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Brado

Traumas e suas perspectivas

Por Vitor Velloso

Brado

“Brado”, novo filme de Kim Rossi Stuart, recebeu alguns elogios em breves circuitos da crítica cinematográfica e pousa no serviço de streaming, Reserva Imovision (que atualmente está no Reserva Imovision) como uma adição de catálogo interessante para quem procura um drama familiar que envolve traumas do passado, redenções, superação etc. Existem alguns comentários na internet que abriram uma margem de discussão no mínimo chamativa: uma série de comparações com filmes do Clint Eastwood. 

Particularmente, é possível enxergar uma superficialidade comprometedora neste tipo de atitude, pois toma como verdade uma comparação por conta de algumas semelhanças temáticas entre os dois diretores. Na verdade, é pouco honesto com ambas figuras, já que a construção dramática de Kim Rossi Stuart possui uma quantidade de camadas bastante distinta de Clint, em especial no sentido mais amplo que pequenas analogias podem tomar. 

Feita essa breve explanação sobre essa comparação que tem sido feita por algumas pessoas, “Brado” ganha mais, ou perde menos, se essa aproximação se encerrar por aqui. 

Com uma fotografia que realmente chama atenção do espectador, o filme é construído a partir de uma dualidade de dois mundos aparentemente antagônicos, o universo do interior, rodeado de cavalos e belas paisagens, que faz parte do cotidiano de Renato, interpretado por Kim Rossi Stuart e o mundo urbano de Tommaso, interpretado por Saul Nanni. O trabalho de Matteo Cocco na direção de fotografia procura um impacto inicial na formulação dos quadros, que somado à montagem, propõe uma leitura peculiar de funcionamento desses dois espaços, especialmente na forma como Tommaso se relaciona com o meio. Se antes a objetividade de seu trabalho regia seu cotidiano, agora sua relação com o pai passa a moldar parte desse objetivo que parece impossível: domar um cavalo rebelde. Essa relação familiar, tomada de frustrações e mágoas acaba sendo o grande tema central da obra, que passa a se desenvolver como uma grande analogia. 

Um dos problemas de “Brado” é conseguir conciliar seus flashbacks de uma maneira que não soe excessivamente expositiva, ao passo que consiga transmitir para o público de onde vêm determinadas emoções que atravessam os personagens. Esse exercício acaba burocratizando um desenvolvimento que poderia ser mais orgânico, pois revela o dispositivo dramático como algo quase mecânico, mostrar algo do passado e procurar essa interferência no presente. Por mais que seja minimamente efetivo como fim, deixa a desejar nas sutilezas e mantém a relação em uma constância de lacunas. Assim, o desenvolvimento que Kim Rossi Stuart procura trabalhar, abrindo margem no conflito geracional e nas formas tradicionais de uma cultura/relação, acaba fragilizado pelas tentativas de manter o interesse do espectador nesse drama, que sempre ganha novos elementos, mesmo que muitas vezes apresentados de forma fragmentada. 

Por outro lado, é interessante ver como essa obsessão de domar o cavalo consegue desatar certos nós dessa narrativa, pois as cenas iniciais que demonstram a dificuldade no trato com o animal, são arrastadas e pouco interessantes, especialmente porque toda a relação familiar ainda não foi desenvolvida. Esse tempo inicial que leva para construir o conflito entre pai e filho, pode ser determinante para o público se interessar pelo drama, caso o contrário aconteça, a experiência será maçante e pouco proveitosa. 

“Brado” busca fugir de alguns clichês do gênero, mas não consegue se desvencilhar dos mesmos caminhos de desenvolvimento, como de alternar seus declínios para conseguir um efeito prático cada vez maior, e com isso alguma identificação. Ainda assim, consegue explorar bem a relação entre suas paisagens e os locais de seus traumas, permitindo que o espectador se conecte de forma mais fluida com esse espaço que é contaminado por fantasmas do passado. Entre algumas decisões apelativas e algumas performances de coadjuvantes frágeis, o filme se atém tão drasticamente ao eixo pai-filho que suas tentativas de desenvolver as demais relações são praticamente inúteis e apenas reforçam os problemas de ritmo de um longa-metragem que, por vezes, parece tombar nas próprias convicções.  

2 Nota do Crítico 5 1

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