Curta Paranagua 2024

Salão de Baile

O ritmo da cura

Por Vitor Velloso

Assistido durante o Festival do Rio 2024

Salão de Baile

Procurando representar o universo da Cena Ballroom, o documentário “Salão de Baile: This is Ballroom”, dirigido por Juru e Vitã, traça as particularidades do cenário, explicando as referências culturais norte-americanas que estruturam esse contexto, o glamour, a competição, a cobrança, a resistência política, o reforço/orgulho de identidade e raça, além de mostrar a comunidade e afetos que estão envolvidos nas “houses”, o filme encontra uma forma de catalogar todos os termos e processos envolvidos para esclarecer ao espectador cada etapa do que assistimos na projeção. 

Nesse sentido, é impressionante a característica didática, e eficientemente rítmica, que a obra encontra para conduzir essa articulação, mesmo com uma grande quantidade de termos para serem apresentados. Assim, a montagem, assinada por Peterkino, ganha grande destaque no filme, por articular uma forma de transformar a obra em um ball, mas de apresentar o conceito das casas, o companheirismo e toda a competição, sem perder a fluidez e a sensação de frequente transição entre as performances e os depoimentos presentes. Não por acaso, mesmo fora do espaço dos balls vemos performances, onde a câmera cria essas intersecções entre o cotidiano e esse espaço político. Por outro lado, há um interesse em sublinhar esse território na região metropolitana do Rio de Janeiro, destacando uma distinção regional no espaço carioca, torcendo a representação política e social para esse campo de uma paisagem distinta. Aliás, é outro mérito do documentário, sua facilidade em trabalhar as temáticas políticas e sociais sem envergar todo o projeto para um campo de disputa, pois parece compreender que é um reforço desnecessário para um universo tão politicamente explícito em seus debates e bases. Assim, “Salão de Baile: This is Ballroom” consegue um bom trânsito entre seus referenciais estrangeiros e uma consciência de território sólida, mantendo uma base de identidade dentro de um espaço tão amplo como o Rio de Janeiro, as referências múltiplas a Paris is Burning, RuPaul etc. 

Em síntese, a grande força do filme se encontra nessa articulação de todas as temáticas que envolvem seu universo, mas existem alguns momentos que o projeto tem alguma dificuldade em sustentar seu interesse em relacionar os depoimentos com as performances, patinando em alguns momentos e deixando uma sensação de necessidade de incluir trechos um tanto redundantes ou com movimentos repetidos. Apesar da construção rítmica ser realmente eficiente ao gerar a sensação de constante movimento, essas inserções acabam retirando parte do contexto construído pelo filme, por mais que reforce a característica de ser uma espécie de ball em si. É uma escolha estética e estrutural de um documentário que carrega uma grande quantidade de informação, termos, bases culturais e referenciais, que pode prejudicar a experiência para uma parcela dos espectadores, como pode agregar para outros. De toda forma, o projeto não hesita em trilhar um caminho de estruturação baseada no ritmo de seu universo, e nessa perspectiva a fotografia cumpre um importante papel na construção desses corpos presentes na obra, ajudando a reforçar identidade, mas valorizando suas particularidades. Não obstante, algumas frases e depoimentos realmente geram um impacto imediato na projeção, pois quando bem articulados, especialmente quando consegue cadenciar entre a performance e as entrevistas, criam momentos memoráveis na obra, como a comparação entre o ballroom e a UPA, para dizer que é um espaço de cura e pode ajudar em situações emergenciais.

No fim, “Salão de Baile: This is Ballroom” tem força para perseguir sua ambição de ser um ball e demonstra ser um projeto com paixão e sinceridade para se articular como um documentário que entende a competição deste espaço com a intensidade que vemos nas imagens. De alguma forma, seu maior trunfo, que é a capacidade de apresentar esse universo com alguma facilidade, torna-se uma armadilha na própria condução, uma vez que o projeto se desloca para encontrar formas de se manter em constante movimento. Ainda assim, é um filme que consegue se sustentar pela honestidade de sua proposta, pela consciência de seu caminho e a certeza de suas decisões estéticas, mesmo que nem todas funcionem. 

4 Nota do Crítico 5 1

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