Buscando…
Drama formalista
Por Vitor Velloso
Dirigido por Aneesh Chaganty, “Buscando…” parte de uma simples premissa, como linguagem: usar apenas imagens do FaceTime, Youtube, Tumblr… mídias digitais em geral, incluindo TV, a fim de narrar a história do desaparecimento de Margot (Michelle La), filha de David Kim (John Cho), desta maneira, enclausurando o espectador a uma tela minúscula que mantém a direção em apenas um local, desenvolvendo massivamente a relação do pai e da filha através da ausência da presença conjunta dos dois, não à toa, quando isso ocorre, o peso dramático é intensificado grosseiramente.
A ideia é puramente formal, utilizar esses dispositivos como limitadores da construção dramática, utilizando essa Mimésis mínima como redutor dos conflitos estéticos e pessoais do filme. Mas ele precisava de uma âncora para se apegar nestas relações, um peso que pudesse sustentar o jogo formal, enquanto a trama se desenvolvia, ele encontra este caminho através da morte de Pam (Sara Sohn), esposa do protagonista, vítima do câncer. E este fantasma no passado dos dois, pai e filha, é a conjuntura utilizada para comprimir os personagens a um mesmo lugar, além da óbvia relação paterna. Possivelmente, é um dos motivos que o drama do longa funciona, pois, neste pequeno elemento, ele consegue abrir margem às diferentes maneiras de reagir à qualquer coisa. Justificar o mistério por trás do sumiço de Margot e/ou o comportamento explosivo de David.
O roteiro de “Buscando…” escrito pelo próprio diretor, em parceria com Sev Ohanian, é bem amarrado, mas levemente engessado. Ainda que a progressão narrativa seja satisfatória, sentimos determinadas jogadas formais serem utilizadas como recurso estilístico, o que estende o texto à determinados lugares pouco frutíferos. Porém, sabe utilizar estes tempos, provocando discussões sobre algumas questões de privacidade nos dias atuais, e como os dados são algo extremamente volátil e manipulável na contemporaneidade. E uma dos debates mais recentes dos males deste meio de comunicação é levantado: o que é identidade em um mundo onde nada é real, tudo é interligado, mas nada é concreto, de fato. As máscaras sociais não sumiram com o surgimento das mídias sociais, elas apenas intensificaram e escravizaram as relações humanas à uma máquina.
A ausência da decupagem clássica, à um escalonamento realizado diretamente com a direção de arte, cria uma atmosfera muita crua para tudo aquilo que está acontecendo na tela. O que sem dúvida foi um intenso desafio para o diretor de fotografia, Juan Sebastian Baron, já que independente de qualquer coisa quase sempre há, uma luz diretamente no rosto do personagem de frente, forçando ele a trabalhar o resto do cômodo, a fim de poder gerar algum tipo de construção psicológica. O trabalho conjunto em “Buscando…” deve ter sido algo realmente muito complexo, já que até dirigir os atores foi algo inusitado, pois, não há dramaticidade para além da vida real, não há qualquer esquema poético que justifique uma fisicalidade mais abrangente ou expressões mais agudas, aqui, é tudo cru, tentando transparecer a produção e ser fiel ao que chamamos de “real”. Não necessariamente um niilismo ou um otimismo fruto da narrativa, muito menos um moralismo por parte do diretor, qualquer reação psicológica, deve ser diretamente ligada aos atores, o que transfere o peso da linguagem aos mecanismos que são utilizados como contracampo de atuação.
Diferente de “Amizade Desfeita”, aqui o projeto não se perde num arcabouço de clichês do gênero e fetiches bobos quanto a violência de forma gratuita e desnecessária. Já em “Buscando…” à uma maturidade pungente quanto ao assunto que se está tratando, quanto aos meios de realização do mesmo. E esta harmonia durante o projeto, fica evidente ao público, visto que o tempo parece voar durante a projeção, ainda mais, se houver algum tipo de investimento com os personagens, o que não é uma tarefa difícil já que logo no início há um envolvimento melancólico com a trajetória do pai e da filha.
E no fim, “Buscando…” é um filme com um envolvimento justo e sincero. Formalista da maneira correta, sabendo dosar seu drama com a estrutura que pretende trabalhar, perde a mão em alguns desenvolvimentos destoantes do todo, mas se permite quebrar a mise-en-scène clássica para formalizar um estilo cinematográfico que provavelmente vai se tornar o novo found footage genérico norte americano.