Balanço Geral e Vencedores do Festival É Tudo Verdade 2025

Balanço Geral e Vencedores do Festival É Tudo Verdade 2025

“Copan” e “Escrevendo Hawa”, ambos dirigidos por mulheres, são escolhidos os melhores longas-metragens documentários da 30ª edição

Por Clarissa Kuschnir

Em um ano que, segundo Amir Labaki (diretor geral e idealizador do É Tudo Verdade), o festival teve recorde de público (e deu para sentir bem isso!), o maior evento de documentários do Brasil, que completou 30 anos, entregou uma boa safra de longas, médias e curtas, durante seus dez dias de exibições neste mês de abril, tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro. Confesso que é muito difícil escolher por onde começar, já que entre os mais de 80 filmes escolhidos pela curadoria, há uma lista longa de filmes inéditos (muitos deles das mostras competitivas) nacionais (com sessões esgotadas) e internacionais (que não terão distribuição por aqui) e como todos os anos, os programas especiais que trazem pérolas da cinematografia mundial, que dificilmente chegariam ao cinemas, TV, streaming, youtube e afins. Ou seja, são títulos imperdíveis para quem gosta de descobrir documentários, independentes de suas linguagens nos fazem viajar pelos mais diversos universos. Essas obras instigam a curiosidade humana e provocam debates e reflexões profundas. Afinal de contas, o cinema começou sendo documentado pelos irmãos Lumière, em 1895, em Paris. Então, viva o cinema realidade para que possamos viajar o mundo, conhecer lugares, personagens, conflitos, sem sair do lugar! E sim, o Festival É Tudo Verdade vem desempenhando bem esse papel na formação de público brasileiro, que nunca foi tão acostumado com essa linguagem, mas que aos poucos, vem se rendendo ao formato, além das plataformas de video on demand, que possuem um catálogo extenso de documentários.

“Estamos em um momento muito forte da produção, conseguindo exibir documentários em sala e isso é uma batalha nossa. Só completamos 30 anos. Acho que algum terreno conseguimos conquistar. Mas é uma batalha anual, semanal e diária, a gente ter documentários de qualidade, nas salas de cinema”, disse Amir Labaki na noite de premiação do festival em São Paulo, que fechou muito bem com a exibição de Trens”, do cineasta Polonês Maciej J. Drygas . O longa que foi vencedor de melhor filme e montagem no IFDA (Festival Internacional de documentários de Amsterdã), sendo considerado o melhor festival do mundo na categoria, tem coprodução com a Lituânia e retrata de uma forma muito contemplativa ao trazer imagens impressionantes das viagens de trens do século 20. São cerca de 46 imagens de arquivos de filmes atravessando uma linha de tempo e retratando principalmente as duas guerras mundiais na Europa. É um trabalho de pesquisa, de resgate e de montagem essencial para o cinema documental.

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Tudo Sobre o Festival É Tudo Verdade 2025

Além das mostras competitivas, o é Festival É Tudo Verdade 2025 trouxe para as telas todos os filmes do cineasta paraibano Vladimir Carvalho (longas e curtas), um dos homenageados desta edição e um dos mais importantes documentaristas brasileiros, falecido em outubro passado.  Inclusive, para quem perdeu, ou para quem é de fora do Rio e São Paulo, e quer conhecer um pouco da obra de Vladimir, pode conferir quatro curtas que entraram na plataforma do Itaú Cultural Play. Os filmes são: “A Bolandeira”, “Incelência Para um Trem de Ferro”, “A Pedra da Riqueza” e “Os Romeiro da Guia”, que Vladimir dirigiu em parceria com o montador e cineasta João Ramiro Mello.  Além dos clássicos do homenageado, entraram na plataforma também seis curtas da competição nacional que são: “A bolha”, de Caio Baú, “Cartas Pela Paz”, de Mariana Reade, Thays Acaiabe e Patrick Zeiger; “Chibo”, de Gabriela Apoester e Henrique Lahude, o excelente “Dois Nilos” (que levou o Prêmio Canal Brasil de Curtas), de Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro, “Mergulho no Escuro”, de Anna Costa e Silva e Isis Mello e “Sobre Ruinas”, de Carol Benjamin.  Todos este curtas, estarão na plataforma, até o dia 30 de abril. Então, ainda dá tempo de aproveitar!

