Mostra Um Curta Por Dia 2025

The Ballad of Suzanne Césaire

A Noite Americana da Martinica na França

Por Fabricio Duque

Durante o Festival de Cinema de Roterdã 2024

The Ballad of Suzanne Césaire

Na Idade Média, e também no período romancista dos franceses, Balada era uma composição poética para ser cantada. Já para os alemães, era uma poesia narrativa de caráter folclórico, sobre os costumes de uma comunidade. A balada também está junto com o substantivo feminino Desambiguação, termo que elimina o duplo sentido numa interpretação possível a depender do contexto. Podemos então dizer que a obra integrante da mostra competitiva oficial ao Tigre de Ouro do Festival de Cinema de Roterdã 2024, “The Ballad of Suzanne Césaire” é um filme que busca uma estética tropical linguística, ainda que de forma bucólica, com um que de Nouvelle Vague, entre intervalos de uma filmagem, com um que ainda mais conceitual de “A Noite Americana”, de François Truffaut.

Dirigido pela estreante em longas-metragens, Madeleine Hunt-Ehrlich, que vive no Brooklyn, Nova Iorque, que explora como tema a experiência da mulher negra, o afro-surrealismo e o pan-africanismo, “The Ballad of Suzanne Césaire” pode ser traduzido como uma sensorial experiência visual de transcender o sensível. Tudo aqui quer ser Meta. Metafísica, meta-crítica e metalinguagem.  Ao partir sua narrativa pela “fonte de inspiração para o surrealismo, feminismo e aos movimentos comunistas” de sete ensaios, escritos por Suzanne Césaire, nascida na Martinica, entre 1941 e 1945, durante a Segunda Guerra Mundial, o filme não só constrói um etéreo e existencial manifesto político, como rompe com os próprio elementos narrativos. O longa-metragem quer se evocar de um invisível tratado como racional, como um delírio sonâmbulo. Tudo aqui é experimentado, ao poético e ao teatral, como novo. Sim, a inferir Maya Deren não é uma “viagem” nossa! Especialmente pela dança-transe de suas personagens. 

“The Ballad of Suzanne Césaire” quer também o ruído orgânico e a imperfeição estrutural de tudo o que interfere (a “vida coloquial banal”), que pode ou não ser uma presença de algo iminente. Os sons, atravessados, soam como chiados de um disco de vinil, já a fotografia, de nostalgia adulterada (que remete às características do cinema antigo, com seus travelling, close e acompanhamentos – com muitos elementos fellinianos e seu “8 1/2″), imprime uma estética analógica de uma película de 16 ou 35mm, e a narração fornece ao público um retorno ao agora. A mise-en-scène cria o sonho, mas a fala norteia a realidade, esta que acontece no “descanso” de um cenário de uma filmagem, imersa na “natureza ambivalente” e que por sua vez “camufla a realidade”. Muitas das vezes, essa narração comporta-se de forma didática para nos contar, por exemplo, sobre os seis filhos de Suzanne Césaire e sua dificuldade de escrever. Ou na própria narrativa que nos mostra o escritor francês Marcel Proust e sua “busca do tempo perdido”. 

Sim, tudo aqui quer desconstruir a própria imagem, que estende a observação-conceito, por exemplo, o cavalo com flores. Talvez pela quebra da quarta parede, quando a personagem olha para a câmera e explica que o filme é sobre “uma artista” e para “lembrar dela”. E/ou quando a imagem se pausa por um tempo. E volta para a metáfora-entrelinha de invólucros de proliferação de vírus comparados a ações políticas. “The Ballad of Suzanne Césaire” pode ser lido também como um filme de instantes por mini-crônicas de um querer intimista com olhos-perspectiva para assim encontrar a “posição da relação do indivíduo” e libertar o ser das amarras sociais do amor monogâmico (“Luis XV antes da revolução”).  

Mas “The Ballad of Suzanne Césaire” repete muito o propósito conceitual de verborragia cerebral e da poesia imagética. Assim, encena-se mais. Edita-se mais a ideia crítica do “escolher não ver”. Isso tudo não só convida Jean-Luc Godard para pincelar argumentos, mas como o homenageia completamente, especialmente sua fase mais de imagem ideológica e de luta política, ao falar da guerra, por exemplo, aqui se insinua a “Morte da Martinica” (“morte certa, mas não final”). “O que? O que?”, suas personagens perguntam uma a outra. Só que o contexto de “The Ballad of Suzanne Césaire” é o ensinamento. A formação. A diferença. Que estão explícitos na escolha musical de Sabine McCalla, de New Orleans, com as canções exclusivas “Ain’t no Weight” e “Dream Weaver”. E pela pesquisa do filme que se complementa pela parte do artigo “Refugiados Surrealistas dos Trópicos”, de Teresa Svoboda, e pelos escritos de Marina Magloire. Sim, “The Ballad of Suzanne Césaire” é mais que um manifesto lido, é um estudo sobre nós mesmos do antes no agora. 

3 Nota do Crítico 5 1

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