Curta Paranagua 2024

Vinícola dos Sonhos

O retorno à origem

Por Vitor Velloso

Cinema Virtual

Vinícola dos Sonhos

“Vinícola dos Sonhos” de Sean Cisterna desembarca no streaming brasileiro para cobrar um novo posicionamento daqueles que acreditavam em uma mudança de postura no serviço dogmático. O retorno à programação normal da moral cristã retorna trazendo consigo o fervor da redenção a partir do capital e do empreendedorismo para livrar-se da culpa. Poucas coisas conseguem ser mais entediantes que o filme ítalo-canadense cuja celebração está ancorada em funcionamentos basilares da indústria norte-americana, ou canadense, é a mesma coisa (piada do próprio filme). 

A desinteressante narrativa acompanha o CEO em sua tentativa de conectar-se às origens para livrar-se do sentimento de culpa por uma promessa não cumprida, levando-o a liderar um projeto de vinícola em sua cidade natal. O longa tenta fazer comédia a partir de seus estereótipos nacionais e até pode conseguir isso em um momento ou outro, mas se mantém em um platô de ciclos de piada para progredir na narrativa, utilizando alguns recursos de escape do eixo central para tentar formalizar esse sentimento de culpa com pilares católicos propriamente ditos. Os esforços de uma reconstrução de vida passam pela precariedade econômica do local, onde a tradição poderia reanimar a geração de empregos na região, ou pelo menos essa é a desculpa utilizada em alguns momentos pelo protagonista, que diz não saber porque está fazendo isso mas é o tempo todo “puxado para esse destino”. Porém, “Vinícola dos Sonhos” não investe no espaço e na representação desse local, pelo contrário, está mais interessado em tratar dessa pendência do CEO e de personagens que cruzam seu caminho para ajudar, atrapalhar ou bagunçar as ideias. 

É a verdadeira fórmula institucional, uma questão programática e prescrita que apenas persegue esse imaginário do funcionamento em torno do eixo central de sua narrativa, ou seja, tudo no longa é deslocado para de algum modo trabalhar essa consciência tradicional e/ou culposa cuja expressão máxima é que a trajetória junto ao capital é suja, mas permite que parte desses sonhos se concretizem. É o entorno que o filme persegue sem sucesso, pois seus estereótipos não dão conta de sustentar uma narrativa tão desinteressante que apenas reproduz o sonho de novos territórios de representação. Não à toa, a linguagem não se distancia desse espelho de planos e contraplanos, gerais e paisagens contundentes “desconhecidas”. Engraçado ver um diretor norte-americano tentando enquadrar um cartão postal não tão explorado pela indústria que o projetou, é de uma mesmice tacanha e exploração mais estapafúrdia de diversos rótulos pré-concebidos. Assim, a montagem apenas redireciona o olhar do espectador para esses diálogos também ancorados na padronização. 

Tudo soa artificial em “Vinícola dos Sonhos”, cada cena é costurada para nos lembrar de alguma proposição moral que a obra investe, os desabafos parecem confessionários e a única confissão em si tenta gerar humor pelo julgamento de quem representa a entidade. A ideia é distanciar a perspectiva de uma ideia milagrosa ou de uma superação em tom clássico, como uma cortina de fumaça para o espectador. Desse barato todo, a parte mais engraçada é o longa ser produzido pela “Mythic Productions” que também assinou o “Kiss & Cry” com Cisterna, onde o conteúdo é assumidamente essa “inspiração” por uma superação e redenção através da vida. A única diferença é que o presente longa assume o ex-CEO para tratar dessa grandiosidade moral. 

O que sempre chama atenção nesses subprodutos que clamam por uma voz inspiradora, é que as pessoas pouco importam, apenas sua trajetória. Não por acaso as memórias são levantadas como pontos de força e fragilidade de maneira ambígua, para que o sofrimento seja acompanhado de uma futura superação. E a forma acompanha de perto esse processo cíclico, exaltando uma luz natural para criar uma representação de silhuetas marcadas como personagens centrais dessa narrativa e a grandiosidade do ser humano é resumida às suas tradições e origens, como um retorno que sempre devemos fazer. O cartaz é expositivo nesse caminho. 

“Vinícola dos Sonhos” é o retorno aos eixos que o serviço estava procurando, encontrando um meio termo menos institucionalizado, mas não deixa de ser uma nova fragilização de catálogo. 

2 Nota do Crítico 5 1

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