Balanço Geral e Vencedores do Festival Cine PE 2022
Saiba tudo o que aconteceu no festival pernambucano que aconteceu de 09 a 14 de dezembro em Recife – Um Cine PE de muitas emoções…
Por Clarissa Kuschnir
Uma noite musical, engajada politicamente, encerrando com curtas de cunho mais psicológicos e um longa sobre a o sincretismo religioso no interior do Ceará, assim foi a semana do Festival Cine PE 2022, que chegou em sua 26º edição com muitas, mas muitas emoções, até a noite de encerramento. A princípio, o festival que estava programado para ocorrer em dois locais diferentes (os tradicionais Cine São Luiz e o Teatro do Parque) teve que ser transferido para um terceiro local, nas duas últimas noites, o cine Porto Digital. Na noite de domingo as exibições ocorreram no São Luiz, porém na quarta noite, que seria no Teatro do Parque ocorreu um problema técnico com o projetor do local, fugindo ao controle de todos, tendo o festival que cancelar as sessões ficando com um dia a menos, em sua programação das exibições. O problema foi resolvido rapidamente e com muito profissionalismo, por parte da equipe do Cine PE. A noite de encerramento, que seria apenas de premiação acabou sendo ocupada pelos filmes das mostras competitivas, e os premiados conhecidos até dois dias após o encerramento, pela assessoria de imprensa e pelas redes sociais do festival. Assim como foi feito o ano passado (por conta de uma edição do festival online durante a pandemia), o festival se comprometeu a trazer os vencedores para o festival presencial em 2023, para receberem seus troféus Calungas de Prata.
Voltando a seleção de filmes, a noite de domingo foi marcada por curtas focados na música, seja ela engajada de alguma maneira no contexto dos filmes, a começar pela seleção competitiva pernambucana que trouxe “Da Boca da Noite à Barra do Dia”, de Tiago Delácio e “Último Dia”, de Armando Lôbo. O primeiro curta mostra um misto cultural de dança, música e teatro, na Zona da Mata pernambucana. O segundo filme aborda de forma totalmente teatral ou poemópera três carpideiras que cantam choram a morte, de um importante mestre popular, da cultura pernambucana.
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“Fantasma Neon” (vencedor de diversões festivais pelo Brasil e fora, com destaque para o Festival de Locarno), de Leonardo Martinelli abriu a terceira noite de curtas nacionais. O filme retrata de forma musical e coreografada, o dia a dia dos entregadores de aplicativos, com um personagem que sonha em ter uma moto. Para representar o filme, esteve presente o ator Silvero Pereira (de “Bacurau“), que faz uma participação especial no curta.
“Eu quero dar um boa noite especial a Pernambuco e tenho orgulho de fazer parte de uma região que enxerga um país melhor. Me sinto muito feliz de estar aqui em Recife nesse cine teatro maravilhoso, que é um cinema de rua e o prazer de poder ver esse filme pela primeira vez na tela grande. Hoje vou ter o privilégio de assistir junto com vocês. Acho uma coisa muito importante nesse filme é o lugar de visão de que a gente enxergue essas pessoas. É um entregador de aplicativos assim com milhões de entregadores que lutam para realizar seus sonhos, mas que na luta de realizarem seus sonhos vivem dentro de uma sociedade extremamente individualista que pensa mais em si, na luta de receberem os seus produtos e não enxergarem o próximo. É uma crítica social lúdica, mas muito profunda e muito dolorosa sobre o país em que a gente vive. Então espero que vocês apreciem também”, finalizou Silvero Pereira (que é natural do Ceará) sob aplausos, antes da sessão.
Os outros curtas foram: “Geruzinho”, de Juliane Teixeira, Lula Morante e Rafael Amorim, do Rio de Janeiro, que documentaram os irmãos Dingo Bala, Mestre Nene e Nego Dadá do bloco afro Descidão dos Quilombolas ; o paraibano “Desejo e Necessidade”, de Milso Roberto, que segundo o diretor foi filmado todo em uma única tarde, na tradicional feira livre de Campina Grande( conhecida como um Patrimônio Cultural do Brasil pelo Iphan) e a animação “Crime da Penha”, de Daniel Souza Ferreira e Dudu Marella de São Paulo.
