O Mergulho na Piscina Vazia
Ah o Planalto...
Por Vitor Velloso
Durante o Festival de Brasília 2020
O Brasil e seu capitalismo dependente nos corrói até o tutano do subdesenvolvimento, ninguém está a salvo, a high society segue formalizando um problema de saúde pública a partir de suas demandas e ofertas (não?). “O Mergulho na Piscina Vazia” de Edson Fogaça é um documentário que ao tratar da história de seu protagonista, Derly Silva, concebe uma questão de nossa própria história e o poder como objeto de decadência da moral burguesa.
A trajetória de Derly é contada por ele mesmo, com o amparo de breves fotografias, e estruturada a partir da cronologia dos eventos. O ritmo do longa é dado através da articulação da montagem entre a entrevista com o protagonista e imagens de apoio, do mesmo em locais de Brasília. A estratégia cria uma perda constante de força, pois essa constante troca de ambientes para evitar a “monotonia” da imagem, apenas reforça que o projeto possui um problema em seu cerne, na própria concepção do mesmo como um documentário. A falta de organização para unir os diversos depoimentos, acaba cadenciando entre a escassez de alguns relatos e o distanciamento com a história.
Necessitando de uma exposição contundente, o filme se apoia em algumas falas para tornar o exercício mais didático, porém, desumaniza o próprio protagonista. Na própria projeção, o espectador escuta a antiga chefe de Derly, francesa, abastada, que não parece emitir uma nota emocional, e seus esforços em amparo soam uma culpabilidade da burguesia a partir das vendas de suas próprias vaidades. Logo “O Mergulho na Piscina Vazia” adentra mais diretamente em sua temática, o longa se perde em suas tentativas de reprodução da memória, busca nas entrevistas questões possíveis para guiá-lo, contudo parece demasiadamente atordoado diante das múltiplas possibilidades de estrutura.
Existe uma dualidade curiosa, pois de um lado temos um raquitismo de entrevistas e depoimentos, mas uma gama de caminhos que são criados a partir dos mesmos. O longa acaba optando pelo mais expositivo de todos, marcando seu compasso de acordo com aquilo que mais lhe parece caro enquanto depoimento, sempre complementando sua construção com planos do protagonista andando por locais de Brasília. Existe aqui uma presença um bocado desconcertante, pois o formato se assemelha à um institucional, o que gera, no mínimo, uma estranheza diante daquela realidade que o espectador passa a vislumbrar através da oralidade de seus entrevistados e de Derly.
A questão surge como um imbróglio não resolvido pela película, que não consegue organizar seu material afim de criar uma progressão que não se torne mimésis da própria articulação Soa um embate entre o planejamento prévio e a montagem de fato. “O Mergulho na Piscina Vazia” ainda busca apelar para questões emocionais a partir da utilização de música dramática e impactante, porém gera mais um desconforto para o espectador que assiste um recorte fragmentado do protagonista, que é atravessado pela música e parece reforçar o tom institucional da obra.
O que impede a desistência durante a projeção, é compreender o que aconteceu de fato com Derly e torcer para que sua situação tenha mudado. Os sentimentos surgem diretamente dessa desumanização que o longa promove, pois parece tratá-lo como projeção de uma realidade interna do próprio filme. Algumas “revelações”, acompanhadas das tenebrosas músicas, buscam um ar novelesco para uma trama que possui camadas necessárias em um debate do que ocorreu com seu protagonista, A superficialidade com que a obra opera, se mascara de retrato humano, mas concebe um desenho que apenas objetifica toda essa construção em uma espécie de narrativa a ser descoberta.
“O Mergulho na Piscina Vazia” revela alguns trajetos conforme a progressão acontece, mas nenhum dos resultados soa honesto no fim da exibição. Tudo parece uma extração meticulosa para arrancar algumas emoções do espectador, virando a perspectiva da objetiva para algumas distâncias do que o próprio personagem fala. É um distanciamento que trata o próprio tema como uma discussão a ser operada. Parte dos cortes paralelos apenas fetichizam problemas graves do Brasil, do Planalto e de nosso capitalismo dependente, que projeta um padrão que é visto no glamour do alto capital.