Outro cineasta que esteve presente com sessões especiais com vários de seus curtas e médias nas telas do Festival É Tudo Verdade 2025 foi o britânico Humphrey Jennings. O diretor, falecido em 1950, deixou um legado importante tendo como base filmar o cotidiano da vida dos britânicos durante a Segunda Guerra Mundial. Tive a oportunidade de assistir três de seus filmes que foram: “Ouça a Grã-Bretanha”, “Um Diário para Timothy” e “Retrato de Família”. São retratos muito interessantes da vida de pessoas que mesmo passando por uma guerra precisam viver o dia a dia, como se nada estivesse acontecendo, naquele momento.

Completando os programas especiais, uma das sessões mais marcantes foi Cabra Marcado Para Morrer, do mestre Eduardo Coutinho, morto há 10 anos. Um dos maiores documentários brasileiros foi apresentado em cópia digitalizada em 4k, e, parece nunca envelhecer, mesmo após 40 anos. E esse ano de 2025, Elizabeth Teixeira, figura central do filme, completou 100 anos.

Infelizmente, este ano não foi possível acompanhar as conferências do festival. Uma delas, a mais esperada, realizada pelo crítico, teórico e uma das maiores referências mundiais do cinema documental, o norte americano Bill Nichols. Por um questão de organização do próprio Festival É Tudo Verdade 2025, a palestra lotou a menor sala da Cinemateca, deixando vários convidados de fora. E isso serve como uma crítica construtiva, para que haja uma melhor logística nessa questão aos próximos anos. Mas acredito que o próprio festival não esperava um número maior de convidados. Mas para quem se interessar, todas as conferências estão na página do Youtube do Festival, inclusive a de Bill Nichols, que esteve bem pertinho de mim no encerramento, mas por timidez da jornalista aqui não falou com ele.

Copan

Dos vencedores desta 30ª edição do Festival É Tudo Verdade 2025 os júris oficiais (nacionais e internacionais) escolheram os longas-metragens Copan” (Brasil e França), de Carine Wallauer, e, Escrevendo Hawa” (França, Países Baixos, Catar e Afeganistão), da cineasta afegã Najiba Noori. E sem dúvida para mim, os dois longas foram os que mais me chamaram à atenção e se tornaram, logo de imediato, os meus favoritos deste ano. Primeiro, por serem dirigidos por mulheres, e, segundo, por apresentarem temas que aproximam demais o espectador de seus protagonistas. É como se tivéssemos ali, participando bem de perto das filmagens. Mas isso, eu explico melhor, nas minhas duas críticas sobre os filmes. Já os curtas-metragens escolhidos foram:  Sukande Kasáká /Terra Doente”, de Kamikia Kisedje e Fred Rahal (Brasil) e “Eu Sou a Pessoa Mais Magra que Você Já Viu?” de Eisha Marjara (Canadá).

O júri internacional composto pelo documentarista, escritor, professor e curador argentino Andrés Di Tella, pelo professor e crítico norte-americano Bill Nichols e pela cineasta brasileira Eliza Capai justificou os prêmios:

O de longa: “Poucos filmes contam a história de uma nação por meio do amor e da compaixão que definem uma família imersa em uma cultura patriarcal — mas não limitada por ela. A cineasta narra a luta excepcional de sua mãe por independência no Afeganistão, onde conquistas como essa raramente são celebradas”. 

O de curta: “Pelo tratamento poderoso e poético da experiência da anorexia, expresso com toda a emoção bruta e a confusão de crescer em uma família imigrante”. 

Já o júri nacional composto pela cineasta, ex-diretora da Ancine, e sócia da Gullane Entretenimento Débora Ivanov, pelo diretor, produtor e montador Paulo Sacramento e pelo diretor e produtor Roberto Berliner justificou os prêmios:

O de longa: “Pela ousadia formal aliada a um vigoroso rigor estético, por sua originalidade, precisão e delicadeza, pelo equilíbrio das cenas e pelas nuances que revelam os conflitos contemporâneos, alcançando uma singular síntese poética dos contrastes de nosso país”.

O de curta: “Pela extraordinária força, precisão e impacto de suas imagens, pela urgência de seu discurso, pela apresentação sensível em contraponto à devastação gerada pelo Agronegócio e pela distância a qualquer gesto redutor na apresentação de sua tragédia.”

O júri nacional também concedeu duas menções honrosas. A primeira para o longa Quando o Brasil era Moderno”, de Fabiano Maciel, com a justificativa: “Por sua vasta pesquisa, pela contundente leitura da história de nossa arquitetura, política, arte e educação, pela clareza de sua interpretação e pela busca do ponto de inflexão onde um projeto de excelência sucumbe aos descaminhos históricos. E realmente, o longa tem um vasto matéria de arquivo e rico em informações (são muitas para absorver) sobre as construções modernas no Brasil.