O longa da noite foi o documentário mineiro “Gerais da Pedra”, de Paulo Júnior, Gabriel Oliveira e Diego Zanotti Com ótimos depoimentos de personagens da vida real, os diretores trazem para as telas histórias de Diadorim, personagem do clássico literário Grandes Sertões Veredas, de Guimarães Rosa. “É muito especial mesmo depois da pandemia e depois desse governo de quatro anos que não combina minimamente com nossa intenção de passar esse filme. Então também é um certo alívio passar esse dezembro aqui no Recife, e lembrar um dia que no fim das contas nos encontramos aqui e foi muito marcante e muito especial”, disse ao público o diretor Paulo Junior.
A penúltima noite do festival já com exibições no Porto Mídia contou com a lotação do público que foi conferir a homenagem do festival a atriz e diretora Barbara Paz, além dos curtas da mostra nacional “Benzedeira”, de San Marcelo e Pedro Olaia do Pará e o paulistano e divertido “Pilotos do Plano”, de Bruna Lessa. “A gente esquece das coisas que fazemos. Eu já fiz tantos curtas-metragens de tantos amigos que chamavam para fazer tudo de graça. Pensei que estaria muito cedo para eu ser homenageada, aí parei e pensei que já estou bem velha. Já vivi tanto, que nem vou falar a minha idade, deixa que o google fale”, disse muito emocionada Bárbara Paz que recebeu das mãos do cineasta pernambucano Lírio Ferreira, o Calunga de Ouro.
Com a mudança de programação a extensa noite contou com dois longas de ficção, “Casa Izabel” do paranaense Gil Barone, e “Rama Pankararu”, do carioca Pedro Sodré. O primeiro longa se passa dentro de uma casa nos anos 70, em meio a ditadura militar, onde os personagens masculinos se vestem de mulheres (os crossdresser), com destaque para a atuação de Luís Melo.
“Eu acho que de uma riqueza e o que me chamou muito a atenção nesse roteiro é que tem vários pontos principalmente para a Izabel. Falando dessa casa onde foi montado esse cenário, essa locação. Na realidade existe uma história dessa casa que o dono que é o Aristides que é um oftalmologista e um colecionador de obras de artistas paranaenses que ali ele também construía quartos, para receber pessoas. Eu conheci essa locação durante uma cavalgada ao luar. E isso tem muitas referências com o universo de Curitiba, da auto previsão, do escondido. Então para mim aquilo era muito familiar, pois em 74 eu estava servindo o exército e fazendo teatro ao mesmo tempo. Então qualquer lugar dentro do teatro, eles achavam que eu era um infiltrado. Eu tinha um acesso, mas ninguém me barrava, mas como aluno eu fiz esse percurso. Então tudo era escondido. Eu tinha uma imagem muito clara do nazismo. Isso era tão forte nessas pessoas em um estudo que fiz com o Antunes lá, para uma montagem. Mas isso sempre me fascinou. E somava um pouco desse proibido. Tinha essa coisa das mulheres irem passar férias na praia e os maridos delas se recolherem em um haras. Isso é muto próprio do Sul de deixar a namorada no portão e depois transar com um travesti”, disse o ator Luís Melo (que é natural de Curitiba) durante a coletiva de “Casa Izabel”.
O segundo filme “Rama Pankararu” fala sobre uma jornalista que sai do Rio de Janeiro para investigar e fazer uma matéria sobre um incêndio criminoso, em uma escola da aldeia Rama Pankararu (localizada no sertão pernambucano) durante o segundo turno das eleições de 2018. Com roteiro escrito pelo próprio diretor em parceria com Yuri Westerman e Bia Pankararu (que é uma agente da saúde local), o filme é uma mistura de doc. e ficção, com ótima atuação, da própria Bia, que não é atriz profissional.
“A minha maior influência na direção de atores é com a Celina Sodré que trabalha justamente a questões das ações físicas. E tem também a Tássia (que faz o papel da jornalista) que é do instituto do Ator que é dirigido pela Celina Sodré. Então é um conceito que tenho uma certa familiaridade com certeza me influenciou, na hora de dirigir esses atores e atrizes personagens. Acho que a questão da ação da palavra, de por exemplo quando a personagem da dona Neide está catando o murici é uma coisa que estamos querendo passar a mensagem da cena e ao mesmo tempo a da cultura que é para mim é, o ponto de partida do filme e a coisa mais importante. Esse filme tem muitas camadas, mas para mim o mais importante é passar a cultura Pankararu, que se manifesta através de ações”, finalizou o diretor Pedro Sodré sobre o elenco e a sobre a veracidade da aldeia, que ele quis passar para as telas.
