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Boy From Heaven

Do Céu ao Inferno

Por Fabricio Duque

Durante o Festival de Cannes 2022

Boy From Heaven

Por que o simbolismo do céu eterno é um medidor tão importante para o Oriente Médio? Por que a salvação está no altruísmo radical da morte? Por que a felicidade precisa apenas acontecer pós-existência humana? Por que a figura do mártir é a que chega mais próximo do sagrado? Essas perguntas pululam a Humanidade desde que o mundo ganhou conotação de Mundo e podem iniciar debates sobre o “Boy From Heaven”, longa-metragem, exibido na mostra competitiva do Festival de Cannes 2022. Dirigido e roteirizado por Tarik Saleh, nascido em Estocolmo, filho de mãe sueca e pai egípcio, o filme busca a humanização do tema quando fornece futuro acadêmico ocidental ao universo islâmico oriental. Ainda que a universidade  seja tipicamente voltada aos valores muçulmanos (“a grande instituição” e “o epicentro do poder dos sunitas”), a ideia de um futuro globalizado está lá. Iminente, perigosa e ameaçadora à estrutura conservadora, dotada de valores condicionados, próprios e na força do hábito, que acima de tudo acredita na padronização de uma religião para o Mundo Novo. 

“Boy From Heaven” pode ser categorizado como uma novela, mas com cara, corpo e alma de um produto Netflix de ser, sem esquecer de seus gatilhos comuns. Há o didatismo óbvio em explicar a história e em dar pistas às reviravoltas. Tropas que falham. Barco no mar. Tudo conecta núcleos totalmente distantes e improváveis. Como assim um filho de um pesquisar pode estudar em uma Faculdade elitista no Cairo? A narrativa segue a nova fórmula quase similar a dos algoritmos, que é a de intercalar ação com a espera. O roteiro almeja os confortáveis arquétipos sociais da família, a mesquita, a amizade, a honra, o maniqueísmo (das “más companhias”), como o “castigo por fumar”, como o “erro do irmão”, como o pai estimular o estudo, além de objetivar diálogos inocentes “Não esqueça de onde você veio” e “A alma dele é pura” complementados por uma sentimental trilha-sonora. 

“O que importa não é o que você é, mas o que você quer ser; a vida não é um jogo”, diz-se. Quanto mais os espectadores avançam na história do filme, mais detectamos uma candura desenvolvida por um tom virginal de auto-ajuda fabular. “Boy From Heaven” quer simplificar nosso entendimento, ora pela parte das eleições internas, ora pela tragédia com a irmã, ora pelo filósofo judeu e seu Karl Marx. Educação, família e contradição. Nosso personagem ainda traz um irretocável caráter: altruísta, certinho e não corrupto. “Pego de gaiato” para embasar e salvar vidas pela redenção (“alguém precisa pagar”). Um herói? Um bobo? Para isso precisa “entrar no sistema” e “obedecer”. “Certo é certo; pecado é pecado; Deus guiará você; Rezar é melhor que dormir”, ensina-se. A trama fica mais frágil quando chantagens são usadas; cantos, proibidos; interpretações, forçadas. 

“Boy From Heaven” quer ainda ser uma crítica a essa estrutura de poder religioso (cerimonialista, tradicional, submisso e sem resposta), especialmente quando aborda a questão dos livros proibidos-banidos (“livros idolatrados que Deus baniu”), mas que os mais altos na hierarquia podem ler. É, chega um momento que parece que o próprio filme desistiu de ser salvo. Potencializa-se assim o tom limitado, didático, artificial, clichê, como igualar “campo de concentração a mundo civilizado”, sem esquecer de “Star Wars”, de McDonalds, da Pepsi, da câmera lenta e das tensões características dos filmes de thriller hollywoodiano. Dito isso, “Boy From Heaven” é um novelão sentimental “conspiração” que prefere se criar na zona de conforto das aceitações sociais a indivíduos que limitaram seus olhares ao produto mais óbvio. É como se “Boy From Heaven” não respeitasse a inteligência de quem assiste, mitigando a chance do espectador em poder experimentar novidades e invenções cinematográficas.

2 Nota do Crítico 5 1

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