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Toy Story 4

Uma aventura ao encontro mais real que existe

Por Fabricio Duque

Toy Story 4

No trailer do novo “Star Wars”, a frase “Ninguém se vai totalmente” pode e deve ser aludida ao quarto e último capítulo da saga de animação “Toy Story“, que revolucionou o gênero por dosar humanizada e naturalizada emoção com aventuras fantasiosas, despertando em todo e qualquer espectador, do pequenino ao “gigante” adulto, um saudosismo perdido de uma inocente pureza. Somos possibilitados retornar a sentimentos esquecidos e a de que a amizade precisa ser preservada a qualquer custo (não deixando “ninguém para trás”). E que unidos chegamos ao “infinito e além”.

Nesse ponto, eu preciso me incluir nestas linhas analíticas, digressionar o passado e contar uma íntima e pessoal memória. Quando eu era criança, eu tinha um brinquedo de pelúcia: Snoopy, do “Charlie Brown”. Para onde eu ia, o Snoopy me acompanhava. Até mesmo escondido na minha mochila para a escola, igualzinho o que a personagem Bonnie quis do filme em questão aqui (por ter “medo”). Mas no meu caso, meus pais permitiram. E foi ali, entre uma vergonha e outra de ser descoberto, que cresci e deixei que levassem minha fantasia. A experiência provavelmente foi traumática. Mas eu não lembrava direito até minha primeira exibição com o primeiro Toy Story. Ali, eu me dei conta que tinha abandonado meu primeiro amigo. E que não teria mais volta. Precisaria lidar com isso e esconder entre defesas adultas para a vida toda. Sim, eu era agora o Andy no estágio temporal da faculdade.

Então, saindo da digressão, que já me estimulou “olhos suados”, adentraremos em “Toy Story 4”, que já se inicia com trilha de aventura, com “operação puxa brinquedo” e com a tradução respeitosa e idiossincrática das características únicas e particulares de cada personagem animado e personificado. Esta pode ser um spin-off, uma derivação com as aventuras-desventuras de “amigo literalmente feito” Garfinho, um “brinquedo” orgânico, construído pela subjetividade, que “não sabe” como ganhou vida. Ele representa a descrença pessimista de ser “lixo” por ter sido “feito do lixo”, mas que se descortina quando é inserida a ideia-filosofia-psicanalítica de que cada ser é o que é apenas pelo livre-arbítrio do ser. Assim, Garfinho pode viver tudo que quiser. E sabendo que a música “Amigo estou aqui” sempre tocará quando precisar de ajuda. “Seu destino não é no lixão, mesmo você ter nascido lá”, ensina a não se sentir um “inútil” e lidar com as possibilidades (há um desenho de um arco-íris em seu “pé”, mais uma representatividade LGBT da Disney). “Ser quem eu sou agora”, ordena.

“Toy Story 4” é orgânico, espirituoso, natural, espontâneo e fofo. Não se encena o ser e sim o é em sua plenitude existencial. Suas personagens são corajosas e fazem de tudo para proteger e salvar os amigos. E ainda que tudo seja difícil e grande, mais uma metáfora da vida para o público, eles conseguem lidar e traçar planos de sobrevivência. São brinquedos em que o único propósito é servir de diversão a crianças em processo de construção de identidade comportamental. Cada um se adequa e modifica suas essências, usando a própria vida para expandir habilidades e conhecimento de mundo. E entender condições e códigos específicos dos adultos: carência, abandono e a necessidade de ser amado todo o tempo, entre veteranos e novatos. Novos e ultrapassados. Esquecidos ou objetos impulsivos de desejo. Anexados. Confiscados. Em espera. Sendo ou não dramáticos. Usando ou não a consciência (“a voz interior”) que diz o que se deve realmente fazer (mas que ninguém escuta).

A narrativa é pautada por acasos, ora desconstruídos, ora facilitadores. De novo, o mesmo processo de nosso caminho vital. No novo “Toy Story” é incluso novos paradigmas sociais, como a autossuficiência feminina, que não precisa servir uma criança para ser feliz e plena. “Aceita a perda”, ela diz, realista e prática. O longa-metragem é sobre solidão latente, sobre ter que “matar um leão por dia” para se safar dos perigos reais e imediatos de um universo selvagem, hostil e incompreendido. É sobre a projeção da projeção. Que se mascara nos quereres condicionados dos outros e que em certo momento, massificado, tornam-se alegoricamente intrínsecos e repetidos. A vida não é um conto de fadas de final feliz para sempre. E sim de milhares de finais felizes no mesmo dia. Porque a existência está em movimento. Em constante processo evolutivo. Como o Unicórnio maldoso com ideias psicopatas.

“Toy Story 4” é muito mais que uma simples aventura. É permitir a desconstrução para se reconectar com o novo. É ver o mundo de verdade, ainda que para a “cabeça de um brinquedo velho” que mantém sua “lealdade”, que se anula por altruísmo e que nunca parou para pensar por conta própria. É a pressão da perfeição. Do não errar nunca. De nunca terminar uma missão incompleta. O despertar não é cômodo. E a separação inevitável. Mas o liberta para ser um caubói moderno à moda dos “Vingadores”. Sim, “camarão que dorme, a onda leva”, diz o coelho marrento (dublado por Antônio Tabet, do “Porta dos Fundos”). Woody “não está mais perdido”. Encontrou a si mesmo e o mundo todo para explorar. Um filme que fecha o ciclo e que gera emoção desmedida. E que conta com cinco cenas pós-créditos. Portanto, fique até o final. Até o final mesmo (há uma grata surpresa na última logo da Pixar).

4 Nota do Crítico 5 1

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