Mostra Um Curta Por Dia Marco mes 9

Protocolo Spikes

Houston tupiniquim, nós temos um problema…

Por Fabricio Duque

Protocolo Spikes

Não há como fugir de questionamentos do que é cinema e imagem quando se assiste ao curta-metragem “Protocolo Spikes”, de Pedro Tavares, um dos “CEO” do Festival Ecrã. As perguntas pululadas acontecem pela total liberdade da forma da criação. Tudo porque esta é uma obra que transcende a própria experiência já empiricamente padronizada. Nós somos imersos em uma desconstrução, proposital e objetivada. Começar essa análise com isso pode parecer cliché, mas como foi dito não podemos nos desvencilhar da intrínseca reação.

“Protocolo Spikes”, “método usado por médicos para dar más notícias” (um mnemônico de seis passos: preparação, percepção, convite, transmissão, emoção e resumir estratégias), conduz o espectador pelo gênero da ficção-científica, para conectar uma experiência sensorial à metáfora social do agora. Uma viagem no espaço, que desconcerta tempo e geografias. O protagonista, voz-off do próprio realizador que também editou o filme, é um estrangeiro planetário, um turista que “errou o voo”, “pousou em terra errada” e não tem como voltar das terras tupiniquins. Mas o Brasil é inferido por intuição, ainda que seja mostrado um diálogo em português na tela de uma televisão que indica que o país “errado” é o “purgatório”. A “Nasa” de lá diz que não pode resolver o problema. Não há também como não referenciar o cinema candango de Adirley Queirós, especialmente por “Branco Sai, Preto Fica”.

É um filme que representa uma revolução pela imagem. A da criação na raça, de fazer, remetendo a “câmera na mão e uma ideia na cabeça”, de Glauber Rocha. Assim, o conceito é muito mais importante que sua forma. A tradução busca pessoalidade estética e identitária de seu criador. Impossível separar aqui o “joio do trigo”. O que vemos é o olhar de seu diretor com todas suas predileções, aproximações e afastamentos. Em 10 minutos, vivenciamos uma contemplação de detalhes que se unem para equilibrar o todo e desenvolver a ideia central da trama. O barulho das sirenes da polícia; lugares abandonados. Tudo representa a mise-èn-scene como personagem. Como elemento inclusivo. “Foi por isso que nós aniquilamos a cultura nesse país. Nós não pagamos, mas alguém pagou”.

Sim, de novo, há muito do mais radical cinema independente. Aquele que consegue rebelar o próprio gênero que se encontra. Sentimos o novo Jean-Luc Godard e todos que passaram pelas edições do Ecrã. “Os foguetes nos esperam”, diz-se com uma “festa evento de recepção”. “Protocolo Spikes” também é uma crítica à artificialidade da Barra da Tijuca, bairro no Rio de Janeiro. Quando é registrado a falsa imagem, a falsa aparência e a falsa felicidade. De um projeto emergente. Com suas luzes de natal, árvores eletrônicas e fogos de artifício. Não, um minuto. Talvez esta não seja apenas uma alfinetada artística direcionada, mas sim uma análise de um todo. De como o Brasil inteiro fica mais “progressista”, “desenvolvido”, “cosmopolita” e “universal”.

Filmado com Iphone 5S e 6S, “Protocolo Spikes”, entre expressões Houston de ser, é um filme percepção, de alguém de fora, criado por alguém de dentro. “As coisas são estranhas por lá. Eles são violentos. Nós não somos bem-vindos aqui”, diz-se entre tiros e xingamentos. Pois é, todo e qualquer ser humano já se sentiu um “peixe fora d’água”. Um extraterrestre em sua própria terra. A psicanálise explica que isso acontece porque nossa essência é mudar e que enjoamos facilmente de tudo. A grama do vizinho sempre será mais verde e mais convidativa.

Contudo, nós também demos “sorte” de nascer em um “galáxia” diferenciada. De definição inexistente e inexplicável. De sempre escolher “errado”. Talvez o “erro” do viajante não seja tão mal deslocado assim. Talvez haja algum resquício de “alma” brasileira. A de “nunca desistir” e “preferir” viver no caos total. Quanto mais, melhor. Nunca saberemos ao certo. Só que uma coisa é “tiro e queda”: o cinema nunca nos abandonará e sempre encontraremos uma maneira de sobreviver. “Protocolo Spikes” consegue personificar questionamentos e também dar bem “más notícias”. 

 

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3 Nota do Crítico 5 1

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