A última noite do Cine PE trouxe os curtas pernambucanos “Solum” de Vitória Vasconcellos (que dirige, roteiriza, produz e atua em seu próprio filme) e a animação “Raiz de Um”, de Pedro Henrique Lima. Da mostra nacional foram exibidos “Fragmentos de Gondwana”, de Adalberto Oliveira que aborda a questão do impacto do Óleo no porto de Suape e a animação “Ensaio Sobre um Grito”, de Rafael Valles do Rio Grande do Sul.
“Agradeço e ao grande Fernando Teixeira (veterano ator paraibano, que narra a animação), que esse ano está completando 80 anos. A gente quis fazer um trabalho que pensasse nas questões do grito, ou dos gritos em um certo sentido. Estamos vivendo um momento que existem diversas formas de gritos. Gritos de ódio, de luta, que de alguma forma estão se confrontando de alguma maneira por uma sociedade melhor. Pensamos também naqueles gritos de vieram lá de trás de forma autoritária e aqueles que lutaram por ideais e uma série de questões de identidade de luta. Quisemos fazer isso de uma forma muita poética e reflexiva”, finalizou o diretor Rafael Vallares sobre o curta “Ensaio Sobre o Grito”.
O longa documentário “Um Outro Francisco”, de Margarita Hernández, do Ceará encerrou o festival. “Obrigada a todos que estão aqui hoje. Recife é uma cidade que gosto muito. Sempre que puderem podem me convidar. E eu sei fazer muitas coisas. Agradeço direção do festival que luta há muitos anos por mantê-lo cada vez melhor, e eu espero que o festival tenha uma longa vida. Agradeço a curadoria do festival por escolher o filme e sobretudo aos dois fotógrafos que me aguentaram, durante os quatro anos que me acompanharam”, finalizou Margarita Hernárdez sobre seu filme. O longa acompanha dois fotógrafos que durante quatro anos registraram imagens de fiéis a São Francisco de Assis, durante a maior festa do Santo Padroeiro, na cidade de Canindé, no Ceará.
E como eu terminei essa matéria a tempo de poderem dar os resultados dos vencedores, seguem abaixo, os filmes premiados com os troféus Calungas de Prata do festival.
TROFÉU VERTENTES DO CINEMA
Ah, mas antes, os meus troféus Vertentes do Cinema iriam na categoria melhor filme para:
Curta pernambucano: “Contos de Amor e Crime”, de Natali Assunção
Curta nacional: “Benzedeira”, de San Marcelo e Pedro Olaia, do Pará
Longa nacional ficção: “Rama Pankararu”, de Pedro Sodré, do Rio de Janeiro
Longa nacional documentário: “Aldeia Natal”, de Guto Pasko, do Paraná
VENCEDORES OFICIAIS DO FESTIVAL CINE PE 2022
O Júri Oficial do Cine PE foi formado pelo cineasta Luiz Carlos Lacerda; o produtor Emanoel Freitas; a cineasta Tizuka Yamasaki; e a atriz Bete Mendes.
JÚRI POPULAR
Para o público, o melhor curta pernambucano foi “Solum”, de Vitória Vasconcellos, enquanto “O Destino da Senhora Adelaide”, de Breno Alvarenga e Luiza Garcia, foi eleito o melhor curta nacional. O Júri Popular também elegeu “Rama Pankararu”, do diretor Pedro Sodré, o melhor longa-metragem. Mais de 2 mil pessoas votaram nos filmes do Cine PE 2022.
PRÊMIO DA CRÍTICA
Composto por Pablo Villaça, Enoe Lopes e Alexandre Figueiroa, o júri da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) concedeu o prêmio de Melhor Longa-Metragem para “Rama Pankararu”, de Pedro Sodré. O prêmio de Melhor Curta-Metragem foi para “Benzedeira”, de San Marcelo e Pedro Olaia.
PRÊMIO CANAL BRASIL DE CURTAS
Com júri formado por Francisco Carbone, do site Cenas de Cinema, Vitor Búrigo, do CineVitor, Luciana Veras, da Revista Continente, Neusa Barbosa, do CineWeb, e Robledo Milani, do Papo de Cinema, o Prêmio Canal Brasil elegeu como Melhor Curta “O Destino da Sra. Adelaide”, de Breno Alvarenga e Luiza Garcia. Com o objetivo de estimular a nova geração de cineastas, o Canal Brasil oferece um troféu e R$ 15 mil para o melhor filme de curta-metragem, que também será exibido em sua grade de programação.
