Festival Curta Campos do Jordao

Crítica: Mademoiselle Chambon

Ficha Técnica

Direção: Stéphane Brizé
Roteiro: Stéphane Brizé, Florence Vignon
Elenco: Vincent Lindon, Sandrine Kiberlain, Aure Atika, Jean-Marc Thibault, Arthur Le Houérou, Bruno Lochet, Abdellah Moundy, Michelle Goddet, Anne Houdy
Fotografia: Antoine Héberlé
Trilha Sonora: Ange Ghinozzi
Produção: Milena Poylo, Gilles Sacuto
Distribuidora: Imovision
Estúdio: TS Productions
Duração: 101 minutos
País: França
Ano: 2009
COTAÇÃO: MAIS DO QUE EXCELENTE

A opinião

Mademoiselle Chambon é um filme de superlativos. Excelente, magnífico, competente e extremamente simples. Comporta-se como um paradoxo. A trama é comum em um cotidiano familiar francês. O que o torna esplendoroso é como é contada. Não há brechas e não há excessos. Traduz o equilíbrio cinematográfico.

Há metáforas do amor, da construção de sentimentos, do conhecimento dos limites que a vida impõe, da pureza, da sensibilidade e do realismo da convivência. O diretor não tem pressa de apresentar a história. Pretende-se a leveza. Ele deixa a trama acontecer. Os seus personagens aprofundam-se aos poucos. É uma crescente percepção do que se sente.

Jean (Vincent Lindon, francês, nascido em 15 de Julho de 1959) é uma pessoa do bem: um bom rapaz, um bom filho, um bom pai e um bom marido. E no seu cotidiano tranquilo, entre família e trabalho, ele cruza o caminho de Mademoiselle Chambon (Sandrine Kiberlain, francesa, nascida em 25 de fevereiro de 1968), a instrutora de seus filhos. Ele é um homem de poucas palavras, ela vem de um mundo diferente. Eles irão se surpreender pela evidência de seus sentimentos. Adaptado do romance homônimo de Eric Holder, o longa apresenta o amor sincero, infiel e maduro. Eles sabem exatamente até qual ponto podem ir, mas permitem que a fantasia faça parte de suas mentes utópicas.

A simplicidade é um personagem presente. É o que define e ambienta. Após um lanche, pais tentam ensinar ao filho o estudo da palavra. A dialética como metalinguagem. O pai, pedreiro. A mãe, dona de casa. A professora. Esta pede que o Jean, o pai, vá explicar a sua profissão para os alunos de sua classe. A camera capta o orgulho do filho.

As metáforas apresentam-se mais explícitas. Um pedreiro constroi casas, que precisam ser sólidas. Precisa-se ter experiência para empilhar um tijolo após outro. “O pedreiro busca a novidade”, diz inferindo a novas casas, a novos amores. “Uma casa dura a vida toda?”, uma pergunta ingênua de uma criança direciona quem está do outro lado da tela. Percebe-se a sutileza do início de um sentimento que não devia acontecer.

Outro elemento presente é o silêncio. Uma troca de janela para que o vento não faça mais barulho. Janelas são aberturas não convencionais para entradas de alguma coisa. Elas refrescam ou esquentam. Já portas são ditadas socialmente para o politicamente correto de permissão e convite para que alguém possa adentrar no mundo pessoal e individual. A casa é o abrigo inviolável, nela podendo entrar somente os escolhidos.

O desejo aumenta. Não é carnal, visceral ou passional. Mas puro e detalhista, como uma música clássica de Edward Elgar. A professora toca violino. Ele mesmo sem entender, gosta, porque a música é a característica concreta dela. Ele pode, a qualquer momento, ouvir o disco e remeter a sua presença. “Está firme”, ele diz quando termina de colocar a janela. Eles se respeitam, buscam o carinho, o afeto, o encanto, a compreensão do momento que faz com que seus corações batam mais rápido. O espelho está a frente, mas nada mostra. A música já está nele. “Estou pensando em você”, enquanto o violino rasga a intensidade da cena.

O acaso definitivamente ajuda aos infiéis, complica os acontecimentos e corrobora reviravoltas. Eles trocam informações no dia-a-dia sobre os seus gostos, manias, profissões. Ela é delicada. Ele bruto, inerência da característica de seu trabalho. São diferentes, de mundos opostos e vivenciam algo inexplicável, automático, único. O antigo convive com o novo. Louça clássica com cafeteira italiana. Ele a procura. Ela faz o mesmo. A respiração ofegante busca a mão, o beijo, o toque. O medo e a culpa retraem o desejo.

A impressão que é despertado no espectador é a de que não há camera, não há interpretação. São momentos de observação, sem a pretensão de ser alguma coisa. Retrata-se somente. O filme transpassa a aflição de seus personagens, sofremos com a dúvida deles. “Cheiro da tinta é forte”, diz-se. O novo amor faz com Jean se transforme. A irritabilidade e a impaciência aparecem. A professora ri em uma janela. A esposa chora em outra. Ele precisa escolher. A casa sólida e segura da família ou novos tijolos. Rachaduras podem ser consertadas, principalmente para um pedreiro. O filme termina com a cena mostrada do nosso protagonista em uma janela. Qual ele escolheu? Destruiu uma casa de toda vida e procurou construir o novo? Ou apenas conservou lembranças construídas?

Vale muito a pena ser visto. É excelente. Um roteiro fantástico. As conexões entre a música, diálogos e silêncios proporcionam uma experiência sensorial de uma poesia realista, comum e simples. Há a filosofia da metáfora, das ações humanas e falhas, do não julgamento. Pelo contrário humaniza este polêmico sentimento. Recomendo. Repare a cena do quarto do filho. Há o poster do jogador brasileiro de futebol, Daniel Alves. A atriz que interpreta a professora é casada na vida real com Vincent Lindon, o pedreiro.

O Diretor

Stephane Brize é diretor e roteirista francês , nascido em 18 outubro 1966 em Rennes. Era técnico de TV. Fez cursos de teatro em Paris , onde dirigiu várias peças. Ele dirigiu seu primeiro curta-metragem “Bleu dommage” (1993), premiado no Festival de Cognac 1994.

Filmografia

1999 – Le Bleu des villes
2005 – Despertar de um desejo (Je ne suis pas là pour être aimé)
2006 – Entre adultes
2009 – Mademoiselle Chambon

Pix Vertentes do Cinema

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