A segunda foi para o curta “Palavra”, de D F Fiuza, com a justificativa: “Pela atenção aos detalhes, pela construção poética e coesão na observação da atividade humana em plena harmonia com a natureza e pela delicada valorização dos saberes e tradições brasileiros e suas matrizes”. 

É Tudo Verdade 2025

Lembrando que todos os vencedores do júri oficial se qualificam para a inscrição automática ao Oscar de documentário 2026.

Como todos os anos, o festival teve também suas premiações paralelas com parceiros que foram:

Prêmio de Curtas do Canal Brasil que como já citado acima na matéria foi dado para Dois Nilos”, de Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro; Prêmio Mistika de finalização foi para “Sukande Kasáká/Terra Doente”, de Kamikia Kisedje e Fred Rahal; Prêmio Maria Rita Galvão (ABPA – Associação Brasileira de Preservação Audiovisual, PAVIC – Pesquisadores de Audiovisual Iconografia e Conteúdo, REPIA Rede de Pesquisa de Imagens de Arquivo) – Melhor Pesquisa da Competição Brasileira para o longa “Bruscky: um Autorretrato” de Eryk Rocha pesquisa de Yuri Bruscky e Natalia Lacerda Bruscky, e Prêmios EDT. (Associação de Profissionais de Edição Audiovisual), Melhor Montagem (Curta e Longa-Metragem), concedidos, respectivamente, para “Palavra” de DF Fiuza, com montagem do próprio DF FIUZA, e para “Bruscky: Autorretrato“, de Eryk Rocha, com montagem de Caio Lazaneo, com assistência de Lorena Duarte. Foi concedida também uma menção honrosa para o curta “Sukande Kasaká/ Terra Doente”de Kamikia Disedje e Fred Rahal, que teve a montagem de Paula Mercedes e Fred Rahal.

Ao receber os prêmios ao lado de Eryk Rocha, o artista recifense multimídia Bruscky fez questão de agradecer ao Eryk, e finalizou dizendo que o diretor “escaneou a alma dele”. A 31ª edição do Festival É Tudo Verdade tem previsão para acontecer de 09 a 19 de abril de 2026. E eu já estou ansiosa pela próxima.

CONFIRA A LISTA COMPLETA DE TODOS OS VENCEDORES DO FESTIVAL É TUDO VERDADE 2025

Writing Hawa

COMPETIÇÃO BRASILEIRA | JÚRI OFICIAL

MELHOR DOCUMENTÁRIO | LONGA OU MÉDIA-METRAGEM
Copan, de Carine Wallauer

MELHOR DOCUMENTÁRIO | CURTA-METRAGEM
Sukande Kasáká | Terra Doente, de Kamikia Kisedje e Fred Rahal 

MENÇÃO HONROSA | LONGA ou MÉDIA
Quando o Brasil era Moderno, de Fabiano Maciel

MENÇÃO HONROSA | CURTA
Palavra, de DF Fiuza

COMPETIÇÃO INTERNACIONAL | JÚRI OFICIAL

MELHOR DOCUMENTÁRIO | LONGA OU MÉDIA-METRAGEM
Escrevendo Hawa (Writing Hawa), de Najiba Noori (França/Holanda/Qatar/Afeganistão)

MELHOR DOCUMENTÁRIO | CURTA-METRAGEM
Eu sou a pessoa mais magra que você já viu? (Am I the Skinniest Person You’ve Ever Seen?), de Eisha Marjara (Canadá)

PREMIAÇÕES PARALELAS

PRÊMIO CANAL BRASIL DE CURTAS
Dois Nilos, de Samuel Lobo e Rodrigo de Janeiro

PRÊMIO EDT (Associação de Profissionais de Edição Audiovisual)
Melhor Montagem | LongaBruscky: Um Autorretrato, por Caio Lazaneo e Lorena Duarte
Melhor Montagem | CurtaPalavra, por DF Fiuza
Menção HonrosaSukande Kasáká | Terra Doente, por Paula Mercedes e Fred Rahal

PRÊMIO MARIA RITA GALVÃO | ABPA | PAVIC | REPIA
Melhor PesquisaBruscky: Um Autorretrato, por Yuri Bruscky e Natalia Lacerda Bruscky

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