The Electric State

Algorithm Movie

Por João Lanari Bo

The Electric State

Não é de hoje que a variável “algoritmo” entrou no radar dos estudos sobre cinema e comunicação em geral. Curiosamente, a etimologia da palavra está ligada ao matemático persa do século IX, al-Khwārizmī: o termo é uma latinização do seu nome, “Al-Khwārizmī”, que significa “o nativo de Khwarazm”. Em latim medieval, tornou-se “algorismus” e, com o tempo e a influência do termo grego “arithmos” (número), evoluiu para “algoritmo” em português. “The Electric State”, o longa produzido pela Netflix em 2025 ao exorbitante custo de 320 milhões de dólares – e com uma igualmente exorbitante recepção crítica negativa – é o mais novo representante do “algorithm movie”, esse novo gênero que congestiona as plataformas de streaming, projetado para conquistar o maior público possível, sempre.

Os diretores do “mockbuster”, os irmãos Anthony e Joe Russo, possuem um estilo pode ser educadamente descrito como eficiente – a descrição consta no recente artigo do “The Guardian” intitulado Sem graça, fácil de seguir, para fãs de tudo: o que o algoritmo da Netflix fez com nossos filmes? (de acordo com a tradução do Google). Os irmãos são responsáveis por alguns sucessos da indefectível franquia Marvel, como “Vingadores: Ultimato” e “Vingadores: Guerra Infinita”, que renderam inacreditáveis 2 bilhões de dólares no mercado global. “The Electric State” poupa a audiência da sanha vingativa, em compensação entrega pouco, apesar do alto investimento e toda a tecnologia de algoritmos que dispõe a Netflix, a mais bem sucedida no mundo do entretenimento audiovisual.

A afirmação pode soar hiperbólica, mas, com o impacto do streaming na produção e consumo cinematográfico, parece cada vez mais pertinente. Nesse pacote vão também usos cada vez mais intensos de big data e IA. O enredo que os irmãos Russo escolheram dessa vez contrasta com esse aparato pela singeleza e, sobretudo, pela (aparente) incapacidade de gerar algum páthos nos telespectadores – o filme parece ter sido feito para ser consumido como uma “segunda tela”, simultâneo a outras atividades, como celular, jogos e mesmo lavanderia. Se vai dar dinheiro ou não, é um segredo a sete chaves da Netflix.

A trama começa com a pré-adolescente Michelle (Millie Bobby Brown) e seu irmão Chris ((Woody Norman) vivendo em uma época, anos de 1990, antes da uma guerra de humanos contra robôs. A razão do conflito é uma reivindicação das máquinas por direitos iguais aos da humanidade. Segue-se uma trágica guerra, onde os robôs são derrotados e banidos para uma terra de ninguém, cercada por um enorme muro – o estado elétrico. Uma possível analogia com episódios contemporâneos seria a Faixa de Gaza e o tormento porque passa a população palestina com a reiterada agressão israelense. Mas “The Electric State” está mais para fantasia infanto-juvenil do que conflitos sangrentos: tudo se explica e se resolve, graças a significantes familiares, perda e busca da infância a la Spielberg, deserto pós-apocalíptico estilo Mad Max e enfeites e gadgets retrô-futuristas que os aficionados gostam tanto de colecionar.

Anthony e Joe Russo inspiraram-se na homônima e sombria história em quadrinhos do artista sueco Simon Stalenhag, mas alteraram os temas distópicos e brutais do original por uma jornada cheia de efeitos especiais e divertida, adequada para todas as famílias e idades. O vilão é o magnata da tecnologia Ethan Skate (Stanley Tucci), que controla tudo através de headsets semelhantes a capacetes de realidade virtual para todos os humanos depois que seus dispositivos robóticos anteriores foram banidos. Seu comparsa é Marshall Bradbury (Giancarlo Esposito), um soldado que recebeu o apelido de “Açougueiro de Schenectady”. Ao final, uma batalha campal cheia de piruetas e robôs tresloucados encerra o assunto.

Os algoritmos, como se sabe, são basicamente um conjunto de instruções para realizar uma tarefa, produzindo um resultado final a partir de algum ponto de partida. Atualmente, os algoritmos embarcados em sistemas e dispositivos eletrônicos são incumbidos cada vez mais de decisões, avaliações e análises que têm impactos concretos em nossas vidas. Os especialistas salientam também que os algoritmos são inertes, máquinas sem sentido, enquanto não estiverem ligados a bases de dados sobre as quais venham a funcionar.

No caso de “The Electric State”, os algoritmos se esqueceram, ou não foram conectados de forma suficiente, a conteúdos emocionais que os personagens eram supostos transmitir. O resultado final é uma sensação de mesmice, de inércia, de mercadoria sempre-igual.

Consultando a definição de “mercadoria sempre-igual” do filósofo Theodor Adorno, com a ajuda da IA, contata-se que:

A “mercadoria sempre-igual” refere-se à homogeneização da cultura pela indústria cultural, que transforma arte e bens culturais em produtos padronizados e idênticos para consumo em massa, impedindo a reflexão crítica e a autenticidade da experiência estética.

Bem-vindos à era algorítmica!

2 Nota do Crítico 5 1

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