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Perfume de Gardênias

Dualidade da comédia

Por Ciro Araujo

Durante o Festival Cine Ceará 2021

Perfume de Gardênias

“Perfume de Gardênias”, de Gisela Rosario Ramos é uma dualidade. O filme porto-riquenho que estreou em Tribeca no ano atual lança-se da base de um mórbido humor para produzir uma narrativa sobre envelhecimento e tudo que acompanha o processo. O chamariz inicial do filme é de sua sinopse tão peculiar, tão calorosa, uma persuasão que provavelmente fez a cineasta já vender seu peixe para conseguir a luz verde da produção da obra.

Dizem que a primeira impressão é a que fica. Exceto quando o filme vende-se por sua capa, sua entrega inicial outra e seu andar completamente diferente ainda. O longa-metragem de Gisela possui uma estranha sensação que circula todas essas etapas. Seu começo é lento, fora de ritmo, como se estivesse começando a andar de bicicleta. Aproveita de janelas criativas para soltar seus relampejos e aplicar uma direção de arte peculiar, mas que parece contida. E continua pedalando para aplicar uma naturalidade completamente adversa ao inicial. De uma certa maneira, “Perfume de Gardênias” faz parte do hall de filmes excêntricos, aqueles que muitos jogam perto da roda do americano Wes Anderson – que por tabela se inspirou em trocentos exemplos do cânone cinematográfico. Em situações comuns seria filmado em uma estética mais escrachada, até rítmica, como se possuísse uma batida para passar a próxima gag. Em contraponto, a obra gira completamente, procurando seu espaço próprio ao conversar sobre o envelhecimento, que nem sempre tudo precisa ser atrelado ao timing atrelado da comédia.

O humor do filme de forma alguma chega a ser aplicado constantemente, apesar de se encaixar exatamente no gênero. Parece que quer atingir uma sobriedade diferente, esquecer da própria noção de comédia e aproveitar-se apenas de momentos que a cineasta considera necessário. Gisela é muito mais adepta ao chamado natural, o riso é retido de simples imagens pontuais. É aí que mora o perigo, afinal a pontualidade não é de forma alguma muito certeira, já que a aplicação de piadas é simplesmente seca. Para alguém que procura uma aproximação geral, talvez encontre no melodrama, como um palhaço aposentado. Imagens que normalmente tomariam o brilho perdem na câmera aplicada, inclusive por meio de uma proporção de tela tão mal escolhida. Muitos falam no close-up como comédia, distâncias maiores drama, outros falam o contrário. Talvez como escolha seja em saber o enquadramento ideal para assim dar prioridade. A tela no filme aqui perde o sentido, o interesse. Em uma certa cena, uma pilha de remédios. Chega a ser cômico a própria falta de adequação que a obra não abre a cena o suficiente para o amontoado chegar a ser notado. Um pecado tamanha oportunidade vivida. Outro dizer popular é que um bom diretor é um bom aproveitador. Vai saber.

Se comicamente esquece de suas próprias origens, ao menos entende de como caminhar através da natureza dramática do assunto. A proximidade da morte, sempre a espreita e uma solidão. Para aqueles que queiram aquecer o coração, é exatamente uma boa pedida, pois apesar da morbidez fílmica, existe algo bem peculiar no filme de Gisela Rosario Ramos. Uma forma de dar as mãos para todos aqueles que estão sem caminho a partir de um determinado momento da vida, algo tão bem pensado e trabalhado com a força mais sensível e delicada. Diferente de outros longa-metragens a respeito de envelhecimento (e que possua humor), como em “Lucky”, a carta de despedida de Harry Dean Stanton, que olha muito mais para o “e depois?”, a produção porto-riquenha é mais sobre humanidade e lucidez dentro do espaço fílmico. Uma forma muito mais inclusiva narrativamente de se aplicar a faixa da melhor idade.

Apesar de um trabalho forte de Luz Maria Rondon como a protagonista Isabel, “Perfume de Gardenias” não deixa de ser uma dualidade; seu próprio tom não é captador o suficiente, imagens que mesmo com stop-motion, não se aproveitam da própria capacidade de linguagem. Mas é delicado e sincero, talvez do tamanho que deva ser: perfeito para a ilha de Porto Rico, íntimo e… caribenho? Uma combinação que talvez não pareça interessante a primeiro momento, mas fica bom para provar o néctar que fizeram na película. Um grupo que se ajuda, janelas imagéticas engraçadas, com direção de arte no mínimo interessante. É aconchegante, no final das contas.

3 Nota do Crítico 5 1

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