O evento quinzenal, toda terça-feira, de 23 de fevereiro e 01 de junho de 2010, que tem entrada gratuita, com a retirada de senhas uma hora antes, estimula a memória do cinema brasileiro e internacional pelos olhos de convidados que fizeram fama no meio cinematográfico.
A sexta edição aborda O CINEMA BRASILEIRO NO SÉCULO XXI. O cinema brasileiro contemporâneo, renascido após os tempos críticos, e seus caminhos para o futuro. A palestrante da vez é a jornalista SUSANA SCHILD. Porém por um imprevisto de trânsito, eu não consegui chegar ao evento. Mesmo assim, preparei uma MATÉRIA ESPECIAL sobre o tema. Não é a mesma coisa, mas pode ser considerada para completar o encontro desta semana.
Ainda nos anos 50, por influência do Neo-realismo italiano, surge no Rio um profundo questionamento às tentativas de transplantar Hollywood para o Brasil. Alex Viany realiza “Agulha no palheiro” (1953) e Nelson Pereira dos Santos filma “Rio, 40 graus” (1955), ambos com baixo orçamento, temática popular e busca de um realismo brasileiro. O filme de Nelson termina proibido pela censura, desencadeando uma campanha de estudantes e intelectuais pela sua liberação.
Em São Paulo, Roberto Santos aplica os mesmos princípios na comédia de costumes “O Grande momento” (1958). Como os anteriores, o filme tem problemas de distribuição e não atinge o grande público.
Em Salvador, “Bahia de todos os santos” (1960), de Trigueirinho Neto, e “Barravento” (1961), de Glauber Rocha, desencadeiam um novo ciclo regional, que atrai cineastas de outros estados em busca da temática nordestina: entre outros, “O pagador de promessas” (1962), de Anselmo Duarte, premiado com a Palma de Ouro no Festival de Cannes, apesar de criticado pelos novos cineastas como um filme “tradicional”.
Uma parcela (pequena, mas significativa) da juventude brasileira descobre este novo cinema, comprometido com a transformação do país. Em 1963, o movimento é deflagrado por 3 filmes: “Os Fuzis”, de Ruy Guerra; “Deus e o diabo na terra do sol”, de Glauber Rocha; e “Vidas secas”, de Nelson Pereira dos Santos. Em todos eles, é mostrado um Brasil desconhecido, com muitos conflitos políticos e sociais. Uma mistura original de Neo-realismo (por seus temas e forma de produção) com Nouvelle vague (por suas rupturas de linguagem). É Glauber quem define os instrumentos do cinema novo: “uma câmara na mão e uma idéia na cabeça”; e também o seu objetivo: a construção de uma “estética da fome”.
Após o golpe militar de 31 de março de 1964, os cineastas (e o país) se interrogam sobre o futuro e sobre as suas próprias atitudes de classe. Os filmes marcantes desse segundo momento do Cinema Novo são “O Desafio” (1965), de Paulo César Saraceni; “Terra em transe” (1967), de Glauber Rocha; e “O Bravo guerreiro” (1968), de Gustavo Dahl.
Com o AI-5 (13 de dezembro de 1968), a ditadura militar fecha o Congresso e os partidos políticos existentes e censura a mídia e as diversões públicas. A perseguição às oposições, a restrição da atividade sindical e a prática de tortura nas prisões criam um clima de medo que se reflete em toda a cultura do país. Neste terceiro momento, o Cinema Novo volta-se para o passado, para a História, ou para projeções alegóricas do país real: “O Dragão da maldade contra o santo guerreiro” (1969), de Glauber Rocha; “Os Herdeiros” (1969), de Cacá Diegues; “Macunaíma” (1969), de Joaquim Pedro de Andrade; “Os Deuses e os mortos” (1970), de Ruy Guerra.
Uma nova geração de cineastas responde à nova situação política do país com mais radicalidade: a estética do lixo, o Cinema marginal, “udigrudi” (corruptela de “underground”, um dos nomes da contracultura norte-americana dos anos 60). Suas obras, em maioria, são pouco assistidas, com exceções como no caso de O Bandido da Luz Vermelha. Os cineastas marginais rejeitavam as fórmulas tradicionais de narrativa e estética e encontravam sua força no cinema experimental. Os principais representantes do movimento são Rogério Sganzerla (O Bandido da Luz Vermelha, 1968), filme no qual se nota a influência de cineastas como Jean-Luc Godard e Orson Welles; e Júlio Bressane (Matou a família e foi ao cinema, 1969). Em 1970, os dois fundam a produtora Belair e realizam, em apenas 3 meses, 6 longas de baixíssimo custo.
Mas é com a criação da Empresa Brasileira de Filmes (Embrafilme), em plena ditadura militar (1969), que o Estado passa a financiar a produção, enquanto o Conselho Nacional de Cinema (Concine) se preocupa com a legislação. Parte do lucro das distribuidoras de filmes estrangeiros no Brasil é taxado (como na Alemanha), e esse dinheiro é usado para produzir filmes nacionais (como na Argentina), mas o sistema de escolha dos filmes a serem produzidos é absolutamente centralizado. Os cineastas oriundos do Cinema novo (quase todos cariocas ou morando no Rio de Janeiro) ficam com a maior parte dos recursos.