MOSTRA COMPETITIVA DE CURTAS-METRAGENS PERNAMBUCANOS
Melhor Filme – “Da Boca da Noite à Barra do Dia”, de Tiago Delácio
Melhor Direção – Armando Lôbo, de “Último Dia”
Melhor Roteiro – Vitória Vasconcellos – “Solum”, de Vitória Vasconcellos
Melhor Fotografia – Gabriel Gaurano – “Solum”, de Vitória Vasconcellos
Melhor Montagem – Vitória Vasconcellos – “Solum”, de Vitória Vasconcellos
Melhor Edição de Som – Adalberto Oliveira – “Da Boca da Noite à Barra do Dia”, de Tiago Delácio
Melhor Direção de Arte – Lia Letícia – “Da Boca da Noite à Barra do Dia”, de Tiago Delácio
Melhor Trilha Sonora – Armando Lôbo – “Último Dia”, de Armando Lôbo
Melhor Ator – Sebastião Pereira de Lima (“Martelo”) – “Da Boca da Noite à Barra do Dia”, de Tiago Delácio
Melhor Atriz – Kadydja Erlen – “Contos de Amor e Crime”, de Natali Assunção
MOSTRA COMPETITIVA DE CURTAS-METRAGENS NACIONAIS
Melhor Filme – “Benzedeira”, de San Marcelo e Pedro Olaia
Melhor Direção – Leonardo Martinelli – “Fantasma Neon”
Melhor Roteiro – Breno Alvarenga – “O Destino da Senhora Adelaide”, de Breno Alvarenga e Luiza Garcia
Melhor Fotografia – Adalberto Oliveira – “Fragmentos de Gondwana”, de Adalberto Oliveira
Melhor Montagem – Bruna Lessa – “Os Pilotos do Plano”, de Bruna Lessa
Melhor Edição de Som – Cláudio Lavôr – “Alexandrina – Um Relâmpago”, de Keila Sankofa
Melhor Direção de Arte – Ana Carolina Silva – “Andrômeda”, de Lucas Gesser
Melhor Trilha Sonora – Ayssa Yamaguti, Carol Maia, José Miguel Brasil, Leonardo Martinelli – “Fantasma Neon”, de Leonardo Martinelli
Melhor Ator – Dennis Pinheiro – “Fantasma Neon”, de Leonardo Martinelli
Melhor Atriz – Regina Albuquerque – “Desejo e Necessidade”, de Milso Roberto
MOSTRA COMPETITIVA DE LONGAS-METRAGENS
Melhor Filme – “Casa Izabel”, de Gil Baroni
Melhor Direção – Paulo Junior, Gabriel Oliveira e Diego Zanotti – “Gerais da Pedra”
Melhor Roteiro – Guto Pasko – “Aldeia Natal”, de Guto Pasko
Melhor Fotografia – Diego Zanotti – “Gerais da Pedra”, de Paulo Junior, Gabriel Oliveira e Diego Zanotti
Melhor Montagem – Lucas Cesario Pereira – “Aldeia Natal”, de Guto Pasko
Melhor Edição de Som – Simone Petrillo – “Um outro Francisco”, de Margarita Hernández
Melhor Trilha Sonora – Jean Gabriel e Fábio Peres – “Casa Izabel”, de Gil Baroni
Melhor Direção de Arte – Laís Melo – “Casa Izabel”, de Gil Baroni
Melhor Ator Coadjuvante – Conjunto do elenco masculino (*) – “Casa Izabel”, de Gil Baroni
Melhor Atriz Coadjuvante – Gracinda Nave – “Vermelho Monet”, de Halder Gomes
Melhor Ator – Conjunto do elenco masculino (*) – “Casa Izabel”, de Gil Baroni
Melhor Atriz – Bia Pankararu – “Rama Pankararu”, de Pedro Sodré
* JUSTIFICATIVA: O júri, por unanimidade, decidiu não conferir individualmente os prêmios nas categorias de Melhor Ator e Melhor Ator Coadjuvante e premiar o conjunto do elenco masculino do filme “Casa Izabel”.