Curta Paranagua 2024

Lo Que Queda En El Camino

Registro central

Por Vitor Velloso

Lo Que Queda En El Camino

Seguindo a trajetória de Lilian e seus quatro filhos, “Lo Que Queda En El Camino”, dirigido por Danilo Do Carmo e Jakob Krese, é um retrato da miséria vivida pelas pessoas inseridas no contexto do subdesenvolvimento latino-americano. Construído a partir da observação passiva, acompanhamos o longo percurso realizado pela protagonista e seus filhos, além de milhares de pessoas, que estão migrando para os EUA em busca de uma vida melhor, cada um com sua história pessoal, mas todos com o mesmo objetivo. 

Nesse sentido, é interessante que os diretores tenham optado pela abordagem observacional, pois o grande mérito de “Lo Que Queda En El Camino” é nos aproximar dessa personagem que possui uma força extraordinária, sem que seja necessário a realização de depoimentos diante da objetiva, já que o próprio registro é auto suficiente. Desde as cenas onde há a interação com outros personagens que estão migrando, até as ligações telefônicas, o filme procura enquadrar sua protagonista, compreendendo que de todo esse contexto que está inserido no registro da obra, a particularidade da perspectiva de Lilian é o ponto de interesse do documentário. Assim, mesmo quando a obra encontra outras histórias ao redor, não nos apresenta ou utiliza a imagem apenas como transição para outra situação de Lilian. Essa concentração única é particularmente interessante pela proposta de nos aproximarmos de uma intimidade e de uma luta através da sensibilidade do cotidiano, das relações, das histórias que ouvimos e, infelizmente, do marido detestável que cogita utilizar as crianças que sempre repudiou para fazer a travessia também. 

Não por acaso, a obra torna-se tanto sobre o presente que vemos, quanto pelo passado que é deixado para trás, pelo menos fisicamente, pois as chagas acompanham independentemente do lugar. “Lo Que Queda En El Camino” consegue esse registro de forma exemplar, através de uma beleza imagética realmente impressionante, conseguindo uma poesia rítmica junto à montagem, que oferece ao espectador uma fluidez na experiência capaz de aprisionar a atenção sem apelar para nenhum dispositivo. Porém, é possível notar que o projeto tem alguma dificuldade em transmitir a sensação de progresso dessa trajetória, para além das paisagens e situações, pois à medida que o tempo passa, o público tem a sensação de estar preso em um ciclo, onde as histórias são retomadas e recontadas. Essa suposta estagnação não é uma decisão da produção, mas sim a situação onde Lilian se encontra, mas a necessidade de reproduzir determinadas cenas e rememorar falas presentes no próprio documentário, torna a repetição mais cansativa que deveria. 

Assim, mesmo que “Lo Que Queda En El Camino” seja capaz de hipnotizar pela capacidade de estruturação visual dessa trajetória, não é eficiente em trabalhar uma contextualização além da literal, uma consequência direta da decisão observativa. Mesmo sem depoimentos e entrevistas, as outras histórias/pessoas aparecem como acompanhantes da protagonista, nessa trajetória tão absurda quanto triste pelas condições. Uma das coisas interessantes do projeto é a capacidade de colocar a mulher enquanto centro da representação e demonstrar a covardia dos homens presentes, de forma direta ou indireta, nessa busca por uma vida minimamente digna, um exemplo disso é a personagem ter de pedir em um megafone que esses homens não deixassem as mulheres e crianças para trás na jornada. 

Por sua construção, o documentário é capaz de possibilidade o debate sobre parte da sociedade, da miséria e de uma realidade latina que está presente em múltiplas regionalidades, mas a centralização desse registro pode limitar um retrato mais amplo do contexto, mesmo que nos torne íntimos dessa personagem fascinante que é Lilian. “Lo Que Queda En El Camino” é tão literal em sua proposta que suas imagens são auto suficientes, tornando a experiência sintética por sua simplicidade, de forma positiva e negativa. 

3 Nota do Crítico 5 1

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