O Bom Professor
Excessivo temor
Por Vitor Velloso
Festival Varilux de Cinema Francês 2024
Partindo de uma temática que tem sido explorada com maior frequência no cinema, especialmente após o sucesso de “A Caça” (2012), de Thomas Vinterberg, “O Bom Professor”, de Teddy Lussi-Modeste, é um filme que procura debater injustas acusações de assédio à um professor, demonstrar o mal gerado pela má fé dos indivíduos, a moralidade envolvida no processo etc. O problema é que nada apresentado aqui consegue trazer algum caráter de novidade dentro dessa temática, pelo contrário, parece seguir alguns dos clichês menos elaborados, saídas fáceis, um desenvolvimento precário de personagens coadjuvantes e toda uma estrutura pouco elaborada de como escapar dos becos sem saída que o roteiro coloca o protagonista Julien (François Civil) e as questionáveis condutas externas.
Ou seja, o projeto encontra dificuldade de se diferenciar entre seus pares temáticos, dificultando a imersão. Aliás, se o filme não é capaz de desenvolver o tema de forma distintiva através do roteiro, também demonstra inabilidade para se consolidar na linguagem, que carece de criatividade para tensionar as sequências, tornando algumas cenas um tanto constrangedoras, pois além de depositar todo o funcionamento no trabalho de François Civil, que corresponde até determinado momento, o longa não possui diálogos e/ou situações que sejam capazes de dar conta da complexidade dos temas expostos, dificultando ainda mais que o público possa deixar a sala de cinema pronto para debater qualquer questão acerca de “O Bom Professor”. Além do desperdício de possibilidades, um dos pontos que podemos levantar sobre o projeto, é sua inclinação para não representar Julien como uma vítima durante todo o tempo, pelo contrário, uma das escassas decisões positivas do roteiro, é justamente a insistência por um retrato que explicite a dualidade entre seu idealismo e suas reações, muitas vezes desmedidas, para cada novo desafio que surge a sua frente. O problema é que a lenta construção, visando tornar todo o contexto do protagonista em algo verdadeiramente perigoso, não funciona integralmente, tanto pela fragilidade no desenvolvimento, quanto pela monótona relação do filme com a postura inflexível de Julien. Isso porque durante toda a projeção, o espectador acompanha praticamente duas “fases” de Julien, a agressividade do personagem, com menos cautela que o esperado para o contexto onde está inserido, e sua culpa imediata após sua explosão inconsequente. Não há exatamente uma dualidade durante essa construção, apenas uma situação oportunista para criar uma suposição de contraste, que nunca passa dessa superficialidade momentânea.
Assim como em A Caça, “O Bom Professor” retrata a impotência do protagonista diante das acusações, mas diferente do filme de Vinterberg, aqui a posição iracunda do personagem, ganha algum tipo de destaque nessas situações mais isoladas, mesmo que criando alguma frustração pela inflexibilidade do projeto em conceder mais espaço às camadas mais complexas e densas de suas temáticas. Assim, é como se a obra tivesse medo de jogar luz às contradições e polêmicas envolvidas na história. O filme poderia explorar melhor os traços dessa personalidade rígida, mas deixa quase nenhum espaço para o público tirar suas próprias conclusões sobre o personagem, sua índole, habilidade social para lidar com os entraves e a própria moral. Desta forma, invés de apostar na profundidade das discussões morais e éticas de sua trama, o filme se mantém em um local de mediocridade ao encerrar qualquer possibilidade de transformar as relações professor-aluno e acusação de assédio em uma discussão mais ampla, pelo contrário, se apoia em pontos frágeis e questionáveis, para sustentar sua perspectiva limitante.
Por fim, “O Bom Professor” surge como um projeto preguiçoso em suas discussões, temeroso com possíveis arestas e cauteloso demais para flexibilizar a suposta dualidade do ato, exposto desde o princípio como acusação falsa. Não por acaso, torna-se esquecível minutos após o fim da projeção, por procurar um lugar de conforto para progredir e travar qualquer iniciativa do público em compreender melhor a psique de seu personagem e de todos os coadjuvantes, que são meros dispositivos dramáticos para movimentar o drama. Quanto mais avançamos no longa, mais decepcionante se torna o novo filme Teddy Lussi-Modeste. A sensação é de tanto cuidado para maior circulação e distribuição do filme, que há um descuido com a complexidade dos temas, criando barreiras pro espectador conseguir se interessar o tempo todo por Julien e seus dramas.