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Crítica: O Céu Sobre Os Ombros
Ficha Técnica
Direção: Sérgio Borges
Roteiro: Manuela Dias, Sérgio Borges
Elenco: Everlyn Barbin, Edjucu Moio, Murari Krishna e Grace Passô
Fotografia: Ivo Lopes Araújo
Edição: Ricardo Pretti
Som direto: Bruno Vasconcelos
Edição de som: Gustavo Fioravante
Mixagem de som: Ronaldo Gino
Parceria Artística: Clarissa Campolina
Produção: Helvécio Marins Jr., Sérgio Borges , Luana Melgaço, Felipe Duarte
Distribuidora: Vinny Filmes
Estúdio: Teia / Primo Filmes
Duração: 71 minutos
País: Brasil
Ano: 2010
COTAÇÃO: ENTRE O BOM E O MUITO BOM
A opinião
“O Céu Sobre os Ombros” integra a nova fase do Cinema Brasileiro, que pode ser explicada por uma narrativa mais intimista e existencial, com planos longos e reflexivos. É a estréia na direção de Sérgio Borges, um dos integrantes do Teia, núcleo de pesquisa e produção audiovisual sediado em Belo Horizonte, ao lado de Clarissa Campolina e Helvécio Marins Jr., dupla esta que lançou, no Festival do Rio deste ano, o longa-metragem “Girimunho”, um retrato do que está “dentro” dos personagens, inclusive seus silêncios. O título personifica poesia realista ao abordar três personagens – não-atores que vivenciam o dia a dia de uma cidade caótica, em que o ar, a rotina e a própria existência parecem ser tão densos, a ponto de pesar sobre os ombros, mas a busca de cada um deles; e a vontade de ser amado e reconhecido, torna a lhes trazer forças e esperança. Everlyn Barbin é transexual, prostituta e também trabalha como professora. Edjucu “Lwei” Moio é um escritor marginal que nunca publicou seus livros e que pensa, recorrentemente, em suicídio. Murari Krishna, que é atendente de telemarketing, torcedor do Atlético Mineiro, skatista e integrante do movimento Hare Krishna, abandonou o celibato de cinco anos e deseja encontrar um grande amor. A vida de cada um deles é vivida sem o encontro mutuo. O roteiro segue o ideia de filme Coral, que pode ser explicado por histórias paralelas que se encontram em um determinado momento, mas que o diferencia por não realizar a interação. É lógico que algum dia eles podem se encontrar – ou não. O que mais importa é o retrato destes personagens de uma vida real que se confunde com a ficção, principalmente pela opção de um hibridismo documental.
São pessoas comuns, vivendo um cotidiano não fantasioso, transpirando aspirações, anseios, medos, culpas, sonhos e tantos outros sentimentos que podem pulular na estrutura física do ser humano. O diretor preferiu não esclarecer integralmente verdades e mentiras retratadas, conservando a dúvida do espectador. É um filme que precisa de tempo para acontecer. Sérgio aproveita cada minuto, utilizando uma montagem que não faz os olhos se agitar e ou cansar. Comporta-se como um equilíbrio editado. Aos poucos, sem pressa alguma, as peças do quebra-cabeça são juntadas, fornecendo um ritmo seco e direto, com um amadorismo proposital e extremamente positivo. O universo atual está presente em cada cena, responsável por inserir os elementos narrativos. A câmera participa ora acompanhando, ora em planos detalhes, que inferem a ação, como as mãos fazendo uma massa de pastel e como a imagem que explora partes do corpo, exemplificado por uma tatuagem e ou o bico de um seio. Há o Hip-Hop; a torcida de futebol indo ao jogo e encontrando dificuldades para embarcar no ônibus; a vida numa comunidade carente; a pichação; o bar e a cerveja; a maconha; o estudo e a escolha de se basear em Foucalt – pensador social; o dia-a-dia de uma prostituta (câmera afastada – quase escondida); o jogo de xadrez; a tentativa de retirar moedas de um cofre porquinho; a paisagem feliz de um jardim atrás de um funcionário que não consegue ter a luz do sol; o riso – e a picardia – das desgraças alheias (quase mórbidas e negras); o pai que não consegue conviver com a Síndrome de Down do filho; e há o silêncio dos próprios pensamentos, percepção esta que fica explicita nos créditos, já que não são acompanhados por música.
