Memória”, e o Belair “Copacabana Meu Amor”).
A rotina da escola, o vestibular, a ociosidade do ambiente familiar e a liberdade permitida contraditória levam nosso protagonista a dar asas a seus quereres mais íntimos, e burlando, manipuladamente, pela tangente as causas de suas consequências, dissecando uma verdade incompatível que deveria estar adormecida (e alienada dentro das regras ditadas pela matriarca), como a experiência gay que se comporta mais aceitável que um “namoro” com uma mulher mais velha de quarenta e três anos (“Amor, Estranho Amor”),“instável emocionalmente”, (a atriz Karine Telles, sempre impecável em sua entrega sem vaidades e sem limites de volta).
Diogo aprende a “deixar o mundo lá fora”, “dirigir sem rumo” e a “brincar de casinha”; convive com a agressividade do amigo que o deseja (“Tia, você tem a idade da minha mãe” – “desculpa, é reflexo”); acostuma-se com a estranha normalidade; e lê “O Apanhador no Campo de Centeio”. “Fala Comigo” é um filme de instantes, que se perde ao tentar conectar-equilibrar todos os elementos na narrativa, que soa mais solta, teatralizada e mais encenada. Concluindo, um bom filme sobre a dificuldade em se relacionar com próximos cada vez mais distantes e acessíveis emocionalmente. Tudo que se busca é a fuga pelo carinho, do cuidado, da atenção, para que assim sejam menos invisíveis e mais presentes em suas existências.