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Rambo – Programado Para Matar

Herói Reativo

Por Jorge Cruz

Rambo – Programado Para Matar

Uma época de consolidação de gêneros a partir da popularidade de grandes astros de ação, os anos 1980 tem em Rambo – Programado para Matar uma pedra fundamental para compreender seu período. Baseado no personagem criado pelo escritor David Morrell, o filme apresenta seu protagonista enquanto ele apenas vaga pela cidade em que acaba de chegar para visitar um amigo. As informações que não são fornecidas são a de que John Rambo é um boina-verde veterano do Vietnã e que o colega que ele gostaria de encontrar é mais um de seu grupo que morreu ao voltar para casa.

Mesmo que o roteiro adaptado pelo trio Michael Kozoll, William Sackheim e Sylvester Stallone não se aprofunde tanto nas questões do trauma sofrido por Rambo, se identifica uma forma de trançar a história de modo que as atitude do personagem se mostrem coerentes. Por isso não há qualquer estranhamento no comportamento meio robótico do soldado, antes mesmo da confirmação de Trautman (Richard Crenna) de que ele teve um treinamento específico para que resolva todos os desafios que lhe sejam apresentados da maneira mais violenta e caótica possível.

A Guerra do Vietnã teve uma relevância considerável na produção cinematográfica dos Estados Unidos no período. O conflito, encerrado em 1975, foi o objeto de clássicos como “Amargo Regresso” (Hal Ashby, 1978) e seus reflexos perdurariam até o final dos anos 1980, com filmes como “Nascido em 4 de Julho” (Oliver Stone, 1989).

O primeiro ato de “Rambo – Programado para Matar” revela muito sobre as autoridades, até mais do que o próprio Rambo e suas questões particulares. A perseguição ao homem baseada no pré-julgamento de Teasle (Brian Dennehy) aproxima o protagonista, mesmo que de forma forçada, à realidade de boa parte das pessoas que, até hoje, não conseguem ser livres por completo em uma sociedade que tem como regra oprimir seus cidadãos. É um ponto acertadamente considerado pelo subtexto, um plot muito mais criativo e pertinente do que todas as outras sequências, que envernizariam os atos de Rambo com as tramas do resgate e da vingança.

O espectador se mantém por quase toda a projeção tão carente de informações quanto qualquer personagem. Essa ausência de condução para que Rambo se apresentasse como herói é o grande trunfo de sua história. Seu comportamento, para utilizar uma expressão moderna, é reativo, baseado na forma como a sociedade o vê e o trata a partir de seus representantes. Aos poucos, quando ele não permite sua identificação papiloscópica e renega qualquer tipo de comando das autoridades, somos movidos a concluir que ele é apenas um pouco mais radical, porém tão oprimido quanto qualquer pessoa inserida em meios semelhantes.

A cruzada de Teasle é baseada em nada, é puramente kafkaniana. A ausência de presunção de inocência era um mote ainda bastante poderoso à época do lançamento do filme. Apenas no final daquela década o público exigiria uma ação com motivações bem mais nobres e sentimentais, geralmente baseadas no afeto. O auge da utilização dessa nova premissa talvez tenha sido o primeiro “Duro de Matar” (John McTiernan, 1988), em que o John McClane (Bruce Willis) precisa salvar sua esposa de um sequestro.

Ao longo da experiência de assistir a toda a franquia Rambo foi possível identificar essas adaptações mercadológicas, esquecendo que a obra original ditou uma maneira de desenvolvimento de personagem bastante sustentável. Seu roteiro isola a ambientação, deixa o espectador à vontade, para depois ligar alguns pontos com mais clareza. Só que nunca se apresenta de forma confusa e não entrega nenhuma ação gratuita.

Visto quase quarenta anos depois, parece bem menos violento, quase um drama de guerra em boa parte de seu tempo. Porém, o conceito de “programado para matar” ainda rende boas discussões. Não só na figura do perseguido, Rambo, como naqueles que os perseguem. Uma política de segurança que em algumas partes dos Estados Unidos parecia superada, mas que no Brasil nunca foi pensada de forma diferente daquela aplicada por Teasle e seus encarregados.

Suas cenas de ação envelheceram bem, principalmente as baseadas em perseguições de carro. O realismo desse tipo de sequência dos anos 1980 foi superado tecnologicamente, mas a qualidade a partir do realismo que se impôs não aconteceu na mesma proporção. Cada vez mais a montagem de cortes rápidos pauta cenas como essas, o que não acontece aqui. Do icônico momento em que Rambo amarra sua faixa vermelha na testa em diante, a experiência de assistí-lo ainda é de perder o fôlego.

Outro destaque é a trilha sonora de Jerry Goldsmith, que nunca esteve tão inspirado ao longo da franquia. Seu trabalho na cena em que Rambo é atacado por ratos, por exemplo, é espetacular. Ao custo de 15 milhões de dólares, o filme foi o segundo grande fenômeno da carreira de Sylvester Stallone, atrás apenas de “Rocky, um Lutador” (1976). Mesmo custando caro para a época, 15 milhões de dólares, “Rambo – Programado para Matar” arrecadou 47 milhões nas bilheterias norte-americanas e mais 78 milhões ao redor do mundo, totalizando 125 milhões de dólares. Três anos depois, o estúdio estruturaria um orçamento três vezes maior para a sequência.

 

4 Nota do Crítico 5 1

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