O elemento musical acontece pelo uso da rádio, fio condutor que suaviza o questionamento do espectador. A escolha pode ter sido optada, talvez por direitos autorais – inclusão das músicas de U2, Robin Williams e Bjork, talvez por uma nostalgia momentânea, de contraste por experimentar um passado de lembranças nos dias atuais, por instantes cotidianos, a fim de datar uma época. “Puta vem do verbo latim putare que significa pensar, refletir”, ensina a professora transexual de “Estratégicas discursivas em diversidade sexual”, tendo o objeto da cena transcendendo o espaço da simetria. “A minha paciência com as pessoas tem diminuído”, diz-se tentando argumentar o ato suicida, gerado por uma depressão crônica. “A vida é razoavelmente não prazerosa”, contra argumenta, sem apelar ao clichê do efeito. É assim que o filme conquista o público: pela simplicidade, por não esperar nada e por não ser pretensioso. “Queria ser mais e melhor”, desabafa-se. Um filme de instantes, que respeita a inteligência de que o assiste, porque não põe fim às vidas apresentadas. Aborda-se apenas um momento, que será continuado. Concluindo, um longa-metragem que merece ser visto. Recomendo. Melhor Filme, Direção, Prêmio Especial do Júri aos Atores, Roteiro e Montagem no Festival de Brasília 2010.
O Diretor
SÉRGIO BORGES cria obras audiovisuais desde 1996. Seus filmes e vídeos participaram e foram premiados em diversos festivais nacionais e internacionais dos quais destacam-se: 40º Festival Internacional de Cinema de Rotterdam, 60º Film Festival Locarno, Suíça; 13º BAFICI, 22º FID Marseille, 23º Festival internacional de Cinema de Munich, 8º Indie Lisboa,12º Miami Internacional Film Festival, EUA; 7º Encounters, Bristol, Inglaterra; 28º and 30º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo; Festival de Nuevo Cine Latinoamericano de Havana, Cuba, 18º Festival de Valdívia, Chile, 52º Festival Internacional de Thessaloniki entre outros. Foi premiado com o curta Silêncio como melhor filme de diretor estreante no 9º Festival Luso-Brasileiro de Cinema de Santa Maria da Feira, Portugal; com o média Mira no Festival É Tudo Verdade, São Paulo, com o prêmio aquisição DirecTV, com o curta Perto de Casa como prêmio de melhor filme (público) no CineEsquemaNovo e com P Céu sobre os ombros como melhor filme, direção, roteiro, montagem e prêmio especial do júri – elenco no 43º Festival de Brasília, como melhor filme no 29º Festival Internacional do Uruguai e com o prêmio especial do júri no 7º Panorama Internacional da Bahia; É autor dos livros O Guerrilheiro Nuclear e o pacifista a conversar (Ed. Manga -Coleção Poesia Orbital) e Solar (Ed. Sêlo Editorial). Realizou exposições fotográficas, de artes plásticas e performances-instalações. É um dos sócios-fundadores da TEIA, centro de pesquisa e produção audiovisual situado em Belo Horizonte. O Céu sobre os ombros é seu primeiro longa-metragem.
SOBRE O COLETIVO TEIA
Fundada em 2003 em Belo Horizonte, a Teia é um centro de pesquisa e produção audiovisual composto por Clarissa Campolina, Leonardo Barcelos, Luana Melgaço, Marília Rocha, Pablo Lobato e Sérgio Borges. Os seis integrantes trabalham de forma colaborativa, combinando produções e pesquisas individuais com trabalhos que envolvem todo o centro e convidados de fora.
Desde sua criação, a Teia tem produzido filmes, vídeos, instalações, realizado oficinas e mostras no Brasil e exterior. Seus filmes receberam mais de 50 prêmios em festivais brasileiros, alguns deles em relevantes festivais do país, como É Tudo Verdade (Melhor longa brasileiro com “Aboio”, 2005), Festival do Rio (Melhor longa documentário pela ABD&C com “Acidente”, 2006) e Brasília (melhor filme, direção, roteiro, montagem com o “O Céu sobre os Ombros” e melhor curta, montagem e fotografia com “Trecho”, 2006).
Com ampla participação em festivais e mostras internacionais, a Teia teve seus filmes selecionados em importantes eventos e festivais como Veneza, Locarno, Sundance, Rotterdam, Toronto, San Sebastian, Karlovy Vary, Fid Marseille, Nyon, Bafici, Miami, Indie Lisboa, tendo sido exibido em mais de 60 países.
Além das obras, o centro e seus integrantes realizam a coordenação e curadoria de mostras e oficinas audiovisuais no Brasil e exterior. Com o projeto TECER iniciado em 2009, a TEIA fortalece essa vertente, propondo um conjunto de atividades que cria um espaço de encontro e reflexão sobre a linguagem audiovisual contemporânea e oferece instrumentos para a crítica e criação audiovisual.
4 Nota do Crítico 5 1

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