A contradição básica do sistema se revela quando o filme “Pra frente, Brasil” (1982), do ex-diretor geral da Embrafilme Roberto Farias, parcialmente financiado pela Embrafilme (um órgão do governo) é proibido pela Censura (outro órgão do mesmo governo).
Inicialmente ficou conhecida como cinema da “boca do lixo”, pois os filmes eram produzidos numa região da cidade de São Paulo conhecida por esse nome. Depois surgiu também a pornochanchada carioca.
Nos anos 70, a palavra de ordem dos ex-cinemanovistas é “Mercado é cultura”. Tratava-se de fazer com que os filmes brasileiros fossem vistos pelo público de cinema no Brasil. E, de certa forma, graças às produções da Embrafilme de um lado, às produções baratas da turma da pornochanchada de outro, aos filmes infantis dos Trapalhões de um terceiro, e ainda a um novo “star-system” gerado pela televisão, isso foi conseguido.
O mercado diminuiu: de 3200 cinemas em 1975 para 1400 em 1985; de 270 milhões de espectadores em 1975 para 90 milhões em 1985. Mas o Brasil produziu mais filmes: chegou a 100 em 1978 e a 103 em 1980. E a participação dos filmes brasileiros no mercado cresceu muito: de 14% dos ingressos vendidos em 1971 para 35% em 1982.
“Dona Flor e seus dois maridos” (1976), de Bruno Barreto, chega a 11 milhões de espectadores, mais do que qualquer filme estrangeiro. “A Dama do lotação” (1978), de Neville d’Almeida; “Lúcio Flávio, o passageiro da agonia” (1977), de Hector Babenco; “Eu te amo” (1981), de Arnaldo Jabor; “Xica da Silva” (1976), de Cacá Diegues; e mais 14 filmes dos Trapalhões ultrapassam, cada um, os 3 milhões de ingressos vendidos.
Apesar de tudo, surge uma nova geração de cineastas em São Paulo, onde se destacam Sérgio Bianchi (Mato eles?, 1982), Hermano Penna (Sargento Getúlio, 1983), André Klotzel (A marvada carne, 1985) e Sérgio Toledo (Vera, 1987), mas seus filmes são vistos basicamente em festivais.
Graças à “Lei do Curta” (de 1975, mas aperfeiçoada em 1984), que obriga a sua exibição antes do longa estrangeiro, o curta-metragem passa a ser o único cinema brasileiro com acesso ao mercado. Assim, em todo o país surgem novos cineastas e novas propostas de produção, e os curtas brasileiros ganham vários prêmios internacionais.
Em 15 de março de 1990, Fernando Collor assume a presidência da República. Em seu governo, as reservas financeiras particulares da população brasileira, como contas-poupança, foram confiscadas e a Embrafilme, o Concine, a Fundação do Cinema Brasileiro, o Ministério da Cultura, as leis de incentivo à produção, a regulamentação do mercado e até mesmo os órgãos encarregados de produzir estatísticas sobre o cinema no Brasil foram extintos.
Em 1992, último ano do governo Collor, um único filme brasileiro chega às telas. Foi A Grande Arte, de Walter Salles, falado em inglês e ocupante de menos de 1% do mercado.
A partir de 1995, começa-se a falar numa “retomada” do cinema brasileiro. Novos mecanismos de apoio à produção, baseados em incentivos fiscais e numa visão neo-liberal de “cultura de mercado”, conseguem efetivamente aumentar o número de filmes realizados e levar o cinema brasileiro de volta à cena mundial. O filme que inicia este período é Carlota Joaquina, Princesa do Brasil (1995) de Carla Camurati, parcialmente financiado pelo Prêmio Resgate. No entanto, as dificuldades de penetração no seu próprio mercado continuam: a maioria dos filmes não encontra salas de exibição no país, e muitos são exibidos em condições precárias: salas inadequadas, utilização de datas desprezadas pelas distribuidoras estrangeiras, pouca divulgação na mídia local.
Alguns filmes lançados nos primeiros anos do novo século, com uma temática atual e novas estratégias de lançamento, como Cidade de Deus (2002) de Fernando Meirelles, Carandiru (2003) de Hector Babenco e Tropa de Elite (2007) de José Padilha, alcançam grande público no Brasil e perspectivas de carreira internacional.
Em Janeiro de 2009 o Cinema Brasileiro tem um de seus momentos históricos: Uma continuação de sucesso com Se Eu Fosse Você 2 de direção de Daniel Filho com Tony Ramos e Glória Pires nos papéis dos protagonistas que ultrapassa 1 milhão de espectadores com menos de uma semana. Outro momento histórico foi O filme “Chico Xavier”(2010) que foi visto por 3 milhões de espectadores desde a sua estreia em abril. Dirigida por Daniel Filho, a cinebiografia sobre o médium mineiro faturou R$ 27 milhões nas bilheterias e se mantém como terceiro colocado nos filmes de maior arrecadação deste ano no Brasil.